A era da distância: os impactos políticos da conexão

A era da distância: os impactos políticos da conexão

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Uma multidão de celulares dá o tom da cena e destaca que as conexões virtuais assumem, em detrimento do encontro, o protagonismo da nova era que se anuncia. A presença é mediada pela tela, o olhar é amplificado, conectado, ganha novos contornos, mas não capta as zonas que escapam ao enquadramento e aos limites que ele impõe. Limites que, inclusive, realçam o isolamento, a vulnerabilidade e os antagonismos acentuados no instante em que o olhar não consegue alargar o seu alcance, se espantar pelo contraditório e ser provocado pela realidade e sua pluralidade.

As reflexões éticas apresentam a relevância da alteridade. A presença do outro, enquanto sujeito, revela a necessidade de se construir uma realidade dialógica, que recusa a monologia vertiginosa e violenta que se instala no desprezo radical da diferença. No horizonte do encontro compreendemos que a realidade do outro expõe a necessidade de alargarmos nossa perspectiva e referência acerca da realidade.  A presença dos sujeitos ata nossa vinculação com a realidade e anuncia a necessidade de nos colocarmos constantemente no fluxo constitutivo do valor que não pode, no interior de uma reflexão ética, assumir qualquer interesse pela a-historicidade ou pela essencialidade. É no campo da experiência, da relação, da tensão e do encontro, que somos capazes de verificar os valores e sentidos que pavimentam a nossa realidade, que expandem (ou não) a nossa humanidade.

O protagonismo da tela revela uma experiência mediada que esvanece a presença. A captura da imagem como fim último da experiência desagua no apequenamento do momento resumido à euforia das cores, do desejo de publicação numa rede social, de uma experiência plástica que despreza a interação, pois tem como foco a mediação da realidade, a conectividade e o caráter furtivo da imagem que corre na timeline. A era da distância atualiza o desprezo como ferramenta política: antes, o outro era destituído de sua humanidade em nome de práticas ideológicas que fixavam sobre o seu corpo um rebaixamento constituído de forma tecnopolítica, mas naturalizado enquanto propósito de um maquinário de terror; agora, essas políticas ampliam o seu caráter destrutivo pois grifam a irrelevância de tudo que escapa do enquadramento da tela e da percepção mediada pelos seus interesses. Ademais, o caráter bélico das políticas de extermínio ganha força e ecoa nas redes sociais, como território intimamente ligado à realidade e às suas violências estruturais.

A era da distância privilegia a conexão e anula o encontro. A polarização sobrepõe o diálogo e a percepção se torna cada vez mais autofágica, pois a alteridade é desmembrada por uma realidade mediada pela tela e seu formato enquadrante e excludente. Vale ressaltar que a crítica aqui não tem como foco a tecnologia — pois assumimos que a própria condição humana é tecnológica — mas à utilização dos artefatos, ideias e valores, como princípios radicalmente comprometidos com a desumanização, desinformação e implosão de cenários éticos possíveis, pois desprezam radicalmente a subjetividade, a presença e a corporeidade do outro.

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