Dia 24 de Abril: Memória do Genocídio Armênio no Império Turco-Otomano – por que ainda não é tão reconhecido?

Dia 24 de Abril: Memória do Genocídio Armênio no Império Turco-Otomano – por que ainda não é tão reconhecido?

Genocídio Armênio

Na imagem acima é possível ver soldados turcos pousando para uma foto, após enforcarem vários armênios na cidade de Aleppo na Síria, no ano de 1915. Muitos historiadores dizem que o genocídio armênio, no antigo Império Turco-Otomano no contexto da I Guerra Mundial, teria sido o primeiro genocídio do século XX. Argumenta-se que Hitler supostamente teria utilizado o mesmo como um parâmetro para o ataque a judeus e outros no Holocausto (1933-1945), copiando alguns dos seus métodos de extermínio.1

Este artigo pretende considerar as seguintes questões:

1 – O que foi o genocídio armênio no Império Turco-Otomano?

2 – Por que este genocídio ainda não é tão reconhecido como o Holocausto Nazista?

Seguem as considerações das respectivas questões.

O que foi o genocídio armênio no Império Turco-Otomano?

No período de 1915-1923 cerca de 1 milhão a 1,5 milhão de armênios foram mortos no Império Turco-Otomano e posterior Turquia.2 O genocídio foi executado pelo movimento dos “Jovens Turcos” que tomaram o poder em 1908. Os armênios foram retratados como antinacionais e conspiradores a favor da Rússia (assim como os nazistas retrataram os judeus como sendo pró-bolcheviques no contexto da década de 1930-1940). Há provas documentais de que houve uma política intencional de extermínio por parte do referido movimento, incluindo telegramas criptografados do governo comandado pelos “Jovens Turcos”.3

Os homens das aldeias armênias foram convocados para lutarem no exército turco no contexto da I Guerra Mundial (1914-1918) ao lado da Tríplice Aliança (Alemanha, Itália e Império da Áustria-Hungria), contra a Tríplice Entente (Reino Unido, França e Rússia). Os soldados armênios geralmente ficavam desarmados e eram propositalmente colocados em funções e regimentos de risco para serem eliminados. Ao mesmo tempo, as aldeias armênias ficaram desprotegidas, sendo que o governo turco-otomano enviou tropas para aniquilar mulheres, crianças e idosos. Dentre o processo de extermínio da população civil armênia, podem ser destacados as “marchas da morte para o deserto” (principalmente da Síria), os fuzilamentos e os enforcamentos realizados de cidade em cidade e de aldeia em aldeia. Também foram formados campos de concentração, nos quais os armênios eram tratados de forma cruel. Tais táticas também foram utilizadas pelos nazistas no Holocausto.4

Oficialmente, o dia 24 de abril de 1915 é eleito como o início do genocídio armênio no Império Turco-Otomano. Neste dia houve a prisão de centenas de pessoas de destaque do povo armênio em território turco. Todos os anos, nesta data, os armênios lembram do mesmo.

Por que o genocídio armênio ainda não é tão reconhecido como o Holocausto Nazista?

Algumas razões dificultam o reconhecimento do genocídio armênio, pelo menos no mesmo patamar do Holocausto nazista. Seguem três fatores:

O primeiro diz respeito a postura dos governos que perpetuaram os genocídios. Enquanto o governo alemão do Pós II Guerra Mundial reconheceu a necessidade de assumir a responsabilidade dos crimes do regime anterior, tal fato ainda não ocorreu com a Turquia e a maior parte dos países do “mundo árabe”. O governo turco nega o genocídio e argumenta que apenas 300 mil armênios teriam morrido em consequência do contexto da I Guerra Mundial. No máximo admite que houve atrocidades, alegando que as mesmas atingiram tanto os armênios, quanto outros grupos étnicos em decorrência de circunstâncias de guerra. Infelizmente, o governo turco nega o genocídio de Estado, isto é, que houve intenção de exterminar o povo armênio.5

O governo alemão decidiu realizar esforços em indenizar as vítimas do Holocausto. Negar tais atrocidades também é crime na Alemanha. Enquanto na Alemanha negar o Holocausto é um ilícito penal, na Turquia defender que ocorreu o genocídio armênio não raro resulta em ações judicias e prisão. Dentre todos os países árabes, apenas o Líbano passou a reconhecer o genocídio armênio de forma integral no ano 2000 (oitenta e cinco anos após o início do mesmo). A Síria só reconheceu em nível parlamentar no ano 2020 (cento e cinco após o início). Porém, o parlamento sírio só admitiu a ocorrência do genocídio até o período anterior a 1920, na tentativa de eximir o Estado Soberano da Turquia de qualquer responsabilidade.6 De qualquer forma, já foi um grande avanço.

O segundo fator diz respeito a exposição dos genocídios. O Holocausto nazista foi muito mais registrado de forma audiovisual que o genocídio armênio. A exposição das atrocidades nazistas no Tribunal de Nuremberg após a II Guerra Mundial também ajudou muito a sensibilizar a opinião pública. A divulgação dos crimes nazistas na própria Alemanha e a contínua investigação dos historiadores alemães sobre o que ocorreu no nazismo, colaborou para um clima mais favorável de reconhecimento e compromisso social no meio da população alemã. É lógico que isso não ocorreu da noite para o dia. Foi um processo de diálogo contínuo. Em sentido oposto, o genocídio armênio não contou com a mesma exposição.

O terceiro fator é a questão da representatividade dos armênios na comunidade internacional. Por exemplo, poucas pessoas sabem que ciganos e Testemunhas de Jeová foram vítimas do Holocausto nazista. Por motivos semelhantes, poucos sabem a respeito do genocídio armênio no antigo Império Turco-Otomano. A Armênia é um pequeno país no leste europeu que não tem muita força no cenário internacional. Dentre as inúmeras pautas apresentadas na comunidade internacional, a sua tende a ficar em segundo plano, embora a realidade aos poucos esteja mudando.

O primeiro país a reconhecer o genocídio armênio foi o Uruguai em 1965. Na América do Sul, os outros países que também reconheceram foram: Argentina, Chile, Paraguai e Venezuela. Por fim, no Brasil o genocídio armênio foi reconhecido em âmbito interno pelos seguintes entes da federação: Estados do Ceará, Paraná e São Paulo, e os Municípios de Campinas (SP), São José do Rio Preto (SP), São Paulo (SP), Osasco (SP), Fortaleza (CE) e Uberaba (MG).7

 

Referências

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1. EL PAIS. “Genocídio Armênio, uma política de Estado que inspirou os nazistas, é negado por motivos políticos”. Disponível em: link.

2. Oficialmente, a Turquia surgiu em 29 de outubro de 1923, com a extinção do Império Turco-Otomano, porém a estrutura política que comandou o genocídio armênio era turca.

3. Idem.

4. BBC NEWS BRASIL. O que foi o massacre de armênios que Biden definiu como ‘genocídio’. Disponível em: link.

5. BBC NEWS BRASIL. “Por que gera tanto conflito chamar de ‘genocídio’ o massacre de armênios”? Disponível em: link.

6. ESTAÇÃO ARMÊNIA. “Parlamento Sírio reconhece o Genocídio Armênio” Disponível em: link.

7. GENOCÍDIO ARMÊNIO: “Quem reconhece o genocídio armênio”. Disponível em: link.

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