As pessoas vitimadas de assédio, para além da violência sofrida experenciam a positividade tóxica, que as pressiona a um agir determinado.
Algumas dessas afirmações são familiares? Pense positivo! Vai dar tudo certo! É temporário, tudo vai se ajeitar. Veja pelo lado positivo. Não é bem assim. Você é maior e mais forte que isso.Com certeza ELE está em dia ruim. Não é para tanto, você aguenta. Seja forte! Não é sobre você.
Como se vê, a positividade tóxica é uma distorção intencional da realidade baseada na recusa de reconhecer a experiência e o ponto de vista do outro que sofre, bem como de aceitar as suas impressões e emoções negativas acerca de uma pessoa ou situação (a despeito de sua autenticidade).
É tão prejudicial que pode operar como uma espécie de veredito de culpa ou juízo de realidade (distante) que deslegitima sentimentos e emoções, sem qualquer compromisso com os fatos.
Naturalmente, ao negligenciar as emoções da pessoa em sofrimento, essa positividade agonizante serve aos propósitos neoliberais de superexploração e produtividade.
A sociedade de desempenho se pauta pela positividade total, positividade totalitária, aliás, pois exige a capacidade individual de se escamotear toda forma de fraqueza pessoal em favor da performance laboral, em nome da rentabilidade ulterior do mercado, a instância onipotente que decide o destino da humanidade capitalista. (Bittencourt, 2023, p.63)
Ter as suas emoções e, consequentemente, a sua dor invalidada, tende a prolongar e agravar a violência. A positividade tóxica é opressiva, impondo uma satisfação e compreensão compulsória acerca da própria violência experimentada.
Trata-se de uma referência de conduta tão invasiva que desorganiza a perspectiva da pessoa vitimada, fazendo-a questionar e rever as suas impressões e represar emoções negativas. Resulta daí a descredibilização e invalidação.
Sou agredida e a culpa é minha; Não fui compreendida; Por que o comportamento dele é sempre justificável? Por que somente a minha opinião é questionável?
Não é sem razão que as pessoas que compartilham as suas dores com um(a) colega de trabalho ou amigo(a) que adota essa postura ultrapositiva, tóxica e destoante da realidade, se sentem não importantes, insuficientes, silenciadas, reprimidas, incompreendidas, fracassadas e culpadas.
Luis Machado ressalta que,
A negação constante de emoções negativas e a supressão desses sentimentos podem levar a consequências prejudiciais, como o aumento da ansiedade, depressão, sentimentos de inadequação e estresse crônico. (Machado, 2023, p.3)
O acolhimento espontâneo e a escuta empática revelam como as pessoas processam as suas vivências, como se sentem e expressam as suas emoções.
“Positividade saudável significa abrir espaço para a realidade e a esperança. Positividade tóxica nega uma emoção e nos força a reprimi-la.” (Goodman, 2022, local.144)
A positividade tóxica não se define apenas pelo exagero mas, pelo descolamento da realidade, pela indiferença do(a) interlocutor(a) aos fatos, pelo descompromisso com a verdade ou pauta e pelo desinteresse de escuta.
Trata-se, assim, de uma falsa positividade ou positividade convenientemente artificializada (automática). Compõem – se, recorrentemente, por afirmações prontas, genéricas, portanto, aplicáveis a qualquer situação. Positividade em drágeas nada confortantes, meros achismos de superfície! A boa positividade é genuína, empaticamente racional, generosa e encorajadora, suficiente para vibrar paz e esperança.
Referências
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BITTENCOURT, Renato Nunes. A positividade tóxica do culto da performance e a asfixia gerencial da dor. V. 23 n. 241 (2023): Revista Espaço Acadêmico, n. 241, jul./ago./set. 2023.
GOODMAN, Whitney. Positividade tóxica: Como ser autêntico em um mundo obcecado pela felicidade. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2022.
MACHADO, Luís. Positividade Tóxica. Edição do Kindle: 2023.