Sem deixar ninguém para trás: repaginando a Agenda 2030 da ONU com os objetivos de desenvolvimento sustentável 18, 19 e 20

Sem deixar ninguém para trás: repaginando a Agenda 2030 da ONU com os objetivos de desenvolvimento sustentável 18, 19 e 20

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Em 2012 durante a Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (Rio +20) os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) começaram a tomar forma, e em 2015 na Assembleia Geral das Nações Unidas como parte da Resolução 70/1 foram firmados nas metas a serem alcançadas pelos Estados Membros.

Os 193 países da ONU e a sociedade civil global estavam então diante de um amplo acordo intergovernamental para transformar o nosso mundo: a Agenda 2030 cujas metas envolvem questões que abrangem desenvolvimento econômico, social e sustentabilidade, incluindo saúde, pobreza, fome, educação, igualdade de gênero, aquecimento global, saneamento, água, meio ambiente, energia, justiça social, urbanização.

A cooperação internacional entre os Estados é uma das peças fundamentais para que os 17 OSD possam ser alcançados, além do que é preciso um olhar de inclusão e diversidade para que as vozes dos países do Sul global – cujo histórico marcado por violências, exploração, apagamento e subalternização como das populações negras e indígenas – sejam ouvidas em meio às perspectivas aparentemente globais, mas que se fixam na visão do Norte global e seu discurso universal, que normaliza por séculos a opressão praticada sem incluir as representatividades plurais.

É neste diapasão que foram pensados a inclusão de outros ODS, a partir de iniciativa voluntária de alguns países como o Brasil, para serem realizados em seu âmbito de atuação e políticas públicas. Assim em setembro de 2023 o governo brasileiro anunciou em discurso proferido na abertura da 78ª Assembleia das Nações Unidas o ODS 18, tendo como foco a promoção da igualdade étnico-racial. Foi criada uma câmara temática sob a coordenação conjunta do Ministério da Igualdade Racial, do Ministério dos Povos Indígenas e da Comissão Nacional para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

O compromisso brasileiro é no sentido de internalizar a Agenda 2030 no país e estimular a sua implementação em todas as esferas de governo junto à sociedade civil e o tema da igualdade racial é crucial no cenário brasileiro tendo em vista o nosso histórico e construção do país sob uma estrutura opressora colonial.

Outros países tiveram iniciativas de criar um ODS como a Índia com seu ODS 18 sobre o empoderamento local e desenvolvimento rural, e a Costa Rica que criou um ODS 18 na temática de felicidade e o bem-estar das pessoas, tudo bem registrado junto à ONU nos Relatórios Nacionais Voluntários (RNV), que são documentos que mostram os esforços de um país para cumprir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos na Agenda 2030 da ONU.

Os desafios são reais e ainda se está distante de cumprir integralmente as metas da Agenda 2023. Lado outro é importante reforçar que sem a inclusão social dificilmente o desenvolvimento sustentável avança e, neste sentido, as metas do ODS 18 no Brasil são:

1) Eliminar o racismo e a discriminação, tanto direta ou indireta, bem como nas formas múltipla ou agravada, e a intolerância correlata contra os povos indígenas e afrodescendentes nos ambientes públicos e privados de trabalho.

2) Eliminar todas as formas de violência contra povos indígenas e afrodescendentes nas esferas pública e privada, levando em conta suas interseccionalidades, em particular o homicídio das juventudes, feminicídio e os resultantes de homofobia e transfobia.

3) Garantir aos povos indígenas e afrodescendentes a efetivação e a ampliação do acesso à justiça, o devido processo legal e tratamento digno, justo e equânime perante os sistemas de justiça e de segurança pública.

4) Garantir a representatividade equitativa dos povos indígenas e afrodescendentes nas instâncias, colegiados e órgãos de Estado e no quadro de pessoal de empresas públicas e privadas, levando em conta a interseccionalidade.

5) Promover a reparação integral das violações socioeconômica e cultural, das perdas territoriais e dos impactos ambientais nos territórios dos povos indígenas e afrodescendentes, especialmente os integrantes de comunidades tradicionais, favelas e comunidades urbanas, garantindo o direito à memória, verdade e justiça.

6) Assegurar moradias adequadas, seguras e sustentáveis aos povos indígenas e afrodescendentes, incluindo comunidades tradicionais, favelas e comunidades urbanas, com garantia de equipamentos e serviços públicos de qualidade, com especial atenção à população em situação de rua.

7) Assegurar o acesso à atenção à saúde de qualidade, não discriminatória, para os povos indígenas e afrodescendentes, bem como o respeito às suas culturas e saberes ancestrais, garantido o fortalecimento do sistema público de saúde.

8) Assegurar a educação de qualidade e não discriminatória aos povos indígenas e afrodescendentes, bem como o respeito às suas culturas e histórias, garantido o fortalecimento da educação pública.

9) Garantir, na exploração econômica e comercial de bens genéticos e na execução de grandes obras e empreendimentos em territórios historicamente ocupados por essas populações, a implementação de processos de consulta livre, prévia e informada a povos indígenas e afrodescendentes, assim como a repartição de benefícios, quando aplicável, preservando a sua ampla autonomia e autodeterminação.

10) Eliminar a xenofobia e assegurar que todas as metas anteriores, quando cabíveis, sejam refletidas também no tratamento de imigrantes indígenas e afrodescendentes.

A UnB (Universidade de Brasília) e a Unesp (Universidade Estadual Paulista) tiveram uma iniciativa em 2020 de um Guia da Agenda 2030 e dedicaram uma parte a “Reimaginar a Agenda 2023”, afirmando que os ODS não têm uma representação imagética ou metas específicas sobre certos grupos populacionais representativos do Brasil e da América Latina.

Portanto, para dar visibilidade a estes grupos, neste Guia apresentaram o ODS 18 “Igualdade Racial” (já adotado institucionalmente pelo Brasil); além dos ODS 19 “Arte, Cultura e Comunicação” e; ODS 20 “Povos originários e comunidades tradicionais”.

Ao se incluir formalmente e na prática novos objetivos como o ODS 18, 19 e 20 no Brasil visa-se trazer a realidade do país que está em dívida histórica com as populações preta, indígena entre outras marginalizadas pelas estruturas eugenistas que fundaram o nosso país hierarquizando “raças” e civilizações, subalternizando e objetificando aqueles que não eram brancos, homens, ricos, heterossexuais que sempre dominaram as estruturas de poder.

Trazer perspectivas latino-americanas e do Sul global valorizam a nossa formação plural e diversa, e reduzir as desigualdades é fundamental para que o Estado Democrático de Direito se faça presente nas ações de inclusão e diversidade do país.

 

Referências

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GUIA AGENDA 2023. Disponível em: link. Acesso em 10 set. 2024.

BRASIL. Ministério da Igualdade Racial. Disponível em: link. Acesso em 20 set. 2024.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Relatórios Nacionais Voluntários (RNV). Disponível em: link. Acesso em 15 set. 2024.

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