Assédio organizacional (profissional) e a crescente desnecessidade de “comandos opressivos diretos”

Assédio organizacional (profissional) e a crescente desnecessidade de “comandos opressivos diretos”

violência institucional

O assédio organizacional ou profissional, denominação que alude ao lugar onde se dá as ocorrências, tem como gatilho os interesses corporativos ou institucionais. Essa modalidade de assédio corresponde ao conjunto de atitudes e comportamentos que extrapolam os limites de exigência gerencial  cabíveis, considerando o status de  subordinação jurídica do empregado ou empregada.

Demandas de produtividade e lucratividade acima da capacidade da infraestrutura de prestação e a exigência de uma dedicação extrema à “empresa”  (excessiva, descabida, desproporcional, inconveniente) são exemplos de práticas que podem caracterizar o assédio organizacional.

O assédio profissional, como se vê,  apresenta razões impessoais mas, nada impede o seu desdobramento em outras formas de violência. Uma conduta, a princípio tipicamente profissional, pode ganhar motivação pessoal, mantendo-se atrelada aos interesses organizacionais. Da mesma forma, o assédio interpessoal pode engajar outros agentes, complexificando o abuso.

A violência se opera de diferentes modos, por exemplo:

  • por meio da adoção de estratégias de gestão empresarial que desrespeitem o tempo de desconexão do empregado ou empregada;
  • pela promoção da violência psicológica como meio para atingimento de objetivos corporativos ou institucionais (comerciais, profissionais);
  • pela adoção de meios de controle invasivos e desrespeitosas;
  • pelo estressamento da relação profissional;
  • pela supervisão excessiva (desnecessária, constrangedora);
  • pela frequência de críticas despropositadas;
  • pela imposição recorrente de sobrejornada;
  • pela realização de ameaças (como forma de pressão e gerenciamento de pessoal);
  • pelo estímulo à segregação e competição predatória;
  • pela cobrança abusiva de metas (inexequíveis e desarrazoadas), dentre outros.

Martinez e Carvalho Júnior (2022) menciona a utilização dos métodos de avaliação para estimular a produtividade baseada na competição.

A implementação de métodos avaliatórios que estimulam a competição entre os trabalhadores – entre outras ferramentas de controle organizacional – acaba por sujeitá-los, cada vez mais, a transtornos psíquicos que, segundo dados de organismos especializados, já constituem uma das principais causas de absenteísmo no trabalho. (Martinez e Carvalho Júnior, 2022, p. 8)

Naturalmente, o enquadramento da conduta depende das peculiaridades do caso concreto. O conceito de assédio organizacional  não nos entrega uma tipicidade objetiva, qual seja, uma delimitação precisa, afinal as ocorrências são proteiformes.

A figura 1 apresenta os marcadores da violência.

 

Figura 1 : Características principais do assédio organizacional;

Marcadores típicos

 

Recorrência, diversificação ou progressão  (de  uma mesma forma de violência).

 

Conduta ofensiva à dignidade da pessoa humana (marcador de lesividade).

 

Intencionalidade do ato, ainda que não de resultado.

 

Repercussão negativa (a exemplo do adoecimento da pessoa vitimada).

 

Fonte: elaborada pela autora.

 

A intencionalidade também caracteriza o assédio organizacional. A despeito do movimento em prol da desconsideração da intencionalidade como requisito essencial de caracterização do assédio, entendo que não podemos afastá-la, uma vez que ela existe forçosamente atada ao ato, ainda que não necessariamente ao dano produzido.

O assédio, independentemente de sua natureza, é animado pela vontade do(a) agente, ainda que não tenha consciência da repercussão de seus atos. A  ausência da intenção de causar determinado resultado  não lhe subtrai a substancialidade lesiva. Ademais, a própria recorrência constitui indício de intencionalidade.

O assédio possui uma carga nociva marcante, que o diferencia de ocorrências episódicas de tratamento grosseiro (inadequação comportamental) ou rigor crítico.

A naturalização do assédio organizacional tem dificultado a constituição da prova,  em razão da dificuldade de se identificar o fato propriamente dito. Cada vez mais, o assédio organizacional dispensa as ordens diretas  que extrapolam os limites do contrato de emprego e os direitos dos(as) trabalhador(as).

Quem disse que a opressão precisa ser verbalizada? Nesse passo, a pessoa oprimida torna-se parte da engrenagem da violência pela exploração desmedida falsamente consentida (condição essencial para manutenção do vínculo empregatício). Nesse contexto particular, as pessoas internalizam os interesses da organização para a qual trabalham, institucionalizando abusos. Vale ressaltar que o assédio organizacional se caracteriza pelo excesso, pela desmedida de exigência e desconsideração dos limites físicos e psicológicos do trabalhador ou trabalhadora.

 

Referências

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MARTINEZ, Luciano; CARVALHO JÚNIOR, Pedro Lino de. Assédio moral trabalhista: ações coletivas e processo estrutural. Rio de Janeiro: Saraiva Jur, 2022.

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