A Evolução dos Direitos das Mulheres no Direito de Família: Igualdade ou Ilusão?

A Evolução dos Direitos das Mulheres no Direito de Família: Igualdade ou Ilusão?

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No dia 08 de março celebramos o dia internacional da mulher, data reconhecida oficialmente em 1975 pela ONU, e que tem como objetivo nos fazer refletir sobre os avanços na luta pela igualdade de gênero e quais os desafios ainda a serem perseguidos. Até por isso passou-se a convencionar o mês de março como o mês da mulher.

A data reconhecida tem sua origem nas lutas femininas que aconteceram pelo mundo, e que podem ter como marco inicial; mesmo sabendo que elas se iniciaram antes, o final do século XIX, período da revolução industrial, que lançou as mulheres ao mercado de trabalho, especificadamente as fábricas, que proporcionavam condições extremamente precárias, longas jornadas de trabalho e salários inferiores aos dos homens.

Tais condições levaram a protestos e greves femininas, no qual o evento mais marcante foi exatamente em 8 de março de 1908 quando aproximadamente 15 mil mulheres marcharam pelas ruas de Nova York exigindo melhores condições de trabalho, salário e o direito ao voto; mas também é preciso lembrar do incêndio que vitimou várias operárias em 25 de março de 1911; e que reforçou as pautas femininas. Em outros países, mulheres também buscavam por igualdade, como na Conferência Internacional das Mulheres Socialista realizada em 1910 na Dinamarca; e a Revolução Russa de 1917.

Enquanto isso no Brasil, as mulheres que eram amplamente excluídas da vida política, educação formal e do mercado de trabalho foram influenciadas pelo movimento sufragista que ganhava força na Inglaterra e nos Estados Unidos, e teve influência no início do período do questionamento o papel de submissão da mulher na sociedade.

É possível, assim, verificar algumas conquistas das mulheres no período de 1920 a 1980; como o direito a voto e a possibilidade de trabalhar; mas ao analisar a evolução do direito de família as mulheres continuaram em desigualdade com os homens mesmo após a promulgação da Constituição Federal de 1988, que garantiu a igualdade entre os gêneros, como se observa da leitura do artigo 5º.

Como previsível, o Código Civil Brasileiro de 1916 era influenciado fortemente pela época da sua promulgação, e por isso as mulheres dentro da família, e na sociedade, era de uma posição subordinada e submissa aos homens, seja da família, seja o marido; tanto que as mulheres eram consideradas relativamente incapazes quando casadas; e por isso era obrigatório a autorização do marido para trabalhar, administrar bens e até viajar.

Por isso não, surpreendentemente, previa o marido como chefe da sociedade conjugal e a ele cabia administrar os bens do casal, conforme era possível ver no artigo 233 e seus incisos, conforme os artigos 278 a 309. O que hoje é impensável, ou não?

Era, ainda, determinado por esse código os direitos e deveres das mulheres, que entre os artigos 240 e 255 podia-se observar que a mulher casada deveria adotar, obrigatoriamente, o apelido do marido, e o artigo 242 elencava o rol das situações que a mulher só poderia praticar com a autorização do marido, como por exemplo exercer uma profissão. Fatos que vieram a deixar de ser obrigatórios com a evolução da legislação.

E sequer se poderia pensar que a mulher tivesse direitos quanto a seu corpo e liberdade sexual, tanto que era considerado erro essencial que ensejava a nulidade do casamento o “defloramento da mulher, ignorado pelo marido (I, art.219).

Poucas mudanças e avanços que beneficiassem as mulheres aconteceram até 1962 quando se promulgou o Estatuto da Mulher Casada (Lei 4.121/62), e foi responsável pela revogação da incapacidade civil da mulher casada, e permitiu que ela pudesse trabalhar sem a necessidade da autorização do marido; mas ainda se mantinha a chefia masculina no casamento; mesmo que nesse momento a mulher pudesse contribuir com o sustento da família ela permanecia como mera colaboradora. Será que, então, é possível se pensar em avanços com peso de obrigações?

O divisor de águas nos direitos e deveres entre homens e mulheres, contudo, será a promulgação da Constituição Federal de 1988, quando se estabeleceu a igualdade entre os homens e mulheres (I, art.5º); o que refletiu diretamente no Código Civil Brasileiro de 1916, que ainda era vigente na data da promulgação e assim continuou até 2002, com a promulgação do novo Código Civil Brasileiro.

Com essa igualdade, a chefia masculina na família extinguindo-se e passou-se a reconhecer a obrigatoriedade da decisão conjunta do casal; não havendo mais uma hierarquia. Assim estava estabelecida a proibição de discriminação de gênero, especialmente nas relações familiares.

A grande mudança deu-se com a definição e o reconhecimento da união estável, trazendo proteção as mulheres, e seus filhos, que agora ganhavam proteção legal e deixavam de serem párias sociais. E, ainda, as mulheres solteiras e seus filhos, as chamadas “mães solteiras” também tiveram seu reconhecimento através do reconhecimento das famílias que passaram a ser conhecidas como monoparentais. Nesse momento, estava-se diante do início do reconhecimento de diferentes formas de famílias.

Mas foi, apenas, em 2002, com a promulgação do novo Código Civil Brasileiro que as mudanças da Constituição Federal de 1988 foram consolidadas nesse diploma que traz o regramento para os mais diversos relacionamentos entre as pessoas na sociedade.

Não há mais uma chefia para a sociedade conjugal e estabeleceu-se a comunhão de responsabilidade entre cônjuges; e não mais vigora a expressão “pátrio poder”, mas sim “poder familiar” demonstrando que hoje se garante direitos igualitários para as mães e os pais na criação da família; independente de existir ou não uma sociedade conjugal. E desde 2014, a guarda dos filhos tornou-se obrigatoriamente compartilhada.

Contudo, como sempre foi perceptível, os avanços legais não correspondem a realidade social; e apesar dos avanços legais a pratica nos mostra que as mulheres ainda sofrem discriminação de gênero, arriscando-se a dizer que a visão social de 1916 por uma parte da sociedade continua ativa e vigente, em especial nas relações afetivas e de trabalho, como demonstram os números de feminicídio e assédios morais. Isso sem esquecer que não estamos fazendo aqui o recorte racial e social que tanto se faz necessário, e sim uma visão geral dos avanços e retrocessos das mulheres; porque se assim fosse feito teríamos o abismo existente entre os gêneros muito maior.

Com a promulgação da Lei Maria da Penha em 2006 e a Lei do Feminicídio em 2015 podemos, inclusive, dizer que a sociedade caminha para um grande retrocesso quanto aos direitos conquistados pelas mulheres, uma vez que essas legislações foram necessárias para salvaguardar as vidas das mulheres e protege-las exclusivamente por razões de gênero; já que a violência doméstica, que não raramente termina com o feminicídio, acontecem tão somente por serem as vítimas mulheres.

Portanto, é possível concluir que os direitos das mulheres no Direito de Família evoluíram saindo de um modelo patriarcal rígido para um novo modelo que estabelece a igualdade de gênero, mas ainda patriarcal e que por isso torna necessário pensar-se em instrumentos de proteção as mulheres; demonstrando que persistem desafios; como a violência doméstica e a desigualdade econômica no divórcio e na guarda dos filhos; o que não desmerece a tendência progressiva na legislação brasileira.

 

Referências

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Lei 3.071/01.01.1916 – Código Civil Brasileiro de 1916. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L3071.htm

Lei 10.406/10.01.2002 – Código Civil Brasileiro 2002. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406compilada.htm

Constituição Federal Brasileira 1988. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm

Para Todas as Mulheres e Meninas: Direitos. Igualdade. Empoderamento. ”: 8/3 – Dia Internacional da Mulher.  https://bvsms.saude.gov.br/para-todas-as-mulheres-e-meninas-direitos-igualdade-empoderamento-8-3-dia-internacional-da-mulher/

Por que o Dia Internacional da Mulher é comemorado em 8 de março?. www. cnnbrasil.com.br/lifestyle/po-que-o-dia-internacional-da-mulher-e-comemorado-em-8-de-marco/

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