O Ciclo da inovação
Até mesmo quem nunca estudou o ciclo da inovação já sabe que faz parte do seu roteiro o hype, em que determinado tema toma conta dos noticiários e das interações humanas cotidianas. Como não poderia ser diferente, a inteligência artificial teve seu pico de hype com a popularização do Chat GPT.
Assim como já ocorreu com criptoativos, NFTs e metaverso, dentre tantos outros assuntos de inovação, após muitos debates e aprofundamento um pouco maior acerca daquela tecnologia, as pessoas começam a entender que a realidade não será aquela cogitada quando do auge dos debates.
Esse amadurecimento vem com o tempo. E esse mesmo tempo que temos que aguardar, ao viver diversos desses ciclos, também nos permite ser mais céticos quando a próxima grande novidade estiver no centro das atenções.
Por todos esses motivos, nesta coluna me debruçarei sobre os possíveis reais impactos do uso de inteligência artificial no direito e, especialmente, sobre os empregos jurídicos.
A inteligência artificial
O Chat GPT assumiu o protagonismo no debate público quando o assunto é inteligência artificial. E não demorou muito até que algumas big techs também anunciassem suas versões de uma conversa com uma inteligência artificial que responde às perguntas dos usuários, tal como o Bard do Google.
Mas a inteligência artificial é muito mais do que o Chat GPT. Podemos conceituar inteligência artificial como um programa de computador (software) que autonomamente reproduz padrões complexos de comportamentos humanos. Dentro da inteligência artificial, podemos encontrar temas como aprendizagem de máquina (uso de situações anteriores para que a inteligência artificial possa aprender), processamento de linguagem natural (a inteligência artificial pode ser capaz de interagir através da linguagem humana), aprendizagem profunda (é possível que a inteligência artificial extraia informações relevantes de um conjunto considerável de dados) e visão computacional (a inteligência artificial passa a processar informações visuais).
De tudo isso, podemos entender que a capacidade de aplicações da inteligência artificial é imensurável. No entanto, isso não coloca nossos empregos jurídicos em xeque.
Os empregos jurídicos
Ao formado em direito, atualmente, existem diversas opções de carreiras jurídicas, desde as clássicas, como a Advocacia, Magistratura, Ministério Público, Defensoria Pública e Delegado de Polícia, até as mais recentes engenharia jurídica, encarregado de proteção de dados, dentre outras.
Não há dúvidas de que o aumento da adoção de ferramentas tecnológicas, e aí não me refiro apenas ao emprego de inteligência artificial, reduzirá consideravelmente o número de empregos cujas funções possam ser automatizadas.
Algumas vagas, como a de estagiário, por sua vez, também deverão ser repensadas, já que frente a digitalização dos processos algumas funções anteriormente exercidas acabam esvaídas. Assim, o estagiário deixará de ser utilizado apenas para verificação de processos físicos nos cartórios judiciais, para então assumir uma posição com maior empenho intelectual, o que acabará por concretizar o objetivo desta etapa da aprendizagem.
Mas todas profissões que exijam trabalho intelectual não serão substituídas por ferramentas com inteligência artificial. De início, pois ainda não encontramos uma inteligência artificial forte que possa ser confiável, sem sombras de dúvidas. Mas também, pois diversas atividades são exclusivas de pessoas, embora tais pessoas possam ser auxiliadas pela tecnologia e inteligência artificial.
Conclusão
Não devemos nos preocupar com a extinção das profissões jurídicas por uma suposta substituição das pessoas por iniciativas de inteligência artificial. Devemos, sim, nos preocupar em conhecer os projetos e em conseguir operar as soluções existentes para nos auxiliar na nossa atividade profissional.
O que deve ficar em nossa mente é que a inteligência artificial é uma ferramenta e não um fim em si mesmo. No Poder Judiciário, por exemplo, a inteligência artificial é muito efetiva em identificar processos cujo tema está englobado em um recurso repetitivo para que então o Magistrado possa efetuar uma análise mais detalhada e, se o caso, determinar a suspensão do processo em primeiro grau. Já no Ministério Público a inteligência artificial é eficaz em identificar as fases processuais e assinalar ao Membro do Parquet qual será a próxima etapa.
Desses exemplos, conseguimos extrair o que quero dizer: as ferramentas estão disponíveis para facilitar nosso trabalho, não para nos substituir. E é por esses motivos que devemos conhecê-las e saber operá-las, não combate-las.