A Retenção da CTPS Além do Prazo do Art. 29, § 8º da CLT Pode Gerar Dano Moral

Carteira de Trabalho

Ao lermos a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, em especial o seu artigo 29, percebemos que o “empregador terá o prazo de 5 (cinco) dias úteis para anotar na CTPS, em relação aos trabalhadores que admitir, a data de admissão, a remuneração e as condições especiais, se houver”.

Uma vez observado o prazo de 5 (cinco dias úteis) para confeccionar as anotações legais na CTPS do trabalhador, o empregador deverá garantir ao empregado “o acesso às informações da sua CTPS no prazo de até 48 (quarenta e oito) horas a partir de sua anotação” conforme literalidade do § 8º do citado artigo 29 da CLT.

Ocorre que, na prática, alguns empregadores acabam, por incontáveis motivos, não cumprindo com o prazo de 48 (quarenta e oito) horas da CLT, cujo o termo inicial é a partir da conclusão das anotações na CTPS do colaborador.

Em um primeiro momento, algumas pessoas podem até pensar que o não cumprimento desse prazo é algo bobo, que não gerará maiores problemas, no entanto o empregador deve ter muita cautela antes de concluir dessa forma.

Primeiramente deve ser esclarecido que “É do empregador ônus de provar o recebimento e a devolução da CTPS do trabalhador, a teor do art. 29 da CLT.” (TRT-2, Proc. 1000176-40.2020.5.02.0402 – 17ª Turma – RORSum – Rel. Maria de Lourdes Antonio – DeJT 18/03/2022).

Além do ônus no tocante à prova da devolução da CTPS no prazo legal do artigo 29, § 8º, o Tribunal Superior do Trabalho – TST, vem consignando que a “jurisprudência desta Corte pacificou o entendimento de que a retenção da CTPS por prazo superior ao previsto nos arts. 29 e 53 da CLT enseja o pagamento de indenização por dano moral, sendo o dano presumível, in re ipsa.” (TST, RR-63700-16.2012.5.17.0006, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 16/08/2019).

No mais, o próprio Tribunal Superior do Trabalho – TST, em um acórdão de relatoria do Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello, destacou que a retenção indevida da CTPS por parte da empresa contratante promove aviltamento à dignidade da pessoa humana, aos valores sociais do trabalho, fere a boa-fé objetiva (artigo 422 do Código Civil) e gera danos extrapatrimoniais, sendo esses completamente não dependentes do dano material, cito o acórdão mencionado:

“INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – RETENÇÃO DA CTPS. A conduta da primeira-reclamada, que reteve de forma injustificada a CTPS do autor por mais de dois meses, atenta contra a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho, consoante o art. 1º, III e IV, da Constituição Federal, acarretando dano à esfera extrapatrimonial do trabalhador, além de configurar ofensa ao princípio da boa-fé objetiva, disposto no art. 422 do Código Civil. Ressalte-se que independentemente da prova de que o autor tenha sofrido prejuízo de ordem material, a devolução da CTPS no prazo previsto no art. 29 da CLT consiste em obrigação do empregador, pois o referido documento expressa toda vida laboral do trabalhador, sem o qual se encontra impossibilitado do exercício de atividade profissional subordinada e autônoma, fato suficiente para gerar dor moral, em virtude da apreensão sofrida e por não se encontrar na posse do documento, pelo que é devida a indenização por danos morais prevista nos arts. 5º, X, da Constituição Federal e 927 do Código Civil. Precedentes. Recurso de revista não conhecido.” (TST, RR-2086-55.2012.5.03.0020, Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 17/4/2015).

Deste modo, não há maiores dúvidas no sentido de que “a retenção da CTPS por tempo superior ao que a lei determina é ato ilícito apto a ensejar dano moral.” (TST, AIRR-848-04.2014.5.08.0210, Rel. Min. Dora Maria da Costa, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 13/3/2015), porque o ato aqui estudado “configura conduta ilícita e restringe o direito constitucional do empregado ao trabalho” (TST, Ag-AIRR-20842-98.2015.5.04.0014, 2ª Turma, Relatora Desembargadora Convocada Margareth Rodrigues Costa, DEJT 15/12/2023).

A mesma conclusão se mantém para os períodos diminutos, como por exemplo a retenção por um prazo inferior a 30 dias, vejamos uma condenação em danos morais de um empregador que segurou indevidamente a CTPS do empregado por menos de 30 dias:

“[…] RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMADO. […] DANO MORAL. RETENÇÃO DA CTPS. No caso concreto, o Regional consignou que o próprio reclamado admitiu ter mantido a CTPS do reclamante em seu poder por um período de quase um mês. Esta Corte tem se pronunciado no sentido de que o extravio ou a retenção da CTPS por tempo superior ao que a lei determina é ato ilícito apto a ensejar dano moral. Precedentes. Recurso de revista não conhecido. […]” (TST, RR – 1631-81.2012.5.04.0014, Data de Julgamento: 24/6/2015, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 30/6/2015).

E há no TST um Acórdão nos explicando que a apropriação da CTPS por mais de 48 horas a fim de promover a baixa do contrato de trabalho “sujeita o trabalhador a uma previsível discriminação no mercado de trabalho, fato capaz de caracterizar graves consequências de ordem social e econômica, além de ofensa à sua dignidade, o que, por si só, já é suficiente para acarretar dano moral” (TST, ARR – 216-91.2012.5.18.0008, Data de Julgamento: 27/5/2015, Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 5/6/2015).

Deve ser entendido pelo empregador que a CTPS é importante para o seu empregado, pois “As anotações na CTPS valem como prova de filiação à Previdência Social, relação de emprego, tempo de serviço e salário-de-contribuição” (MARTINS, 2012, p. 107),1 Delgado nos acrescenta que a CTPS é um “documento importante para a identificação socioprofissional do trabalhador (arts. 13 a 34, CLT)” (DELGADO, 2019, p. 1198),2 por isso tem o colaborador o direito à indenização pela retenção abusiva desse relevante documento pelo empregador.

E não pense que os julgados acima não se aplicam neste ano de 2024, pelo contrário, já é possível localizar um acórdão unânime no TST reafirmando o entendimento ora estudado, cito:

(…) III – RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE – REGÊNCIA PELA LEI Nº 13.467/2017 – INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RETENÇÃO CTPS. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA RECONHECIDA. A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais deste Tribunal firmou entendimento segundo o qual a retenção da CTPS da parte reclamante, por tempo superior ao previsto na lei, configura ato ilícito apto a ensejar dano moral in re ipsa. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento”

ACORDAM os Ministros da Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: (…) III – conhecer do recurso de revista interposto pelo reclamante quanto ao tema “INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RETENÇÃO CTPS”, por violação do inciso X do art. 5º da Constituição da República, e, no mérito, dar-lhe provimento para condenar a primeira reclamada A. I. LTDA. a pagar a indenização por danos morais de R$ 2.000,00 (dois mil reais) diante da retenção indevida da CTPS da parte autora. (TST, RR-RRAg-1222-98.2016.5.05.0641, 8ª Turma, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 19/02/2024).

Portanto, a orientação que damos aos empregadores, sejam eles de grande, médio ou pequeno porte, é que procurem observar os prazos do artigo 29, tanto para anotação quanto para devolução da CTPS, não os trate como algo sem maior importância, pois temos decisões do Tribunal Superior do Trabalho condenando pela retenção da CTPS superior ao prazo do artigo 29, ainda que essa seja inferior a 30 dias.

Por isso aconselho aos empregadores a conduta de prevenção, evitem problemas, façam as anotações no prazo de 5 dias úteis e devolvam a CTPS no de até 48 (quarenta e oito) horas a partir de sua anotação.

Igualmente aconselhamos que os empregadores jamais abram mão de pegar os recibos assinados pelos empregados no ato da entrega da CTPS, visto que “É do empregador ônus de provar o recebimento e a devolução da CTPS do trabalhador, a teor do art. 29 da CLT.” (TRT-2, Proc. 1000176-40.2020.5.02.0402, DeJT 18/03/2022), assim, com essa cautela, evita-se uma reclamação trabalhista desnecessária requerendo danos morais, que podem ser de R$ 2.000,00 (dois mil reais) ou eventualmente uma cifra maior.

Por fim, temos que ficou visível e muito clara a importância da devolução da CTPS ao empregado dentro do prazo legal do artigo 29, § 8º da CLT, podendo gerar danos morais a sua retenção indevida por um prazo superior ao legal.

 

Referências

____________________

1. MARTINS, Sérgio Pinto. Fundamentos de Direito do Trabalho, 13º Ed., São Paulo: Editora Atlas, 2012.

2. DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho, 18. Ed., São Paulo: Editora LTr, 2019.

Compartilhe nas Redes Sociais
Anúncio