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Cadê meu Mcfish?

mcfish mcdonald's

Na sexta-feira, dia 06 de fevereiro, depois de uma grande campanha nas redes sociais e na TV, embalada pela paródia da música Borbulhas de amor, que notabilizou Fagner, e agora cantada por Fábio Júnior, a Rede de Fast foods McDonald’s, trouxe de volta ao seu cardápio o sanduíche de peixe empanado, queijo cheddar e molho tártaro, Mcfish. A canção entoava:

Tenho um coração, dividido entre peixe, molho e pão
Tenho um coração, que há tempos te espera
Quem dera ser um fish, para em seu límpido aquário eu voltar
Com molho tártaro e queijo eu chegar
Matar essa saudade, junto de ti
Um fish
Saciar essa loucura, junto de ti
Para pa pa pa…

O produto que tinha saído do cardápio desde 2017, começou a ser anunciado no dia 17 de janeiro de 2024. Houve vendas antecipadas pelo aplicativo da rede e posteriormente estariam disponíveis aos demais consumidores. A venda antecipada, só no primeiro dia alcançou mais 50 mil vouchers, cerca de 10% do total, portanto, algo em torno de 500 mil produtos. Ocorre que, em poucos dias, os produtos esgotaram-se em todo o país, frustrando milhares de consumidores.

Só na página do Reclame Aqui, são mais de 298 reclamações, no site, delivery e aplicativos da rede de alimentos. Reclamações com o título “cadê meu mcfish”, “Mcfish é fakenews”, “Mcfumaça”, “Mcfish virtual”, dentre outras. Além das reclamações de que o sanduíche não é encontrado em lugar algum, existem reclamações de oferta não cumprida de consumidores que compraram na pré-venda e não receberam o produto e de consumidores que além de não receberem o produto não tiveram o estorno da quantia paga. Eu mesmo, fui um dos consumidores que me frustrei bastante com o rápido desaparecimento do produto das lojas. Consegui comer apenas um.

As reclamações também chegaram ao Procon_SP que notificou a rede a prestar esclarecimentos. O McDonalds tinha até a quinta-feira, 22, para encaminhar esclarecimentos sobre as quantidades produzidas e entregues do McFish, além de como o consumidor foi informado sobre a oferta, quais as razões que levaram ao esgotamento do estoque e se há previsão de restabelecimento do item no cardápio.

O Procon ainda solicitou explicações sobre como a empresa está lidando com os casos dos clientes que não conseguiram retirar o sanduíche, mesmo após compra em pré-venda; como os consumidores estão sendo atendidos; e quais os canais de atendimento disponibilizados, dentre outras informações relevantes para o entendimento da situação.

Diante desses problemas, quais aspectos do direito do consumidor devem ser levados em consideração nesse caso. A primeira questão a ser levantada, é que a Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, nos termos do art. 4º, da Lei n. 8.078/90. Ao oferecer o retorno de um produto que muitos consumidores sentiam falta, de forma esporádica e circunstancial, mesmo que avisada, houve uma violação ao princípio da transparência, já que muitos consumidores acreditaram que o produto estaria de volta ao cardápio. Ademais, é princípio da política nacional das relações de consumo, o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo, art. 4, I.

Há que se ressaltar que são direitos básicos do consumidor, a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem, bem como a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços, art. 6º, III e IV do CDC.

Outrossim, os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

Também é importante ressaltar que toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado, e a oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas e ostensivas sobre prazos de validade, dentre outros. O fornecedor é obrigado na publicidade a manter em seu poder, para informação dos legítimos interessados, os dados fáticos, técnicos e científicos que dão sustentação à mensagem, art. 36, parágrafo único.

O art. 35 do CDC, dispõe que se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha: I – exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade; II – aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente; III – rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.

E por fim, no aspecto da publicidade, nos termos do art. 37, § 1°, é enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.

Já com relação às práticas abusivas, é proibido condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos e recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes. Além de recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento.

Percebe-se que o CDC tem um amplo acarbouço jurídico que sustenta uma série de direito violados nessa campanha da rede, desde uma publicidade aparentemente confusa que induziu os consumidores a erro, até o não cumprimento da oferta de pré-venda dos consumidores que não conseguiram retirar o produto. Também é importante ressaltar aqueles que cancelaram o pedido e não receberam o dinheiro de volta. A prática comum do mercado é que os produtos que retornem ao cardápio de uma empresa, permaneçam disponíveis aos consumidores de forma definitiva, só havendo a sua interrupção ou suspensão por justa causa. O contrário a isso, viola a expectativa legítima criada nos consumidores, com base no princípio da boa-fé objetiva. É claro que a empresa tem plena autonomia para colocar e tirar do seu cardápio, produtos que não sejam rentáveis ou sustentáveis economicamente, a longo prazo, mas criar uma expectativa imensa nos consumidores e frustrá-los logo em seguida, também não parece ser uma alternativa inteligente do ponto de vista comercial, já que vem carregada de uma insatisfação desnecessária à imagem da empresa. No final dessa coluna, fica a pergunta ao McDonald’s, cadê o meu McFich?

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