Quem gosta do mercado financeiro provavelmente tomou conhecimento da disputa entre o influenciador Daniel Penin e a XP Investimentos. Em breve síntese, a instituição financeira entrou com uma ação judicial em desfavor do influenciador, pois Daniel publicou em seu canal do Youtube um vídeo de 36 minutos em que ele trata de um tema polêmico.
No vídeo intitulado “XP Investimentos – O $ do Impossível” o influenciador conta um imbróglio envolvendo a XP, que é acusada por algumas pessoas de utilizar dos seus assessores de investimentos para empurrar investimentos que são rentáveis para a instituição, mas não são benéficos ao investidor.
Toda a narrativa concentra-se em uma ferramenta chamada COE, ou Certificado de Operações Estruturadas. Diversos economistas, influenciadores e assessores de investimentos criticam os COEs, mas na minha coluna não entrarei nesse mérito.
É inquestionável que o COE é alvo de duras críticas por pessoas com amplo conhecimentos em finanças e investimentos e, principalmente, quase ninguém isento de interesses se apresenta como defensor desse produto. Segundo Penin, os assessores de investimentos, em regra, não são bem remunerados e as comissões pagas pela XP quando conseguem captar investimentos para seus COES são consideravelmente maiores, o que acaba por incentivar a indicação desse produto para que obtenham uma remuneração melhor ao final do mês.
Penin afirma, ainda, que o dinheiro recebido pelo Banco XP, via investimentos realizados através da XP Investimentos, seria usado livremente, sem o pagamento de remuneração adequada aos investidores, o que torna a operação altamente lucrativa. Todos esses argumentos são expostos por Daniel, seguindo um estudo feito pela consultoria americana Grizzly Research e depoimentos de ex-clientes e ex-assessores da XP. Há menção, inclusive, a matérias que cogitam a possibilidade de a XP atuar como pirâmide financeira ou praticar crimes contra o sistema financeiro. Embora tais situações sejam expostas, o próprio influenciador encerra o vídeo com a afirmação que não saber se tais práticas realmente ocorrem, ou seja, não apresenta opinião conclusiva.
Em razão desse vídeo, a XP entrou com uma ação contra o influenciador e o Poder Judiciário determinou a remoção do vídeo (autos 0057935-19.2025.8.19.0001 em trâmite perante a 26ª Vara Cível da Comarca do Rio de Janeiro), sob pena de multa de R$ 50.000,00 por hora do conteúdo disponibilizado, limitado o montante em R$ 500.000,00. Daniel, mesmo ciente da decisão e da possibilidade de pagar a multa pela manutenção do vídeo no seu canal, preferiu dobrar a aposta e não o indisponibilizou.
O vídeo já conta com mais 802 mil visualizações (em 15 de julho de 2025) e Daniel incluiu na descrição do vídeo a hashtag #diganãoacensura. Aqui surge o tema central desta reflexão: o efeito Streisand. Antes, porém, é preciso contextualizar.
O efeito Streisand é estudado desde 2005 e recebeu esse nome em razão de um episódio que envolveu a atriz Barbra Streisand, que processou um fotógrafo em 2003 para que fosse removida uma foto aérea da sua mansão de Malibu de uma coleção que reunia mais de 12 mil fotos da costa californiana. Antes do ajuizamento da ação, a foto contava com 6 visualizações, passando a contar com mais de 420.000 visualizações após a noticiada a existência da ação ao público.
Resultado? O que poderia causar um dano diminuto atingiu patamares alarmantes, dificilmente alcançados se não fosse a conduta da própria pessoa que se diz vítima.
Em termos práticos, o efeito Streisand consiste na ampla publicidade que um conteúdo ganha quando alguém pretende que seu autor seja compelido a indisponibilizá-lo. Publicidade essa que muito provavelmente não seria atingida organicamente.
Não faltam exemplos práticos, tanto no cenário internacional quanto no Brasil. Para trazer exemplos mais próximos e recentes, cito a tentativa de proibição de publicação do livro “Suzane Assassina e manipuladora” do autor Ulisses Campbell. O efeito Streisand, contudo, não se limita à tentativa judicial de censura, mas também diante de qualquer tentativa de impedir a publicação ou a remoção de conteúdo, como no caso da cantora Anitta ao desautorizar a publicação da sua biografia pelo jornalista Leo Dias.
O assunto exige muita ponderação dos envolvidos. Isso porque, não raras vezes, o conteúdo ganha publicidade inesperada justamente em razão da tentativa de escondê-lo. Vejamos alguns comentários deixados no vídeo de Penin:
Assim como esses, vários outros comentários também mencionam que usuários somente tomaram ciência acerca do vídeo após o ajuizamento da ação pela XP. Além dos que comentaram, milhares de outros usuários assistiram ao vídeo apenas devido à publicidade gratuita gerada pelo inconformismo judicialmente exposto pela instituição financeira. Esse, inclusive, foi o meu caso.
Acrescente-se, ainda, que diversas outras pessoas produziram conteúdo, tanto em vídeo, como em texto (essa minha coluna de julho também é um exemplo) sobre a ação e, consequentemente, trouxe um holofote ainda maior para o vídeo.
Não estou a julgar sobre quem tem razão. Se a XP se sentiu atingida em sua honra objetiva, busca licitamente a tutela jurisdicional. No entanto, nem tudo que é permitido convém.
Por isso, o jurídico deve sopesar muito cuidadosamente as opções diante de situações como essa, pois, muitas vezes, o remédio pode causar efeitos colaterais mais graves do que a própria doença.