A Lei Estadual n. 13.296/2008 estabelece no seu artigo 13-A o direito à isenção do IPVA para um único veículo de propriedade de pessoa portadora de transtorno de deficiência física, sensorial, intelectual ou mental, moderada, grave ou gravíssima.
Cumpre esclarecer que a Lei Estadual n. 14.481/2011, em seu artigo 1º, classifica a visão monocular como deficiência visual.
No âmbito Federal, a Lei n. 14.126/2021 taxativamente classificou a visão monocular como deficiência sensorial, do tipo visual.
Diante do exposto, não há dúvidas de que a visão monocular é, para todos os efeitos, considerada deficiência sensorial, devendo se encaixar perfeitamente no artigo 13-A da Lei Estadual n. 13.296/2008 para fins de isenção do IPVA.
Desde já, por cautela, defende o presente artigo que os critérios da Portaria CAT nº 27/2015 e do Regulamento do ICMS não devem se sobrepor às classificações da Lei Federal n. 14.126/2021 e da Lei Estadual n. 14.481/2011, cito decisões do TJ-SP:
Portanto, é evidente que a visão monocular que acomete a autora deve ser enquadrada no conceito de deficiência visual, afastando-se a aplicação dos critérios da Portaria CAT n. 27/2015 e do Regulamento do ICMS, que seguem entendimento diverso das leis hierarquicamente superiores mencionadas. (TJSP; Recurso Inominado Cível 1006302-05.2019.8.26.0053; Relator (a): Antonio Carlos de Figueiredo Negreiros – Colégio Recursal; Órgão Julgador: 8ª Turma Recursal de Fazenda Pública; Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes – 4ª Vara do Juizado Especial da Fazenda Pública da Capital; Data do Julgamento: 30/01/2024; Data de Registro: 30/01/2024).
ISENÇÃO DE IPVA. PORTADOR DE VISÃO MONOCULAR. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DO BENEFÍCIO PENA DE VIOLAÇÃO DE NORMAS JURÍDICAS SUPERIORES E O PRINCÍPIO DA ISONOMIA TRIBUTÁRIA. SENTENÇA MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS – RECURSO NÃO PROVIDO. (TJSP; Recurso Inominado Cível 1001968-54.2021.8.26.0053; Relator (a): Marcelo Benacchio; Órgão Julgador: 5ª Turma – Fazenda Pública; Foro Central – Fazenda Pública/Acidentes – 3ª Vara do Juizado Especial da Fazenda Pública da Capital; Data do Julgamento: 22/02/2022; Data de Registro: 22/02/2022)
MANDADO DE SEGURANÇA IPVA – AQUISIÇÃO DE VEÍCULO POR PESSOA COM DEFICIÊNCIA (VISÃO MONOCULAR) – Veículo que prescinde de adequação Isenção Possibilidade Circunstância que não afasta o benefício Presença dos requisitos necessários à concessão – Art. 13, III, da Lei Estadual nº 13.296/2008 Portaria CAT 27/2015 que não deve ser interpretada literalmente Interpretação sistemática e teleológica Isenção fiscal que visa à inclusão social da pessoa com deficiência – Princípios da igualdade e isonomia tributária Descabida restrição diante da proteção constitucional da dignidade da pessoa humana e da igualdade Precedentes deste E. Tribunal Sentença mantida. Apelo e reexame necessário não providos. (TJSP; Apelação Cível 1000909-36.2019.8.26.0462; Relator (a): Spoladore Dominguez; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Público; Foro de Guarulhos – 1ª Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 29/01/2020; Data de Registro: 30/01/2020 – grifei).
Conclui-se da leitura dos acórdãos acima que não pode a Portaria CAT nº 27/2015 e o Regulamento do ICMS se sobreporem à Legislação, devendo ser afastados no que obstar o benefício ao cidadão portador da visão monocular.
E que não se argumente que a Resposta à Consulta Tributária n. 5921/2015, de 15 de outubro de 2015 é suficiente para barrar o direto à isenção, na ocasião, de maneira não isonômica e desrazoável, opinou a SEFAZ/SP o seguinte:
IPVA – Isenção – Deficiente Visual – Visão Monocular.
I – A isenção do IPVA não se direciona ao portador da deficiência física irrestritamente, mas àquele que, para conduzir, necessita de um veículo com características próprias, adequadas às dificuldades que lhe são impostas pela deficiência física. Os portadores de visão monocular podem dirigir veículos convencionais, portanto, não são alcançados pela referida isenção.
Todavia, em que esse tipo de entendimento, além dele não ser vinculante, fere o princípio da isonomia tributária (art. 150 da Constituição Federal), não atende aos princípios basilares da igualdade de acesso e da inclusão social dispostos no Estatuto da Pessoa com Deficiência (art. 1º) e não promove a dignidade da pessoa humana, lembrando que essa última é um dos fundamentos da nossa República (art. 1º, III da Carta Maior).
De mais a mais, com o devido respeito aos que defendem o contrário, é assente no Tribunal de Justiça de São Paulo que o portador de visão monocular é detentor do benefício do artigo 13-A da Lei Estadual n. 13.296/2008, cito:
Declaratória. Isenção de IPVA. Visão Monocular. Sentença de procedência que declarou a isenção para o exercício de 2022 e seguintes. Inconformismo da Fazenda Estadual. Isenção prevista no art. 13-A da Lei Estadual nº 13.296/2008. Visão Monocular reconhecida como deficiência sensorial pela Lei nº 14.126/2021. Direito à isenção bem reconhecido. Sentença mantida. Recurso desprovido. (TJSP; Recurso Inominado Cível 1019394-91.2022.8.26.0361; Relator (a): Paulo Eduardo de Almeida Chaves Marsiglia; Órgão Julgador: 3ª Turma Recursal Cível e Criminal; Foro de Mogi das Cruzes – Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 31/08/2023; Data de Registro: 31/08/2023).
Deficiente físico. Pleito de isenção de IPVA de 2015-2019. Autor comprovou visão monocular. Sentença de procedência mantida. Recurso desprovido. (TJSP; Recurso Inominado Cível 1041659-48.2019.8.26.0602; Relator (a): Roge Naim Tenn; Órgão Julgador: 1º Turma da Fazenda Pública; Foro de Sorocaba – Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 31/01/2022; Data de Registro: 31/01/2022).
RECURSO INOMINADO – AÇÃO DECLARATÓRIA C.C. RESTITUIÇÃO DE VALOR. ISENÇÃO DE IPVA SOBRE VEÍCULO. DEFICIENTE VISUAL. VISÃO MONOCULAR. DIVERGÊNCIA: SE A ISENÇÃO PODE SER DEFERIDA A QUEM TEM VISÃO MONOCULAR. Possibilidade. Deficiência devidamente comprovada. Direito à isenção dos tributos incidentes sobre veículo. Sentença confirmada por seus próprios fundamentos nos termos do art. 252, do Regimento Interno, do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Recurso da Fazenda desprovido. (TJSP; Recurso Inominado Cível 1002281-97.2020.8.26.0619; Relator (a): Jorge Luís Galvão; Órgão Julgador: Turma Recursal Cível e Criminal; Foro de Taquaritinga – Juizado Especial Cível e Criminal; Data do Julgamento: 06/05/2021; Data de Registro: 06/05/2021).
Encerro o presente escrito criticando qualquer discriminação ou obstáculo de acesso à isenção do IPVA aos portadores de visão monocular no Estado de São Paulo, pois a Lei Estadual n. 14.481/2011 em seu artigo 1º a classifica como deficiência visual e a Lei Federal n. 14.126/2021 taxativamente a trata como deficiência sensorial do tipo visual, qualquer discriminação vai na contramão da isonomia tributária (art. 150 da CF/88) e não atende aos princípios orientadores do Estatuto da Pessoa com Deficiência (art. 1º).