Em tradução livre, temos a cominação “Fusões e aquisições”, a qual introduz uma série de etapas e cláusulas pelas quais uma negociação de compra e venda ocorre, no contexto empresarial. Vamos além, este fenômeno se consubstancia na formalização de proposta de fusão e aquisição de uma empresa através da celebração de contratos de Compra e Venda, nos conformes dos Arts. 481 a 532 CC/02.
Vê-se que nesta operação um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro (art.481 CC/02). Portanto, a lógica indica a necessidade da existência, na relação negocial, de objeto, preço e consentimento. Desta forma, uma vez que as partes consentem em relação ao objeto e ao preço a ser pago, o contrato é considerado perfeito e acabado, o que remete à Teoria Civilista Clássica.
Em consonância à mesma, tivemos recentemente a introdução da Lei 13.874/19 – Lei da Liberdade Econômica –, que incluiu os §§ 1o e 2o no art. 113 do CC, de forma a permitir a interpretação dos negócios jurídicos conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração. Nesta linha, definiu-se que as partes poderão livremente pactuar regras de interpretação, de preenchimento de lacunas e de integração dos negócios jurídicos diversas daquelas previstas em lei. A título de precaução, a modificação da referida lei favorece a implementação de cláusula que obriga o regimento e a interpretação do contrato conforme as Leis do Brasil em contratos desta natureza, bem como a declaração, por parte de ambos os lados, de que foram assistidos legalmente e que o contrato foi redigido em conjunto pelas Partes, seguindo as presunções de paridade e simetria contratual.
E como se dá a trajetória desta operação? Basicamente, é possível delimitá-la, primeiramente, pelas conversas iniciais. Em seguida, é comum que hajam contratos iniciais, após, a due diligence, passando pela fase de contratos definitivos, para, enfim, chegarmos às fases determinantes de signing, closing, e pós-closing. Não obstante, é fundamental apontar que a linha adotada aqui consubstancia-se num padrão somente, cabendo a alteração da ordem dos fatores, bem como a omissão de algum deles, quando determinadas etapas não forem cabíveis devido às nuances do negócio.1
Nas conversas iniciais, é natural que haja, primeiramente, um acordo de confidencialidade — contrato em que as partes acordam pelo sigilo de uma das partes, senão de ambas, e nao divulgação de informações repassadas ao longo da negociação (desde algoritmos, fórmulas, softwares, know-how, estratégias, números ou modelos de negócio), passível de multas altíssimas.
É interessante, ainda, o acréscimo de contratos iniciais, tais como LOI e MOU, que seriam a Carta de intenção (letter of intent) – acordo que delineia os principais pontos de um contrato proposto entre duas partes somente (servindo de ponto de equilíbrio ao longo da negociação) – e o Memorando de Entendimentos (Memorandum of Understanding), um acordo por escrito no qual os termos do contrato estão definidos de forma aberta e acordados com os objetivos almejados que pode ser feito por mais de duas partes. Lembrando sempre que existe a modalidade de Proposta, em que o interessado na Target encaminha um documento expressando sua vontade (Carta Proposta). Tal documento é um negócio jurídico unilateral com destinatário, cuja finalidade é a formação de um contrato.2
Posteriormente temos na Due Diligence uma série de atos preparatórios para a consumação do negócio. A começar por uma auditoria societária – considerando a capacidade de apontamento de questões relevantes que podem influenciar diretamente no prosseguimento da operação, bem como na composição do preço –. Em síntese, se resumindo à avaliação dos atos constitutivos; a avaliação do estado de registro dos autos; da análise dos livros sociais; a Análise de eventuais acordos de sócios/acionistas; e a uma série de auditorias, sejam elas, cível contratual, tributária, trabalhista, ambiental e concorrencial. Lembrando, por fim, da legal opinion, em que o assessor legal, em uma Due diligence, responsável pela condução da análise documental elabora uma Opinião Legal, também conhecida como Relatório de Due Diligence, onde são abordados os resultados encontrados em cada um dos tópicos preparatórios retromencionados.3
Já os Contratos Definitivos findam-se em seu objeto. Isso se dá pelas nuances de cada acordo… afinal, no SPA/QPA, tem-se como objeto a alienação/ aquisição de ações/quotas (o cash out); em se tratando de APA, temos a alienação/aquisição de ativos, ao passo que em SSA/QSA será a subscrição de ações/quotas (Cash In).
Após, a preocupação se volta à discussão do preço, que difere de valor, pelo fato de que o primeiro remete ao preço de uma transação que é o índice econômico que corresponde ao equilíbrio das expectativas de valor entre o comprador e o vendedor. Por outro lado, valor seria o processo de valoração de uma empresa ou de qualquer outro ativo sempre envolverá conceitualmente um certo grau de subjetividade. Sendo Cash In, a modalidade onde os investidores realizam o investimento na Target por meio de emissão de novas ações. E Cash Out, a modalidade onde os investidores adquirem participações dos vendedores, sem, necessariamente, realização de aportes diretos na Target. Lembrando sempre que é fundamental que haja a Estruturação do preço de aquisição de forma a minimizar os riscos da operação, atrelando o preço a garantias a serem prestadas pelo vendedor, de modo a possibilitar a compensação dos valores.4
Ainda sobre Contrato Definitivo, cabe apontar as Condições Precedentes (art. 121, CC), que se projetam no futuro, pós-criação do vínculo contratual, e tem como objetivo alocar o risco de incertezas acerca de um determinado evento, sendo elas suspensivas ou resolutivas. Pelo exposto, é preciso que hajam Declarações e Garantias, que visam apresentar e/ou expor a situação financeira, jurídica, operacional e contábil da target e de suas partes; afirmar que tudo que era de conhecimento das partes foi devidamente apresentado, sem nenhuma ressalva e/ou omissão de informação.
Tendo, por fim, o Fechamento e seus Atos, vez que temos o momento de assinatura do contrato (signing), um intervalo de tempo para atendimento às condições precedentes que culminaram no efetivo fechamento da operação (Closing); que seriam determinadas Obrigações de Fazer e Obrigações de Não-Fazer, como a Verificação do cumprimento das condições precedentes definidas em contrato; Apuração da manutenção e validade das D&G; Realização dos atos do fechamento (pré-definidos em contrato) e a Celebração de Termo de Fechamento consolidando os atos realizados na Data de Fechamento.
No closing, é o momento em que se demonstra o cumprimento das condições prévias ou abdicação das mesmas. Esta etapa possibilita o pagamento na forma acordada em contrato e a transferência de titularidade dos bens. O fechamento acontece quando todas as condições anteriores já foram cumpridas e as partes se reúnem para formalizar o fim da operação.
Assim, em se tratando de closing, via de regra, ocorrerão: a produção de documentos indicando a renúncia dos administradores atuais; o envio das certidões negativas da marca; teremos a assinatura dos documentos que comprovam o fechamento do preço; a mudança no que diz respeito às participações acionárias nos livros de registro e de transferência de ações; e o pagamento acordado, nas formas previstas no contrato.
Por fim, temos o pós-closing, que seria a última fase, consistente na finalização do processo de M&A, com registro da alteração de sociedade (cadastro do CNPJ, INSS e FGTS etc). Após o closing as partes devem realizar as medidas necessárias para implementar a operação fechada, dentro dos prazos legais ou contratuais pertinentes.
Em suma, a complexidade de uma aquisição de parte de uma atividade empresarial, quiçá, sua integridade contrai a preocupação para com inúmeras nuances, todas postas ao longo da realização de uma negociação. Sendo assim, a cautela e a seriedade nas tratativas nada mais representam que a chave para o sucesso de tal operação, haja vista principalmente as consequências socioeconômicos para o todo, isto é, o coletivo dependente do futuro destas companhias.
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Referências
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1. LUZIO, Eduardo. Fusões e Aquisições em ato: Guia Prático: Geração e Destruição de Valor em M&A. Rio de Janeiro: Senac, 2015.
2. DEPAMPHILIS, Donald. Mergers and Acquisitions Basics. Cambridge: Academic Press, 2010.
3. SHERMAN, Andrew. Mergers and Acquisitions from A to Z. HarperCollins Leadership. Nashville: HarperCollins Leadership, 2018.
4. SILVA, Americo Luis Martins Da. Sociedades Empresariais – Volume 1: Noções de Sociedade – Ato Constitutivo – Contrato Social – Espécies – Sociedade Simples – Sociedade Limitada – Sociedade Cooperativa. United States: Createspace Independent Publishing Platform, 2015.