Instagram, Depressão e Responsabilidade Civil Preventiva do Fornecedor

Instagram, Depressão e Responsabilidade Civil Preventiva do Fornecedor

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A sociedade contemporânea – complexa, plural e assimétrica –, se apresenta intensamente marcada pelo alto grau de tecnologias presente no dia a dia das pessoas. “Nesse cenário, repleto de transformações tecnológicas, o desenvolvimento das redes sociais virtuais representa um fenômeno recente, que vem causando grande impacto nas relações humanas e, portanto, nas relações jurídicas”.1

Recentemente, a rede social Instagram repercutiu na mídia devido a dados que apontam para efeitos negativos da mesma sobre jovens, notadamente depressão e ansiedade.

Uma série de reportagens do The Wall Street Journal mostrou, recentemente, que o Facebook tem dados que mostram que o Instagram torna a vida de alguns de seus usuários pior — garotas adolescentes, por exemplo. As matérias foram feitas com base em dados vazados ao jornal e mostram, em resumo, que a plataforma está ciente dos efeitos negativos — como depressão e ansiedade — que é capaz de causar, na pressão pela “vida perfeita”.2 

Reconhece-se todavia que as redes sociais tem efeitos positivos, mas esses não dissipam os negativos. As redes sociais devem obediência estrita aos princípios constitucionais, em especial a dignidade da pessoa humana, bem como aos direitos básicos do consumidor, uma vez que que serviços ainda que remunerados indiretamente submetem-se ao Código de Defesa do Consumidor (art. 3º, §2º, CDC),3 caso esse das redes sociais.

Acredito que qualquer coisa que for usada em escala terá resultados positivos e negativos. Carros têm resultados positivos e negativos. Nós entendemos isso. Sabemos que mais pessoas acabam morrendo porque existem acidentes de carro. Mas em geral, os carros criam muito mais valor no mundo do que destroem. E eu acho que as redes sociais são similares.4 

Cumpre destacar que o artigo 6º, I, CDC, estabelece como direito básico do consumidor: “a proteção a vida, saúde e segurança por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos”.5

Diante do reconhecimento do direito básico do consumidor à saúde, surge uma responsabilidade civil preventiva positiva do fornecedor em evitar tais danos.

Com relação aos fornecedores, são duas as espécies de deveres correspondentes ao direito do consumidor de prevenção de danos: deveres positivos e deveres negativos. Com relação aos primeiros, avulta o dever de informar aos consumidores sobre os riscos dos produtos e serviços introduzidos no mercado (artigos 6º, III, 8º e 9º), assim como às autoridades, quando os riscos se tornem conhecidos após a introdução do produto no mercado (artigo 10, § 1º). Por outro lado, dentre os deveres negativos (deveres de abstenção), destaca-se o de não introduzir no mercado produtos que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde e à segurança dos consumidores (artigo 10, caput).6 

Frisa-se que houve medidas parcialmente exitosas como a adotada pelo Instagram de esconder likes, que potencialmente auxilia no combate ao bullying e doenças relacionadas ao comportamento social.7

Ocultar curtidas pode ser um passo positivo para melhorar a saúde mental dos usuários, mas a mudança pode não ser motivada pelo desejo de cuidar dos usuários. Eu adoraria pensar que é porque eles se preocupam com a saúde mental de todos, mas esse não é o trabalho deles. Nunca devemos assumir que essas empresas de mídia social com fins lucrativos estão buscando melhorias para nossa própria saúde mental. Eles não estão no negócio de cuidar de nós. Eles não estariam vendendo nossos dados privados se esse fosse o caso.8 

Importa destacar que o interesse precípuo das redes sociais é com seus acionistas, por esse motivo as medidas por eles adotas têm sido ineficazes, uma vez que os índices de depressão e ansiedade em jovens tem aumentado em decorrência do padrão de uso das redes sociais.9

Nessa linha de intelecção, é imprescindível a atuação da sociedade e do Estado a fim de buscar um espaço virtual mais saudável, impondo exigências aos prestadores de serviços de redes sociais, mediante alterações legislativas com esse escopo, bem como a propositura de ações judiciais a fim de exigir o cumprimento de legislações que tangenciam o tema como o CDC.

Não se almeja imposições desarrazoadas aos fornecedores, mas com emprego de tecnologias já disponíveis e aplicadas nas redes sociais como Inteligência Artificial10 é passível de fazer verificações sobre a veracidade de fotografias, diminuindo a insatisfação com a imagem corporal dos jovens,11 que atualmente gira em torno dos 70% para meninos e 90% para meninas,12 e mitigando o padrão irreal de vida a que os jovens são impostos.

Sem olvidar todavia, da necessidade de propiciar aos jovens educação sobre o uso das redes sociais.

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Clayton Douglas Pereira Guimarães

Glayder Daywerth Pereira Guimarães

 

Referências

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1. TEFFÉ Chiara Spadaccini de; MORAES Maria Celina Bodin de. Redes sociais virtuais: privacidade e responsabilidade civil Análise a partir do Marco Civil da Internet. Revista Pensar. v. 22, n. 1, 2017, p. 110. Disponível em: https://bit.ly/39knFFk. Acesso em: 19 set. 2021.

2. CHEFE do Instagram é criticado por comparação entre carros e redes sociais. Exame. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3koGZYB. Acesso em: Acesso em: 19 set. 2021.

3. BRASIL. Lei 8.078. Código de Defesa do Consumidor, 1990. Disponível em: https://bit.ly/3CxSaED. Acesso em: 19 set. 2021.

4. Segundo Adam Mosseri, CEO do Instagram (INSTAGRAM boss Adam Mosseri on teenagers, Tik-Tok and paying creators. Recode Media Podcast. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3kq7WLo. Acesso em: 19 set. 2021).

5. BRASIL. Lei 8.078. Código de Defesa do Consumidor, 1990. Disponível em: https://bit.ly/3CxSaED. Acesso em: 19 set. 2021.

6. MIRAGEM, Bruno. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo. Revista dos Tribunais, 2016. [E-book]

7. FACEBOOK e Instagram vão dar opção de usuário esconder curtidas. Exame. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3AscyGn. Acesso em 19 set. 2021.

8. Segundo Renee Engeln, professora de psicologia da Northwestern University (RIBEIRO, Felipe. Instagram | Esconder likes não é para ajudar saúde mental, dizem especialistas. Canaltech. 2020. Disponível em: https://bit.ly/3tTf2Ls. Acesso em: 19 set. 2021).

9. SANCHES, Paula da Fonte; FORTE, Cleberson Eugênio. Redes sociais e depressão: um estudo estatístico sobre a percepção de bem-estar em estudantes universitários. Revista Tecnológica da Fatec Americana. v. 7 n. 02, 2019. Disponível em: https://bit.ly/3tUVXse. Acesso em 19 set. 2021.

10. Para saber mais recomenda-se a leitura de: MEDON, Felipe. Inteligência Artificial E Responsabilidade Civil: Autonomia, Riscos E Solidariedade. Indaiatuba: Foco. 2020.

11. LIRA, Ariana Galhardi. et al.  Uso de redes sociais, influência da mídia e insatisfação com a imagem corporal de adolescentes brasileiras. Jornal Brasileiro de Psiquiatria. 2017. Disponível em: https://bit.ly/3EJLMvU. Acesso em 19 set. 2021.

12. ROYAL Society for Public Health. Social media and young people’s mental health and wellbeing.
Disponível em: https://bit.ly/3Ezkc49. Acesso em 19 set. 2021.

 

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