Os Estados Unidos continuam sendo o principal destino global para estudantes internacionais, tendo recebido um número recorde de mais de 1,1 milhão de alunos no ano acadêmico de 2023-2024.1 De acordo com dados divulgados pelo Departamento de Estado dos EUA e pelo Institute of International Education, esse número representa um aumento de 7% em relação ao ano anterior e marca o maior total já registrado no país.2 Esses estudantes vêm de mais de 200 países e territórios, com a Índia ultrapassando recentemente a China como principal país de origem. Historicamente, a presença de estudantes internacionais sempre foi vista como um fator que enriquece a vida cultural e acadêmica dos campi norte-americanos, além de contribuir significativamente para a economia dos EUA, com um impacto estimado em mais de 50 bilhões de dólares arrecadados com despesas com mensalidades, moradia e custos relacionados à educação do estudante estrangeiro.
Diante desse crescimento e com o início da nova administração, mudanças recentes no processo de solicitação de visto de estudante mostram esforços mais amplos para aumentar a segurança e o controle sobre quem entra no país com esse tipo de visto. Uma dessas medidas, implementada ainda no primeiro semestre de 2025, exige que todos os solicitantes de vistos F, M e J (voltados a estudantes, pesquisadores visitantes e participantes de programas de intercâmbio) forneçam informações sobre seus perfis em redes sociais utilizados nos últimos cinco anos e garantam que esses perfis estejam públicos durante o processo de avaliação consular.3
Dando continuidade a essas mudanças, uma nova proposta foi anunciada em agosto de 2025 pelo Departamento de Segurança Interna dos EUA (DHS), com o objetivo de alterar ainda mais a forma como os vistos de estudantes são administrados.4 O cerne da proposta é a substituição da política atual que autoriza a permanência do estudante estrangeiro nos EUA “enquanto mantido o status” (conhecida como duration of status) por um modelo de visto com prazo fixo. Atualmente, estudantes podem permanecer legalmente no país enquanto estiverem regularmente matriculados e cumprindo os requisitos do curso, sem uma data final predefinida. Isso facilita a permanência por um prazo superior ao inicialmente planejado quando o estrangeiro solicita o visto de estudante. Um exemplo clássico é o estudante admitido para cursar um bacharelado nos EUA que solicita o visto de estudante para realizar os estudos (geralmente com duração de quatro anos) e após a formatura é admitido em um programa de pós-graduação. Nesses casos, uma vez admitido formalmente no programa de pós-graduação, cabe apenas à universidade comunicar à imigração por meio do sistema SEVIS (Student and Exchange Visitor Information System), e o estudante poderá continuar legalmente nos EUA pelo tempo de duração do novo programa.
Esse tipo de extensão da permanência (o do status de estudante) é autorizada para estudos em diversos graus sem que haja um profundo escrutínio, sendo possível que um estudante finalize um doutorado e, em seguida, matricule-se em um novo bacharelado; ou curse três bacharelados seguidos. Esse tipo de situação tem sido apontada pela nova administração como um abuso da finalidade do visto de estudante. Nesse contexto, a proposta prevê que o período inicial de permanência passe a ser limitado à duração do programa acadêmico, com um máximo de quatro anos. Estudantes que precisarem de mais tempo para concluir seus estudos (o que inevitavelmente aconteceria no caso de um doutorado) ou desejarem estender sua estadia matriculando-se em um novo curso terão de solicitar uma extensão junto ao Serviço de Cidadania e Imigração dos EUA (USCIS – a agência de imigração responsável por analisar pedidos de visto), o que implicará uma nova análise e possível triagem adicional.
Segundo o DHS, ao estabelecer limites claros de permanência, a agência pretende melhorar o monitoramento dos estudantes estrangeiros e garantir que o visto seja usado estritamente para fins acadêmicos. Mudanças semelhantes também foram sugeridas para outras categorias de visto, como os destinados a profissionais representantes da imprensa estrangeira. A regra ainda passará por um período de consulta pública, quando recebe críticas e sugestões de entidades envolvidas, como universidades e a Associação Americana de Advogados de Imigração (American Immigration Lawyers Association – AILA), antes de qualquer decisão definitiva.
Apesar de a proposta ser apresentada como uma medida para reforçar o controle e a segurança nacional, ela poderá trazer implicações práticas tanto para os estudantes quanto para as instituições de ensino. Alunos matriculados em programas de longa duração, como doutorados ou cursos de mestrado com foco em pesquisa, poderão ter de lidar com processos adicionais para solicitar prorrogações durante o programa. Universidades também precisarão adaptar seus serviços de orientação para garantir que os estudantes internacionais compreendam e cumpram as potenciais novas exigências. Além disso, é esperado que as condições do visto influenciem as decisões de estudantes internacionais na hora de escolher o país onde irão estudar, especialmente quando compararem os Estados Unidos com outras nações que oferecem políticas de imigração mais flexíveis.
Uma redução drástica no fluxo de estudantes internacionais para os EUA poderia até mesmo causar impactos econômicos uma vez que, segundo dados da Associação Internacional de Educadores (NAFSA: Association of International Educators), a cada três estudantes internacionais, uma vaga de trabalho é criada/apoiada nos EUA.5
Em resumo, o recente aumento no número de matrículas internacionais reforça que os Estados Unidos continuam sendo um destino atrativo para estudantes internacionais. Contudo, o cenário regulatório naquele país está passando por mudanças significativas, reforçando uma orientação para um controle migratório mais rígido e sistemático. O efeito dessas mudanças dependerá de sua implementação final e da forma como estudantes, universidades e autoridades irão lidar com o novo modelo de regulamentação.
Diante desse cenário em constante evolução, é fundamental que qualquer pessoa interessada em estudar nos Estados Unidos se planeje com antecedência e busque informações atualizadas sobre as regras de imigração e os requisitos para obtenção do visto de estudante. Mudanças nas políticas de vistos podem impactar diretamente a duração da estadia, os processos de renovação e até mesmo a possibilidade de concluir um curso no país. Por isso, acompanhar fontes oficiais e manter contato com a instituição de ensino desejada são passos essenciais para garantir uma experiência acadêmica segura, regular e bem-sucedida nos Estados Unidos.
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Débora Neuenschwander Martins
Advogada de imigração licenciada nos Estados Unidos atuando no escritório Liv Immigration Law. Bacharel pela UFMG e LLM em Direito Internacional e Direitos Humanos pela Universidade do Colorado em Boulder.
Referências
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