O fim das saídas temporárias da prisão e o processo de ressocialização de pessoas presas no Brasil

O fim das saídas temporárias da prisão e o processo de ressocialização de pessoas presas no Brasil

preso

A saída temporária da prisão sempre foi um assunto que gera bastante polêmica no meio social, em especial quando são noticiados nas mídias casos de ocorrências criminais graves envolvendo seus beneficiários.

Inicialmente, é bastante importante esclarecermos que o direito à saída temporária da prisão tem previsão legal em nosso ordenamento jurídico através da Lei nº. 7.210/19841 , tendo como destinatários apenas pessoas presas que cumprem pena em regime semiaberto, direito que não é concedido, em nenhuma hipótese, àquelas que cumprem pena privativa de liberdade em estabelecimentos penais de regime fechado.

Dito isso, é importante também termos em mente que a concessão deste benefício integra o processo de ressocialização da pessoa presa pelo fato de permitir que o(a) condenado(a) possa além de visitar a família, estudar e trabalhar, visando de forma gradativa (ou progressiva) sua melhor reinserção social.

Nesse sentido, a saída temporária encontra previsão legal no caput do art. 122 da Lei de Execução Penal, apresentando, ainda, as hipóteses nas quais a saída da prisão poderá ser concedida. In verbis:

Art. 122. Os condenados que cumprem pena em regime semiaberto poderão obter autorização para saída temporária do estabelecimento, sem vigilância direta, nos seguintes casos:

I – visita à família;

II – frequência a curso supletivo profissionalizante, bem como de instrução do 2º grau ou superior, na Comarca do Juízo da Execução;

III – participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social. (BRASIL, 1984).

A saída temporária deve ser autorizada pelo juízo da execução penal, caso a pessoa presa preencha os requisitos objetivos e subjetivos para fazer jus ao benefício. Além disso, deverão ser ouvidos o Ministério Público e a própria Administração Penitenciária responsável pelo gerenciamento do estabelecimento penal no qual a pessoa cumpre a pena privativa de liberdade.

Os requisitos objetivos e subjetivos para a obtenção do benefício da saída temporária são: 1) comportamento adequado (isto é, bom comportamento carcerário); 2) cumprimento de ¼ da pena para condenado primário, e ¼ se reincidente; 3) compatibilidade do benefício com os objetivos da pena; e 4) não ser condenado pela prática de crime hediondo com resultado morte2. .

Observados os requisitos objetivos e subjetivos para que a pessoa presa possa ser beneficiada pela saída temporária, o juiz da execução a autorizará, estabelecendo a duração da saída, vedada a delegação para a autoridade prisional (diretor(a) do presídio).

O tipo de saída temporária mais polêmico é aquele previsto no inciso I (visita à família), popularmente conhecido como saidão, que ocorre, via de regra, em véspera de feriados prolongados como “Dia das mães”, “Dia dos pais”, Dia das crianças”, “Natal” e “Ano Novo”.

O conhecido “saidão” sempre foi um assunto polêmico no meio social, em especial quando são noticiados crimes que ocorrem nesses períodos, praticados por condenados(a) que deixam temporariamente os presídios com a finalidade de verem seus familiares e comemorarem juntos algumas datas festivas do ano.

Dessa forma, alguns entendem que se trata de benefício humanitário e, para outros, trata-se de benefício que coloca a sociedade em risco.

Diante desse embate, entre pessoas favoráveis à concessão do benefício da saída temporária e outras contra, surgiu o Projeto de Lei nº. 4086/20193. , que visa extinguir as saídas temporárias. O referido projeto de lei foi aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, seguindo, rapidamente, seu trâmite legal rumo à sanção ou veto presidencial.

O fim das saídas temporárias parece ser, claramente, um clamor social, isso é fato. A sociedade está cansada da impunidade, mas não se trata de um assunto de simples resolução, assim como tudo que envolve o sistema prisional.

Com o fim das saídas temporárias, caso seja o projeto de lei sancionado pelo Presidente da República, milhares de condenados(a) serão prejudicados em seu processo de ressocialização.

Ademais, a concessão da saída temporária da prisão integra o processo de ressocialização da pessoa privada da liberdade.

De mais a mais, o público presente nos estabelecimentos penais brasileiros é bastante diversificado, que vai de criminosos primários que praticaram crimes sem violência ou grave ameaça à pessoa, a criminosos contumazes, que praticaram crimes graves com resultado morte, por exemplo, criminosos que integram organizações criminosas e afrontam o poder público, aterrorizando a sociedade dentro e fora dos estabelecimentos penais.

Sendo assim, não nos parece razoável que o benefício da saída temporária seja completamente extinto devido às graves falhas e omissões do próprio poder público, que se mostra incapaz de avaliar o mérito individual da concessão do benefício.

Diante disso, é possível perceber que no sistema prisional brasileiro os benefícios são concedidos ou restringidos de forma coletiva, ferindo o que prega a própria Lei de Execução Penal (LEP), no tocante à individualização da pena. Não bastasse isso, atinge gravemente o processo ressocialização.

Aguardemos os próximos capítulos acerca da extinção das saídas temporárias e os efeitos que serão produzidos dentro e fora dos estabelecimentos penais.  Obviamente, torcemos para que a razoabilidade e proporcionalidade estejam presentes em todas as novidades legislativas, principalmente naquelas que visam a retirada de direitos já estabelecidos e consolidados em nosso ordenamento jurídico.

 

Referências

___________________

2. Miranda, Rafael de Souza, pg. 244.

3. Altera a Lei nº. 7.210 de 11 de julho de 1984, extinguindo as saídas temporárias.

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