Blockchain e Bitcoin são termos que podem causar certo espanto a algumas pessoas e temor a outras, seja por desconhecimento ou desinformação muitas vezes o termo é conectado a utilização escusa por criminosos para realização de transações.
O blockchain pode ser descrito como:
Uma moeda digital peer-to-peer (par a par ou, simplesmente de ponto a ponto), de código aberto, que não depende de uma autoridade central. Entre muitas outras coisas, o que faz o bitcoin ser único é o fato de ele ser o primeiro sistema de pagamentos global totalmente descentralizado.1
Por sua vez, o Bitcoin pode ser descrito como:
Uma estrutura de dados ordenada composta por blocos de transação criptograficamente ligados por uma referência direta ao bloco anterior, servindo como livro-razão público no Bitcoin.2
Criptomoedas são ativos, tal qual o real, o dólar, e o euro, no entanto, são digitais, e não são emitidas por bancos, de modo que quem controla a oferta de criptomoedas no mercado é o próprio código da criptomoeda. Sendo o Bitcoin a mais popular dentre essas criptomoedas.3
Tanto o Bitcoin quanto o blockchain são, usualmente, utilizados para transações comuns, assim como as realizadas por meio de instituições bancárias como o TED e o PIX e por esse motivo não devem causar medo ou ojeriza a qualquer indivíduo. Em verdade a utilização do blockchain e das criptomoedas em geral pretende, tão somente, garantir maior privacidade as transações realizadas por determinado indivíduo.
Importante destacar que essa rede é descrita como sendo “a peer-to-peer eletronic cash system’’, ou seja, visa aproximar o máximo possível o bitcoin do dinheiro em espécie. Desta forma, garante a privacidade, a irreversibilidade (o que proporciona mais garantia aos empresários que operam esse sistema) e a desnecessidade de um intermediador.4
Todavia, mesmo com todas as proteções intrínsecas ao blockchain diversos agentes buscam proibir sua utilização, especialmente na hipótese em que é utilizada para transações com criptomoedas.
Estado não se apoderou do monopólio monetário com intuitos nobres, haja vista que tal apoderamento ocorreu em razão da alta lucratividade ao cobrar taxas pelo controle (cunhagem). Desta forma, com o surgimento da criptomoeda, há uma grande chance de proibição por parte dos governos, haja vista o risco da perda de soberania pela desestatização do dinheiro.5
Recentemente nas principais páginas da deep web especializadas em conteúdos sobre criptomoedas trouxeram à tona o caso da empresa Chainalysis em sua captação e cruzamento ilícito de dados pessoais para identificação de carteiras de criptomoedas.6 A empresa que afirma: “We create transparency for a global economy built on blockchains, enabling banks, business, and governments to have a common understanding of how people use cryptocurrency.”7 cruzou dados ilícitos coletados por meio do site “Walletexplorer.com” no qual usuários podem conferir transações realizadas com criptomoedas para cruzar os IPs com os das carteiras e assim criar um perfil dos utilizadores.
A medida, em tese, tem por objetivo o combate, juntamente a Estados, bancos e empresas, à transações ilícitas de criptomoedas por intermédio da blockchain se estabelece, em verdade, como uma frontal violação aos direitos de intimidade, privacidade, transparência e autodeterminação informativa tal como esculpidos no GDPR europeu, bem como na LGPD brasileira.
A empresa, por meio de sua atuação ilícita na coleta de dados de IP por meio do referido site consegue criar uma conexão entre IP e carteira digital, de modo que torna-se extremamente fácil descobrir a propriedade de determinada carteira de criptoativos, removendo, desse modo, a principal proteção do blockchain que é a de que por meios direitos é impossível se determinar a propriedade de determinada carteira.
Há de se destacar que a própria empresa afirma que apenas menos de 1% das transações com bitcoin são ilícitas, todavia tal constatação não impediu que a empresa violasse a intimidade de milhares de pessoas realizando a ligação entre carteiras e IPs.
Outro modelo de captação de dados e cruzamento para identificação de carteiras utilizado pela empresa se dá por meio da utilização dos nodes.
Nesse ponto cabe destacar que uma carteira de criptomoedas é apenas uma chave de criptografia privada, a qual se comunica com uma série de nodes para escrever informações na blockchain. A empresa criou uma série de nodes nos quais escreveu um código especial que verifica os pedidos de forma individualizada, Desse modo sempre que determinado IP realizar o pedido referente a determinada carteira a empresa criara um alerta e escreverá em seu banco de dados o referido IP e os dados públicos da referida carteira.
Destaca-se que tal técnica somente pode impactar pessoas que não possuem o full node em sua máquina, isto é, não possuem todo o histórico da blockchain, o qual, hoje, conta com aproximadamente 400 gigabytes.
Esses são somente os primeiros aspectos a respeito dessa violação, uma vez que, diante tal atentado à privacidade e intimidade as novas versões da blockchain, indubitavelmente, buscarão implementar medidas para combater tais ações e assim garantir maior proteção à intimidade, privacidade e autodeterminação informativa de usuários da blockchain.
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Clayton Douglas Pereira Guimarães
Glayder Daywerth Pereira Guimarães
Referências
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1. RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial esquematizado. 7.ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 514.
2. AGNER, Marco. Bitcoin para Programadores. Rio de Janeiro: ITS. 2019, p. 72. Disponível em: https://bit.ly/3ADalYR. Acesso em: 23. set. 2021.
3. GUIMARÃES, Clayton Douglas Pereira; GUIMARÃES, Glayder Daywerth Pereira. O desafio insuperável do direito sucessório frente a perda de carteiras de Bitcoin. Magis – Portal Jurídico. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3lYiNf6. Acesso em: 23. set. 2021.
4. BARBOSA, Caio César do Nascimento; VICENTE, Fabrícia Barbosa. Primeiras impressões sobre o uso fraudulento de criptomoedas sob a ótica da responsabilidade civil. Revista de Direito CAPP. v. 1, n. 1, p. 22 – 39, 2021Disponível em: https://bit.ly/2XKaGKK. Acesso em: 23. set. 2021.
5. MACIEL FILHO, Pedro Alberto Alves; BALBINO, João Victor Balbino. Uma breve análise socioeconômica da bitcoin. Magis – Portal Jurídico. 2021. Disponível em: https://bit.ly/39FxSN4. Acesso em: 23. set. 2021.
6. NELSON, Danny; HOCHSTEIN, Marc. Leaked Slides Show How Chainalysis Flags Crypto Suspects for Cops. Coindesk. 2021. Disponível em: https://bit.ly/39JWFzf. Acesso em: 23. set. 2021.
7. CHAINALYSIS. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3CLPdAb. Acesso em: 23. set. 2021.