De uma forma geral, os programas de Compliance buscam prevenir riscos e infrações que possam ser cometidas no âmbito empresarial, de forma a zelar pela conformidade de uma empresa em relação às leis e normas internas ou externas existentes.
Podemos considerar que o crescimento dos programas de Compliance nas empresas brasileiras está diretamente relacionado à ampliação da responsabilidade penal da pessoa jurídica, vistas as diversas sanções as quais as empresas estão suscetíveis em caso da ocorrência de atos ilegais.1
Dentre as muitas ferramentas do Compliance, temos as investigações corporativas, realizadas dentro e pelas próprias empresas. Essas investigações têm como objetivo principal a apuração e elucidação de atos que possam violar leis, políticas ou demais controles internos. Destaca-se que tais investigações possuem um caráter preventivo e não corretivo, uma vez que buscam identificar o ato ilícito e cessá-lo antes que o ato se torne público, o que transfere o poder da investigação para o poder público.
No entanto, é muito importante lembrar que esse tipo de investigação possui limitações estabelecidas por lei. Limitações essas que veremos a seguir.
Primeiramente, como todo e qualquer procedimento investigativo conduzido por entidades públicas, a investigação particular (como a realizada internamente por uma empresa) deve zelar pelos direitos fundamentais previstos pela Constituição Federal. A proteção aos direitos fundamentais durante todo o processo de investigação, além de verificarem legalidade a todo o procedimento, permite o aproveitamento das provas coletadas em posterior processo penal.
Conforme a teoria da fruta envenenada, a violação de direitos fundamentais durante procedimentos investigatórios impedem que o material probatório possa ser utilizado posteriormente no processo penal.
Outro pressuposto que deve ser obedecido nas investigações internas é o pressuposto do procedimento justo, nesse caso, cumprido quando informado ao colaborador investigado a finalidade do procedimento, bem como suas consequências e seus direitos.2 Essa elucidação sobre a finalidade do procedimento vem de práticas internacionais que objetivam permitir que o colaborador avalie o seu grau de envolvimento na investigação e reflita sobre quais serão as suas respostas.3
Um princípio que também deve ser observado durante os processos de investigações internas é o direito ao contraditório e à ampla defesa, previsto no artigo 5°, LV da Constituição Federal. Por isso, é de extrema importância que o procedimento investigatório siga um Código de Investigações Internas com todas as normas referentes ao procedimento de investigações internas e aos direitos dos investigados.
Além desses pressupostos, as investigações internas devem observar as demais normas pertinentes ao tema, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal,4 que determinou que as normas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm aplicação em qualquer relação jurídica, mesmo que privada.
Portanto, considerando todos os impactos que uma investigação corporativa pode causar na vida profissional ou pessoal de um colaborador, assim como nas investigações realizadas por agentes públicos, o procedimento investigativo particular deve fazer cumprir todos os direitos garantidos pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Além disso, considerando que as investigações em âmbito corporativo acontecem no âmbito de uma relação de trabalho (entre empregado e empregador), é sempre recomendável que sejam elaboradas normas e diretrizes para compor um Código de Investigações Internas, onde estarão previstos todos os procedimentos que irão reger todas as investigações.
Referências
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1. SOUZA, Artur de Brito Gueiros. Programas de Compliance e a atribuição de responsabilidade individual nos crimes empresariais. In: Revista Portuguesa de Ciência Criminal. Ano 25, ns. 1 a 4, Coimbra, jan-dez 2015
NIETO MARTÍN, Adán. Investigações Internas. Manual de cumprimento normativo e responsabilidade penal da pessoa jurídica. Florianópolis: Tirant lo Blanch, 2019, p. 297
AgRg no ARE 1.008.25, rel. min. Luiz Fux, DJe 19/4/2017
2. NIETO MARTÍN, Adán. Investigações Internas. Manual de cumprimento normativo e responsabilidade penal da pessoa jurídica. Florianópolis: Tirant lo Blanch, 2019, p. 297
3. NIETO MARTÍN, Adán. Investigações Internas. Manual de cumprimento normativo e responsabilidade penal da pessoa jurídica. Florianópolis: Tirant lo Blanch, 2019, p. 297
4. AgRg no ARE 1.008.25, rel. min. Luiz Fux, DJe 19/4/2017