Nas ações de guarda e convivência, tem se tornado comum a alegação de que a mãe não está apta a manter a guarda dos filhos por se dedicar também à sua vida profissional. Em casos extremos, chega-se a argumentar até mesmo abandono dos cuidados maternos, como visto recentemente no caso de uma atleta olímpica, Flávia Maria de Lima, que viaja frequentemente para competições e treinos.
No caso da atleta, que tramita em segredo de justiça, ela alega que o pai pede a manutenção da guarda compartilhada da filha, com 6 anos, mas pede a alteração do lar referência, que hoje é o materno, para seja o lar paterno; e assim não seria mais necessário que a filha ficasse com a família materna quando a mãe viaja.
A atleta tem razão ao afirmar que as mulheres enfrentam uma pressão desproporcional no exercício da parentalidade, algo raramente exigido dos homens. A disputa reflete um problema recorrente enfrentado por mulheres que buscam conciliar vida profissional e familiar, e que muitas vezes são injustamente acusadas de negligência parental, enquanto os mesmos padrões não são aplicados aos homens
No entanto, a legislação brasileira não impõe mais obrigações e responsabilidades sobre as mães no cuidado com os filhos. Muito menos exige que mulheres que optam pela maternidade abandonem suas carreiras e se dediquem exclusivamente ao papel de mães.
A Constituição Federal de 1988 consagra, entre seus princípios fundamentais, a igualdade de gênero, igualando os direitos e obrigações entre homens e mulheres, como vemos no inciso I do Artigo 5º. Esse princípio afeta diretamente o exercício do poder familiar, promovendo a igualdade de direitos e deveres no âmbito familiar; conforme se verifica da disposição § 5º do Artigo 226, da Carta Magna. Tanto o pai quanto a mãe devem compartilhar equitativamente as responsabilidades e os cuidados com os filhos, independentemente da configuração familiar escolhida.
A evolução do conceito de família, também trazida pela Constituição de 1988, promoveu uma mudança significativa na forma de enxergar as responsabilidades parentais. Com o avanço da independência feminina e a ocupação de diversos espaços profissionais pelas mulheres, muitas delas assumiram o papel de principais responsáveis pelo sustento financeiro de seus lares. Isso, contudo, não as exime de suas responsabilidades parentais. Pelo contrário, essas mulheres enfrentam o desafio diário de acumular funções, dividindo-se entre a vida profissional, pessoal e a maternidade.
É necessário desconstruir os estereótipos de gênero que, apesar da igualdade constitucional, ainda persistem. Historicamente, atribuiu-se à mulher o papel de principal cuidadora e ao homem o papel de provedor. Essa divisão de papéis não tem mais lugar no direito contemporâneo. A sociedade e o sistema jurídico devem promover um modelo de parentalidade mais equilibrado, com responsabilidades e direitos partilhados de maneira igualitária.
Na prática, a guarda compartilhada é um dos principais mecanismos para concretizar a igualdade parental. Ela promove a divisão equilibrada das responsabilidades dos pais e reforça a necessidade de ambos estarem igualmente envolvidos na educação, no sustento e na formação dos filhos, como ensina Rodrigo da Cunha Pereira e conforme dispõe o artigo 1.634 do Código Civil.
É essencial, contudo, que a igualdade parental seja sempre aplicada em consonância com o princípio do melhor interesse da criança, um conceito central no Direito de Família e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Não resta dúvida de que o sistema jurídico brasileiro privilegia a igualdade parental, garantindo a participação ativa de ambos os pais. Isso assegura um ambiente de desenvolvimento mais saudável e equilibrado para os filhos, que se beneficiam da presença e da participação de ambos os genitores. A igualdade parental não é apenas uma questão de justiça entre os pais, mas também um imperativo para o bem-estar das crianças. Assim, podemos dizer que a parceria entre homens e mulheres na criação dos filhos é uma parceria de ouro!
Referências
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Assessoria de Comunicação do IBDFAM. Atleta brasileira é acusada de abandono parental por viajar para competir. site.
Redação Folha. Atleta chora e diz que ex-marido usa Olimpíadas para tirar guarda da filha. site.
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Família: uma abordagem constitucional. 3. ed. Belo Horizonte: IBDFAM, 2021.
Assessoria de Comunicação do IBDFAM. Atleta brasileira é acusada de abandono parental por viajar para competir. site.
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Família: uma abordagem constitucional. 3. ed. Belo Horizonte: IBDFAM, 2021.