Por que falarmos Pessoas Com Deficiência? A inclusão começa com o respeito à terminologia adequada

Por que falarmos Pessoas Com Deficiência? A inclusão começa com o respeito à terminologia adequada

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Para dar início à nossa jornada coletiva rumo à inclusão e ao pertencimento efetivos, é fundamental começarmos pela reflexão sobre a terminologia utilizada, especialmente ao nos referirmos a pessoas com deficiência. As escolhas linguísticas que fazemos refletem nosso respeito ou discriminação, inclusão ou exclusão. Esta consciência linguística acompanha a evolução dos direitos e o reconhecimento da autonomia das pessoas com deficiência, sendo essencial para alcançarmos a inclusão que almejamos.

Em um mundo em constante transformação e globalizado, é imprescindível lembrar que as palavras moldam realidades. A inclusão se torna, assim, um valor fundamental, exigindo uma profunda reflexão sobre como nomeamos e percebemos as pessoas ao nosso redor, particularmente aquelas que, em tempos menos esclarecidos, foram categorizadas de forma limitante.

A importância da terminologia e seu uso adequado demandam uma análise histórica, reconhecendo que a trajetória das pessoas com deficiência pode ser dividida em quatro fases marcantes: exclusão (em que as pessoas com deficiência eram executadas e eliminadas da sociedade), segregação (separando em grupos de pessoas com deficiência e pessoas sem deficiência, sem qualquer interação entre si, com rigor de superioridade das pessoas sem deficiência sob as pessoas com deficiência, sendo as últimas, merecedoras apenas de piedade e assistencialismos), integração (que reflete na inserção do grupo de pessoas com deficiência, dentro do grupo de pessoas sem deficiência, mas ainda com pouquíssima interação entre eles) e, finalmente, inclusão. Essa última, entendida como a convivência em igualdade de condições, direitos e deveres entre pessoas com e sem deficiência, representa o único caminho para o desenvolvimento social.

A evolução da terminologia relativa à pessoa com deficiência é significativa. Antes do século XX, eram vistos como “inválidos”, colocando a pessoa em um local de “inutilidade”, alguém sem qualquer valor social ou profissional. Nos anos 1960, o termo mudou para “incapacitados”, a partir desse momento, tem-se a ideia de que a pessoa pode até ter um valor, uma capacidade, mas de forma residual; lado outro, a deficiência “adquirida” eliminava ou reduzia a capacidade do indivíduo, em todos os seus aspectos.

De 1960 a 1980, nas referidas décadas, três foram as expressões para se referir a este grupo de pessoas, “os defeituosos” correspondia às pessoas com deficiência física; “os deficientes”, por sua vez, enquadravam pessoas com deficiência física, mental, auditivas, visual ou múltipla, pessoas que possuíam maiores limitações para a execução de tarefas de vidas diárias; por fim, “os excepcionais”, designando exclusivamente pessoas com deficiência mental; além das terminologias que supunham “falta” ou “incapacidade”, é neste momento que também surgem os primeiros movimentos para o reconhecimento das “pessoas superdotadas”, atualmente, sendo mais adequado dizer, “pessoas com altas habilidades”, e assim, por ser considerado, algo “além”, uma “capacidade extra”, a terminologia, deveria representar essa “superdotação”, e, portanto, sendo reconhecidos enquanto “excepcionais”.

A década de 1980 introduziu “pessoas deficientes”, sendo a primeira vez em que aparece o termo pessoas antes do adjetivo, é a partir desta década que se passa a atribuir valor à pessoa, assim, igualando-os em direitos e dignidade. Entre 1988 a 1993, passou-se a usar “pessoas portadores de deficiência”, neste ínterim, “portar uma deficiência” veio com o objetivo de ser reconhecido enquanto “detalhe” de uma pessoa; de forma concomitante, também, muito se utilizou do eufemismo “pessoas com necessidades especiais”, com o objetivo de amenizar a contundência da palavra deficiência.

Somente no início dos anos 2000, consolidou-se o termo “Pessoa com Deficiência, reconhecido internacionalmente pela Convenção Internacional para a Proteção e Promoção dos Direitos e Dignidade das Pessoas com Deficiência em 2004; a partir desta definição entende-se que a pessoa não é “portadora de deficiência”, por não poder “deixar de lado” a deficiência, e, portanto, reconhecendo que portamos: bolsas, acessórios, mas a “deficiência” é parte da pessoa, mas não sua totalidade, e, portanto, reconhecendo-se como melhor terminologia “pessoa com deficiência. Para além da referida explicação, também se tem as seguintes motivações para o reconhecimento do termo, a primeira é o empoderamento da pessoa com deficiência, vez que o termo foi cunhado pelas próprias pessoas com deficiência, a partir do reconhecimento de “nada sobre nós, sem nós”, e o da responsabilidade em contribuir para a efetivação da inclusão na sociedade, com o objetivo de que essa reconheça o direito de todos, englobando pessoas com deficiência e pessoas sem deficiência.

Esse percurso terminológico ilustra uma profunda mudança na percepção social, mostrando como terminologias inadequadas podem reforçar preconceitos e estereótipos. Atualizar nossa linguagem significa rejeitar o capacitismo (preconceito contra a pessoa com deficiência, em razão da sua deficiência) e reconhecer a pessoa com deficiência como um sujeito de direitos e deveres, e não definido apenas por sua condição.

A transformação na terminologia não visa ocultar a deficiência, mas sim promover a visibilidade e o reconhecimento da mesma como parte da diversidade humana. Esse movimento opõe-se ao uso de neologismos que, apesar de bem-intencionados, podem diluir as realidades vivenciadas por pessoas com deficiência, afastando-se das verdadeiras necessidades e lutas desses indivíduos.

Portanto, nosso objetivo é claro: reconhecer pessoas com deficiência como indivíduos plenos de direitos, dignidade e contribuições valiosas para a sociedade. Isso requer uma mudança em nossa linguagem e, por extensão, em nossa percepção e ações. Ao escolher palavras que refletem inclusão, respeito e valorização da diversidade, contribuímos para a construção de um mundo com maiores chances de pertencimento para todos.

Por fim, é sempre oportuno lembrar, que ao conhecer uma pessoa com deficiência, a bem da verdade, é sempre melhor tratarmos a pessoa pelo seu nome, dirigindo-se diretamente a ela, sem referir ou se dirigir aos seus acompanhantes.

Concluímos assim, que a linguagem, aliada ao direito, pois a terminologia adequada possui força legal, emerge como uma poderosa ferramenta de transformação. Nossas escolhas linguísticas moldam o mundo em que vivemos. Com isso, pela inclusão, pelo respeito às diferenças e pela celebração da diversidade humana, somos convidados a ver além do que supostamente entendemos ser limitações. Esse é o legado que o movimento de inclusão das pessoas com deficiência deseja deixar: um convite à inclusão, ao pertencimento e à evolução contínua. Vamos juntos nessa direção?

 

Referências

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BRASIL. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Glossário da educação especial: Censo Escolar 2022. Brasília, DF: Inep, 2022.

SASSAKI, Romeu Kazumi. Terminologia sobre deficiência na era da inclusão. In: VIVARTA, Veet (coord.). Mídia e deficiência. Brasília: Andi/Fundação Banco do Brasil, 2003, p. 160-165.

SILVA, Maria Isabel da. Por que a terminologia “pessoas com deficiência”? Universidade Federal Fluminense. Núcleo de Acessibilidade e Inclusão Sensibiliza – UFF, 2009.

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