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Princípio da não discriminação: um vislumbre de dignidade

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Todos sabemos que trabalhadores e trabalhadoras não podem sofrer discriminação subjetiva, independentemente do tipo, objeto, pessoas envolvidas ou motivação (idade, cor, classe social, gênero, opinião, afiliação política, ideológica ou identitária, credo religioso, aparência, estado civil, traços fenotípicos, identidade afetivosocial, peso, deficiência, região, origem étnica ou qualquer outro parâmetro).

A vedação alcança todos os tipos contratuais e práticas atentatórias contra a dignidade da pessoa humana, independentemente da vinculação a esta ou aquela rotina trabalhista, quais sejam, de admissão, permanência e de desligamento.

O respaldo legal, para além das normas infraconstitucionais específicas e do princípio da dignidade da pessoa humana, é o princípio também constitucional da não discriminação.

O princípio da não discriminação guarda relação direta com o aquele da isonomia, uma vez que também serve ao propósito de promover a equidade, o respeito às diferenças e o reconhecimento de direitos.

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXX – proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;

É desejável que o princípio repercuta efetividade no mundo do trabalho: no cotidiano dos relacionamentos (tanto verticais como horizontais); nas práticas de gestão;  no desenho e realização das rotinas de gestão de pessoas (admissionais, associadas à manutenção do vínculo e aquelas demissionais); enfim, nas relações com a sociedade.

O art. 3º. da Constituição Federal afirma o compromisso republicano com a promoção da igualdade fática.

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II – garantir o desenvolvimento nacional;

III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Em nosso ordenamento jurídico, o princípio da não discriminação é amplamente reconhecido (direito constitucional dos oprimidos).

Em sede infraconstitucional, no campo laboral, o art. 3º. da CLT, em seu parágrafo único, anuncia que “Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual.”

No art. 461, a norma trabalhista veda, por exemplo, a desigualdade salarial com base em razões e critérios discriminatórios. Já no art. 442-A, do mesmo diploma, a norma afasta a discriminação com base na experiência prévia do(a) candidato(a).

Art. 442-A. Para fins de contratação, o empregador não exigirá do candidato a emprego comprovação de experiência prévia por tempo superior a 6 (seis) meses no mesmo tipo de atividade. (Incluído pela Lei nº 11.644, de 2008).

A lei n. 9.029/ 1995, considerando a redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015,  proibiu a exigência do atestado gravídico e de esterilização, bem outras práticas discriminatórias para fins admissionais ou de permanência da relação jurídica de trabalho.

A lei n. 14.457/2022 instituiu o Programa Emprega + Mulheres, voltado para a inserção e manutenção de mulheres no mercado de trabalho, por meio de ações inclusivas:  apoio à parentalidade na primeira infância pela flexibilização do regime de trabalho; a qualificação de mulheres em áreas estratégicas, com vistas à sua ascensão profissional; o suporte ao retorno ao trabalho das mulheres, após o término da licença-maternidade; a adoção de práticas que promovam a empregabilidade de mulheres; a prevenção e combate ao assédio sexual bem como a outras formas de violência no ambiente de trabalho; e o fomento ao microcrédito para mulheres.

Não obstante tenhamos uma farta fundamentação legal animada pelo princípio da não discriminação, certamente não esgotada nesse texto, a realidade ainda se apresenta iníqua, nos fazendo concluir que não é suficiente NÃO DISCRIMINAR. Consagrando o mandamento constitucional, é necessário INCLUIR:

– pelo empreendimento de políticas e  ações afirmativas com vistas a promover a inclusão social (de modo concreto);

– pela adoção de medidas para a evitação de situações de vulneração e  violação de direitos;

– pela implantação de protocolos procedimentais para direcionamento de intervenções gerenciais em situações de iniquidade;

– pela planificação justa de cargos e salários  e a plena conformidade legal.

As ações afirmativas correspondem a medidas e intervenções realizadas com o propósito de promover a justiça social pela equidade, pilar do Estado democrático de direito.

Quando aplicadas no meio ambiente laboral, essas iniciativas tendem a melhorar sobremaneira a qualidade das relações, tornando esses ambientes salubres, diversos, inclusivos e democráticos.

Essas medidas cumprem objetivos sociais importantes:

– incluir grupos discriminados, marginalizados, desfavorecidos, excluídos e silenciados;

– promover a diversidade no ambiente organizacional com efetiva ocupação dos espaços de poder (decisórios);

– desconstruir a segregação social que reproduz diferentes formas de opressão e estigmas sociais (o preconceito, os estereótipos e as discriminações);

–  garantir o respeito aos direitos de trabalhadores e trabalhadoras;

– corrigir distorções e injustiças que atravessam gerações (promessa constitucional).

O oportunização e a manutenção de ambientes de trabalho dignos transformam a natureza do vínculo social dos trabalhadores (cuja coesão é orientada, muitas vezes, por demandas, dores, reivindicações e estigmas), em uma adesão genuína constituída a partir das pertenças identitárias, afetos e convicções ideológicas.

A sociedade brasileira acumula uma  dívida social histórica. O ponto de partida da compreensão da relevância das políticas e ações afirmativas é o reconhecimento das desigualdades que tornam demasiadamente acidentadas, a trajetória acadêmica e profissional dos grupos minorizados no mundo trabalho (marcadas por obstáculos e interdições).

A discriminação machuca, traumatiza, adoece, podendo produzir danos existenciais irreversíveis. A ampla realização do princípio da não discriminação é um vislumbre de dignidade.

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