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Quem é o imigrante?

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Atualmente, é notória a presença de imigrantes por diversas regiões do mundo. Especialmente, os meios de comunicação nos enfatizam, inúmeras vezes, tal fenômeno migratório. Então, poderia nos parecer óbvia a resposta sobre quem é o imigrante.

Todavia, é uma temática complexa e reclama cuidadosa análise teórica. Inicialmente, observemos as percepções do professor Abdelmalek Sayad:

Um imigrante é essencialmente uma força de trabalho, e uma força de trabalho provisória, temporária, em trânsito. Em virtude desse princípio, um trabalhador imigrante (sendo que trabalhador e imigrante são, neste caso, quase um pleonasmo), mesmo se nasce para a vida (e para a imigração), mesmo se é chamado a trabalhar (como imigrante) durante toda a sua vida no país, mesmo se está destinado a morrer (na imigração), como imigrante, continua sendo um trabalhador definido e tratado como provisório, ou seja, revogável a qualquer momento. A estadia autorizada ao imigrante está inteiramente sujeita ao trabalho, única razão de ser que lhe é reconhecida: ser como imigrante, primeiro, mas também como homem – sua qualidade de homem estando subordinada a sua condição de imigrante. Foi o trabalho que fez “nascer’ o imigrante, que o fez existir; é ele, quando termina, que faz “morrer” o imigrante, que decreta sua negação ou que o empurra para o não-ser.[…] Ser imigrante e desempregado é um paradoxo. A dificuldade está, aqui, em conciliar objetos inconciliáveis: desemprego e imigrante ou, o que dá no mesmo, o não-trabalho como o que só se concebe e só existe pelo trabalho. (SAYAD, 1998, p. 54-55)

É evidente a correlação direta que Sayad apresenta entre ser imigrante e trabalhador. São temáticas fortemente entrincheiradas. Ser imigrante traz consigo uma carga de preocupações bastante acentuada.

Por outro lado, devemos pensar neste imigrante como um ser humano, e não apenas como uma máquina laboral. Ou seja, ele terá diversas necessidades a serem preenchidas, sem falar das suas memórias gustativas, emocionais e pátrias. Neste mesmo sentido, Sayad preconiza:

O “ideal” teria sido que, assim definido, o imigrante fosse pura máquina, um sistema integrado de alavancas, mas, neste caso como em qualquer outro, “uma vez que o homem não é um puro espírito” – sabemos disso há muito tempo – e uma vez que o imigrante não é puramente mecânico, é forçoso conceder-lhe um mínimo. Assim, como trabalhador, é preciso que seja alojado, mas então o pior dos alojamentos (que ele consegue sozinho) é amplamente suficiente; como doente, é preciso que seja tratado (isso por ele mesmo, e talvez muito mais para a segurança dos “outros”), mas que seja da forma mais rápida e mais econômica, sem tomar o tempo e o cuidado que uma situação particular requer, principalmente no caso de doenças mentais (que, em sua maioria, são de origem sociológica ou menos comportam uma importante dimensão sociológica); o mais das vezes casado e pai de família, não seria possível proibi-lo de trazer para junto de si, dentro de certos limites e sob certas condições, sua mulher e seus filhos – não se poderia nem mesmo impedi-lo indefinidamente de fazê-lo, principalmente quando manifesta tal desejo (SAYAD, 1998, p. 58-59).

Ao analisarmos os ensinamentos de Sayad, é relevante destacarmos que o seu olhar a respeito do imigrante tem um aspecto refinado, sob dois prismas. Primeiro, por se tratar de um pesquisador científico. E, segundo, devido ele próprio ter sido um imigrante. Nasceu em 24 de novembro de 1933, em Beni Djellil, Argélia, e, posteriormente, se mudou para França em 1963, depois que a Argélia se tornou independente (1962).

Sayad começou as suas atividades na França com contratos de curto prazo no Centro de Sociologia Europeia da Escola de Estudos Avançados em Ciências Sociais. Na data de 1977, conseguiu uma contratação no Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS), na função de diretor de pesquisa em sociologia. Ele se tornou um especialista da comunidade norte-africana, na França. Os seus amigos tinham o costume de chama-lo de “Sócrates argelino”. Lamentavelmente, veio a falecer em 13 de março de 1998.

Portanto, da mesma forma que o professor Sayad teve uma leitura humanizada sobre o imigrante, por exemplo, escreveu diversos artigos referentes ao processo de migração e que este acarreta uma série de sofrimentos, nós também deveríamos nutrir um enfoque mais humanitário, pois ser imigrante é um dos maiores desafios de ordem econômica, jurídica, social, emocional, cultural, linguística, gastronômica, etc. Deste modo, o imigrante é um ser humano, em contínua busca para adaptar-se ao diferente.

 

Referências

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SAYAD, A. A Imigração ou os Paradoxos da Alteridade. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1998.

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