Em 2023, um motorista autônomo de Palmas, no Tocantins viveu uma situação que tem sido muito frequente no País, o depósito realizado por erro da instituição financeira. Nesse caso especificamente, foram depositados na conta 131 milhões de reais. Muitos podem achar que o motorista tirou a sorte grande, uma vez que ele não teve culpa e, portanto, poderia ficar com a quantia. Nesse caso especificamente, o motorista devolveu o dinheiro mas ajuizou uma ação contra a instituição financeira, com base no instituto da descoberta do código civil, exigindo uma quantia de recompensa de 10% sobre o valor do depósito, ou seja 13 milhões de reais. Essa quantia é denominada de achádego. Seria uma recompensa para a pessoa que encontra coisa alheia móvel.
O que diz a legislação brasileira a respeito dessa situação? Em primeiro lugar, a utilização do instituto da descoberta nessa hipótese não nos parece adequada. A descoberta, prevista no Código Civil, aplica-se às situações em que alguém acha coisa alheia perdida e tem o dever de encontrar seu legítimo proprietário ou poussuidor. O exemplo seria se a pessoa encontrasse uma carteira na rua, uma máquina fotográfica na praia, ou mesmo um computador na mesa do aeroporto. A legislação brasileira determina que o descobridor deve usar todos os meios para encontrar o verdadeiro possuidor ou proprietário da coisa achada. No caso de Palmas, o que ocorreu foi um depósito efetuado indevidamente pelo banco, ele não encontrou coisa perdida alheia.
O art. 876 do Código Civil dispõe que todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir o recebido. Além disso, o art. 884 do mesmo diploma legal afirma que aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários. Então, o cliente não pode ficar com o dinheiro depositado indevidamente em sua conta. Não há previsão legal para isso.
Ademais, o art. 169 do Código Penal brasileiro prevê como crime um dos tipos de apropriação indébita, a apropriação de coisa havida por erro, caso fortuito ou força da natureza, com pena de detenção, de um mês a um ano, ou multa. Ou seja, é crime tipificado na legislação brasileira.
Se houver um depósito que o cliente não reconhece em sua conta, ele deve imediatamente entrar em contato com a instituição financeira para verificar o ocorrido e solucionar o problema. Nos casos de quantia de valores menores e o consumidor acabou gastando a quantia de boa-fé, mesmo assim ele deve devolver a quantia à instituição. Como a hipótese decorre de erro da instituição, ela deve fornecer meios adequados para que o consumidor restitua o valor sem que haja prejuízos a ele. Em situações que o depósito enganado trouxer algum prejuízo moral ou material ao consumidor, desde que devidamente comprovado ele pode sim pedir alguma reparação para isso. Mas tudo deve ser devidamente comprovado na justiça. Na hipótese desse motorista de Palmas, é possível a aplicação da litigância de má-fé que gera o dever de pagamento de multa (de 1% a 10% do valor da causa corrigido) e indenização dos eventuais prejuízos sofridos pela parte contrária, inclusive honorários advocatícios e despesas efetuadas.
Portanto, respondendo a pergunta do título dessa coluna, você não se torna milionário se uma instituição financeira depositar milhões de reais na sua conta, além de ter que devolver a quantia, você só terá direito a alguma indenização se houver comprovação de dano no caso concreto.