No dia 6 de maio, a advogada Rita Galvão, presidenta da Comissão da Verdade da Escravidão Negra da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), denunciou ter sido impedida de entrar no Juizado Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais por estar usando um turbante. Ao chegar para participar de uma audiência com uma cliente, foi atravessada pela força hostil do racismo, em sua forma institucional.
Essa cena revela como as instituições estão embebidas pelo racismo, concebido como um valor de uma moralidade restritiva que organiza, de forma bélica, as imagens de mundo e os modos pelos quais sujeitos negros serão tratados. Trata-se de uma operação de poder que não apenas rejeita as insígnias que apontam para a cultura negra, mas também sua resistência — que, de modos plurais, conecta estética e desobediência política. A discussão em pauta vai além da vestimenta, orbitando em torno da construção de muros e abismos entre identidades que podem circular livremente e outras que, numa relação enviesada pelos valores hostis de normas excludentes — como o racismo, por exemplo — devem ser sistematicamente alijadas dos espaços políticos. Falar de identidade significa compreender como sujeitos se formam na trama das interações, de forma localizada, histórica e relacional. Desse modo, podemos nos perguntar: como é possível se tornar sujeito de forma afirmativa, se o racismo e os demais sistemas discriminatórios são sofisticados o suficiente para destruir a reciprocidade?
Se o turbante denota a afirmação da identidade negra, bem como de sua cultura insubordinada, ao constranger uma mulher negra por seu uso, observamos que as instituições não apenas desprezam a valorização dessa identidade, mas também se organizam a partir de uma compreensão racista e sexista, produtora do não lugar projetado política e socialmente para mulheres negras.
Não há neutralidade nas instituições, uma vez que elas pertencem às tramas sociais e se ancoram em valores — sobretudo morais — que regulamentam as interações, moldam os espaços sociais e, de formas multidimensionais, hierarquizam grupos, considerando paradigmas de inimizade política como raça, gênero, sexualidade e território, por exemplo.
O episódio de racismo sofrido pela advogada Rita Galvão evidencia como esse sistema de poder alicerça os espaços institucionais, ao mesmo tempo em que transita livremente por eles, regulamentando presença e ausência e projetando, em nome do desprezo à diferença, as margens. Todavia, a resistência da dra. Rita Galvão — e de todas as pessoas que não se curvam às forças taxonômicas do racismo, disfarçadas de códigos e regras de vestuário — implode as engrenagens do racismo institucional, intencionalmente programadas para violentar.