A compra do Twitter por Elon Musk, o homem mais rico do mundo, traz à tona a discussão sobre Liberdade de Expressão e moderação nas redes sociais.
O direito à liberdade de expressão representa a possibilidade jurídica, dentro de determinado ordenamento jurídico, de falar, escrever e exprimir ideias.1 Insta frisar que o direito à liberdade de expressão encontra-se intimamente interligado a própria noção de Estado Democrático de Direito, pois o pluralismo – coexistência de ideias diversas – decorrente do exercício da liberdade de expressão, é fundamento do Estado Democrático de Direito, conforme se extrai do artigo 1º, inciso V, da Constituição Federal.2
Todavia, o direito à liberdade de expressão não é irrestrito, encontrando limites na hipótese da colisão com outros direitos fundamentais e com outros valores constitucionalmente estabelecidos. É daí que exsurge a dificultosa tarefa de sopesar o direito à liberdade de expressão e a disseminação indevida das fake news,3 e discurso de ódio.
Fake News são “representações de informações falsas, normalmente sensacionalistas, disseminadas sob o disfarce de reportagens de notícias”.4 E são um fenômeno recorrente na atualidade, e que se agrava diante do fenômeno da pós verdade, que “relaciona-se à circunstância na qual os fatos objetivos têm menor influência em moldar a opinião pública do que aqueles que apelam a emoções e crenças pessoais.”.5
Diante de situações como a disseminação de Fake News e da propagação de discurso de ódio tem ocorrido uma moderação nas redes sociais, todavia o tema é polêmico e não apresenta consenso.
Há quem defenda que a tarefa de dizer quais posts ou contas ficam e quais são bloqueados ou banidos cabe às plataformas — já que são empresas privadas.
Outros entendem que é preciso haver atuação da Justiça ou de autoridades governamentais junto dessas companhias.
E tem os que acreditam que derrubar posts ou perfis colocaria em risco a liberdade de expressão. Musk parece estar mais perto dessa última turma. “Na dúvida, deixe o discurso, deixe que exista”, disse em recente entrevista para o canal de palestras TED.6
Deixar a cargo exclusivamente do judiciário o combate a Fake News e da propagação de discurso de ódio nas redes sociais é contrassenso, os usuários continuariam a disseminar Fake News e propagar discurso de ódio, pois dificilmente seriam submetidos a processos judiciais, em suas esferas privadas. Portanto, é necessária uma atuação das empresas privadas prestadoras do serviço de redes sociais a fim de garantir o bem-estar na rede, cuidando o judiciário para que não haja abuso por parte dessas empresas na moderação de conteúdo.
Para Musk um possível abuso que pode estar ocorrendo em relação a moderação de conteúdo diz respeito ao banimento de usuários das redes sociais.
Na mesma entrevista ao TED Talks, Musk chegou a dizer que o Twitter teria de respeitar as leis dos países sobre a liberdade de expressão. Mas reconheceu que resiste ao banimento de usuários, como a plataforma fez com o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump.
“Acho que queremos ser bem relutantes em deletar as coisas e muito cautelosos com banimentos permanentes. Suspensões temporárias, acho, são melhores”, afirmou Musk.7
Em se considerando que há o entendimento jurisprudencial que nas redes sociais há uma relação de consumo, e que o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 39, inciso IX, considera prática abusiva a conduta do fornecedor que se recusa a vender bens ou prestar serviços ao consumidor que se disponha a adquiri-lo mediante pronto pagamento – o banimento pode configurar abuso de direito, na medida que corresponde a uma recusa a prestação de serviço a determinada pessoa.
Idealmente as redes sociais deveriam aplicar suspensão por tempo determinado, transparecendo quais condutas resultam em suspensão e por qual tempo, em consagração ao princípio da transparência expresso no Código de Defesa do Consumidor.
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Clayton Douglas Pereira Guimarães
Glayder Daywerth Pereira Guimarães
Referências
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1. GUIMARÃES, Clayton Douglas Pereira; SILVA, Michael César. Repercussões do exercício da liberdade de expressão e da disseminação de fake news no contexto da sociedade da informação. In: EHRHARDT JÚNIOR, Marcos; LOBO, Fabíola Albuquerque; ANDRADE, Gustavo (coords.). Liberdade de expressão e relações privadas. Belo Horizonte: Fórum, 2021, p. 201-216.
2. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Disponível em: https://bit.ly/3Mrgb58. Acesso em: 02 dez. 2020.
3. GUIMARÃES, Clayton Douglas Pereira; SILVA, Michael César. Repercussões do exercício da liberdade de expressão e da disseminação de fake news no contexto da sociedade da informação. In: EHRHARDT JÚNIOR, Marcos; LOBO, Fabíola Albuquerque; ANDRADE, Gustavo (coords.). Liberdade de expressão e relações privadas. Belo Horizonte: Fórum, 2021, p. 201-216.
4. COLLINS, Dictionary. Word of the Year 2017. 2017. Disponível em: https://bit.ly/38u19N6. Acesso em: 02 dez. 2020.
5. OXFORD, Dictionary. Word of the Year 2016. 2016. Disponível em: https://bit.ly/3klIK7U. Acesso em: 02 dez. 2020
6. SOUZA, Vivian; ALCANTARA, Tiago; PATRIARCA, Paola; OLIVEIRA, Luciana de. O que pode mudar no Twitter com a compra por Elon Musk. G1. 2022. Disponível em: http://glo.bo/38uvJpP. Acesso em 26 abr. 2022.
7. SOUZA, Vivian; ALCANTARA, Tiago; PATRIARCA, Paola; OLIVEIRA, Luciana de. O que pode mudar no Twitter com a compra por Elon Musk. G1. 2022. Disponível em: http://glo.bo/39fT6E5. Acesso em 26 abr. 2022.