O que é inteligência artificial generativa e como ela pode mudar o mundo que conhecemos

O que é inteligência artificial generativa e como ela pode mudar o mundo que conhecemos

Cérebro Digital em fundo azul, representando a coluna direito 4.0: fronteiras digitais do portal jurídico magis

Grande parte das pessoas comuns nunca ouviram falar sobre Generative AI ou Inteligência Artificial Generativa, algo esperado uma vez que se trata de uma tecnologia ainda em desenvolvimento no vasto universo das Inteligências Artificiais (IAs). Todavia, ainda que a referida tecnologia se encontre em fases iniciais já promoveu inúmeros debates, controvérsias e se apresenta como um modelo disruptivo para inúmeras indústrias.

AFINAL, O QUE É INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL GENERATIVA?

Generative AI ou Inteligência Artificial Generativa refere-se a 1 um campo da ciência computacional que estuda o desenvolvimento de inteligências Artificiais completamente automatizadas, distintamente do modelo científico clássico da Inteligência Artificial no qual a compreensão e a construção da Inteligência é realizada pelos humanos. Isto é, no modelo clássico de Inteligência Artificial os humanos desenvolvem a inteligência do algoritmo em sua completude, de modo similar ao funcionamento dos neurônios humanos, distintamente, na Inteligência Artificial Generativa são desenvolvidos métodos de aprendizado dirigidos por humanos, mas realizados em sua inteireza pelo próprio algoritmo.1

As Generative AI permitem que soluções mais simples e céleres sejam encontradas pelo próprio algoritmo, não sendo necessário que humanos criem todos os detalhes de funcionamento em relação aos inputs e outputs do algoritmo.

Em resumo, as IA generativas são capazes de criar novos dados com base no que já aprenderam, de modo a ampliar de modo significativo sua capacidade. Exemplificativamente pode-se pensar na criação de uma Inteligência Artificial Generativa com o objetivo de se distinguirem objetos de uma casa, seria necessário inserir determinados dados no algoritmo e alimentá-lo com uma base dados de alguns objetos, para que possa por um processo de generalização e distinção entender em parâmetros computacionais o que é cada objeto apresentado a ela. Uma inteligência Artificial clássica pararia nesse ponto, mas as IA generativas vão além, sendo capazes de catalogar, por si só, novos objetos e os diferenciar e catalogar de modo distinto dos dados inseridos inicialmente no algoritmo da IA.

Nesse exemplo, caso o input fosse de uma luminária, um sofá, uma mesa de jantar e uma geladeira, a Inteligência Artificial Generativa poderia catalogar cada um desses objetos e, ainda, os distinguir e assimilar o que são fogões, cadeiras, espelhos, televisões, dentre outros objetos que compõem uma casa. Essa capacidade de criar novos dados abre um novo oceano de possibilidades para as Inteligências Artificiais e deixam-nas significamente mais poderosas.

O QUE PODE SER FEITO COM A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL GENERATIVA?

Os sistemas baseados em Inteligência Artificial Generativa já são utilizados de múltiplas formas, a despeito de sua recentíssima implementação e desenvolvimento. Desse modo, inúmeras são as possibilidades advindas da utilização da Inteligência Artificial Generativa, de modo que essa se estabelece como uma tecnologia altamente disruptiva com o potencial de modificar de modo significativo e determinante a sociedade contemporânea.

Pode-se afirmar que a Inteligência Artificial Generativa é um algoritmo capaz de aprender sem qualquer supervisão humana por meio de textos, áudios, imagens, vídeos e dados em geral e por meio dessa base de dados criar novos conteúdos em diversos formatos. Ferramentas como GPT-3, Imagen e DALL-E-2 já apresentam aos utilizadores essas funções e prometem desenvolver e apurar essa tecnologia ainda mais com updates dessas ferramentas.2 Esses aplicativos demonstram-se imensamente populares na Internet. Exemplificativamente, o programa DALL-E-2 conta com mais de 1,5 (um virgula cinco) milhões de usuários e gera mais de 2 (dois) milhões de imagens todos os dias.3

A Inteligência Artificial Generativa é atualmente empregada na criação de imagens, vídeos, vídeos 3D, textos, áudios, dentre diversas outras formas de mídias, podendo, ainda, ser empregadas na criação de novos produtos e mesmo na reformulação de produtos já existentes.

A PROBLEMÁTICA DO “FAIR USE” RELATIVAMENTE À INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL GENERATIVA

Toda tecnologia disruptiva faz com que emerjam uma série de problemáticas e discussões na sociedade e no direito, e a Inteligência Artificial Generativa não é uma exceção a essa regra posto que uma série de debates foram suscitados desde sua gênese, especialmente em relação ao “fair use” e ao “copyright”.

O fair use refere-se a um conceito jurisprudencial americano que consubstancia o uso aceitável de material protegido por direitos autorais (copyright). Há de se ressaltar que esse uso não pode se dar de modo indiscriminado, de modo que o fair use, tal como delimitado hoje, é fruto de uma construção histórica de múltiplas decisões judiciais sobre o tema que operaram de forma complementar e determinam em que hipóteses se verifica, ou não, o uso aceitável e sob quais critérios.4

A discussão em relação ao fair use é inserida no debate da Inteligência Artificial Generativa pelos detentores dos direitos autorais das mídias, imagens textos, vídeos e demais dados utilizados para o desenvolvimento da “inteligência” do algoritmo da IA, isso pois as criações desses programas, em maior ou menor grau, reproduzem parte do conteúdo inserido no input inicial da inteligência artificial, de modo que se faz necessário analisar se a criação final do algoritmo é, de fato, uma criação autoral que somente realiza o fair use desses conteúdos, ou se os reproduz em infringência aos direitos autorais dos detentores originais dos conteúdos supramencionados.

Outra questão que se põe ainda relativa ao fair use diz respeito a se a utilização desses conteúdos para “alimentar” uma inteligência artificial generativa constituiria um uso aceitável, ou se seria necessária uma autorização do detentor dos direitos autorais das mídias utilizadas no input para que pudessem ser utilizadas na inteligência artificial generativa.

Ambas as questões ainda padecem de respostas definitivas, de modo que existem aqueles que advoguem que tal qual os seres humanos observam conteúdos e, em algum grau, se inspiram neles para criar um conteúdo autoral, o mesmo ocorreria com as inteligências artificiais generativas e, portanto, a utilização desses conteúdos estaria abarcada pela proteção oferecida pelo fair use.

Lado outro, há quem sustente que as inteligências artificiais generativas operam de modo distinto dos seres humanos, não possuindo verdadeira inteligência, capacidade criativa ou de abstração e, portanto, seriam incapazes de efetivamente criar algo novo. Desse modo as empresas responsáveis pelas inteligências artificiais generativas estariam infringindo os direitos dos detentores dos direitos autorais das mídias e conteúdos utilizados para “alimentar” a IA.

A PROBLEMÁTICA DO “COPYRIGHT” RELATIVAMENTE À INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL GENERATIVA

Outra questão a respeito da Inteligência Artificial Generativa refere-se aos direitos autorais relativos aos conteúdos criados pela inteligência artificial. Sobre o tema duas possíveis respostas foram aventadas por especialistas, utilizadores da ferramenta e pela comunidade de forma geral. A primeira possibilidade seria a de conceder a propriedade autoral a empresa detentora dos algoritmos da IA, a segunda possibilidade seria de conceder a tutela dos direitos autorais ao criador da nova mídia, a pessoa que utilizou a ferramenta da IA para criar uma nova mídia independentemente de seu formato.

A defesa da primeira tese se baseia mormente no grau de interferência do utilizador da ferramenta em relação a efetiva criação da IA, isto é, a pessoa que utiliza a IA tão somente realiza um simples input de comandos na ferramenta (ex: homem ruivo com vestimenta de cowboy montado em um dragão vermelho). Segundo essa linha de intelecção a pessoa tão somente utiliza a IA para determinar um comando de criação que já está contido dentro das numerosas possibilidades da IA, nesse sentido os direitos autorais seriam da empresa detentora da IA e não do utilizador da ferramenta.

Em sentido diverso a segunda tese se baseia na alegação de que a utilização de uma Inteligência Artificial Generativa é análoga a utilização de uma câmera digital, um exemplo de tecnologia no qual os criadores da ferramenta não os detentores dos direitos autorais dos frutos criados por intermédio da tecnologia, pertencendo, em verdade, a seu utilizador, independentemente da habilidade ou inabilidade para tirar uma boa fotografia.

UM FUTURO INCERTO EM RELAÇÃO A MODELOS DE INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL GENERATIVA

Diante da inexistência de uma resposta consolidada acerca dos direitos autorais e do fair use relativamente ao input e ao output de uma inteligência artificial generativa existe a expectativa da criação de uma lei que regulamente as problemáticas apresentadas, ou mesmo que as questões sejam levadas à suprema corte americana para debate.

A despeito da importância de uma consolidação legal ou jurisprudencial sobre o tema é fundamental que a própria sociedade e a comunidade acadêmica, técnica e científica promovam uma interlocução e aventem soluções para essas problemáticas, de modo a não obstar ou retardar o desenvolvimento dessa inovadora tecnologia com potenciais ainda desconhecidos.

 

Referências

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1. ZANT, Tijn van der; KOUW, Matthijs; SCHOMAKER, Lambert. Generative Artificial Intelligence. In: MÜLLER, Vincent C. (eds.). Philosophy and Theory of Artificial Intelligence.  Berlin: Springer, 2013, p. 107-120.

2. ROOSE, Kevin. A Coming-Out Party for Generative A.I., Silicon Valley’s New Craze. New York Times. 21 out. 2022. Disponível em: https://nyti.ms/3gFUe7L. Acesso em: 26 out. 2022.

3. ROOSE, Kevin. A.I.-Generated Art Is Already Transforming Creative Work. New York Times. 21 out. 2022. Disponível em: https://nyti.ms/3sBMgiN. Acesso em: 26 out. 2022.

4. YANKWICH, Leon R. What Is Fair Use? The University of Chicago Law Review. v. 22, n. 1, p. 203-215, 1954. Disponével em: https://bit.ly/3gL2T99. Acesso em: 26 out. 2022.

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