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A recente alteração dos direitos trabalhistas dos caminhoneiros e seus reflexos

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A jornada de trabalho dos caminhoneiros, assim como a necessidade do controle dos horários, é um dos assuntos mais discutidos e reivindicados na Justiça do Trabalho.

A lei 13.103 de 2015, conhecida como a Lei do Motorista,1 estabeleceu que era obrigação do empregador realizar o controle de jornada do caminhoneiro e de outros condutores profissionais, seja no transporte de passageiro ou cargas.

Com a referida determinação empregadores que antes se pautavam suas defesas na exceção prevista no artigo 62,I da CLT, ou seja, trabalho externo, sem possibilidade de controle de jornada e por consequência sem direito às horas extras foram refutadas pela Justiça do Trabalho.

A partir da lei acima mencionada todas as empresas de transportes, passageiros ou cargas, passaram a ser obrigadas a adotar mecanismos de controle de jornada, seja aplicativo (autorizado pela Portaria 671 do Ministério do Trabalho e Previdência), cartão ponto manual ou até mesmo tacógrafo, não obstante a sua utilização, não seja unânime.

Inúmeras ações trabalhistas, de valores expressivos, pulularam na seara trabalhista, visto que inúmeras empresas demoraram a se adequar, ou ainda, tentavam burlar a lei, especialmente, em relação aos intervalos intra e entrejornadas, além do período destinado à espera do carregamento, descarregamento ou fiscalizações a que o motorista tinha que se submeter.

Na determinação da lei de 2015 o motorista poderia ter 11 horas de intervalo fracionado, desde que houvesse 8 horas ininterruptas de descanso.

No caso de tempo de espera para as atividades acima descritas se aquele ultrapassasse 2 horas de espera seria considerado como tempo de descanso, para somar ao tempo do intervalo entrejornadas.

Para o caso do intervalo intrajornada, geralmente destinado à alimentação, a Lei do Motorista estabeleceu que o trabalhador não poderia passar mais de 5h30 minutos ininterruptas dirigindo.

No caso de transporte de carga, a regra era que, dentro do período de 6horas dirigindo deveria haver uma pausa de 30 minutos para o motorista, sendo que no caso do transporte de passageiros, o tempo conduzindo era reduzido para 4 horas, com pausa também de 30 minutos.

Essa pausa de 30 minutos poderia ser dividida em 2 paradas de 15 minutos cada, ou 3 paradas de 10 minutos, a cada 6 horas  de direção.

Cabe mencionar que tal intervalo não substituía o intervalo intrajornada de 1 hora para refeição, sendo que esse, mesmo que houvesse os intervalos acima mencionados, deveria ser cumprido e observado pelo motorista.

No entanto, como tudo no Direito, ainda mais recente, no Direito do Trabalho é mutável infelizmente, sem que haja, a tão almejada, segurança jurídica, no dia 30 de junho de 2023, os ministros do Supremos Tribunal Federal, por 8 votos a 3, sendo um deles da única ministra que realmente atuou no Tribunal Superior do Trabalho, Rosa Weber, decidiram declarar inconstitucional alguns dos dispositivos da Lei 13103/2015.

A votação atingiu especialmente os dispositivos que tratam de jornada de trabalho, intervalos para descanso e fracionamento dos intervalos dos motoristas.

Para o Ministro Alexandre de Moraes, relator do processo, todo o período que o motorista ficava à disposição, aguardando o carregamento, descarregamento ou fiscalização, dentre outros, e que antes, ao ultrapassar 2 horas, não era considerado como jornada de trabalho, passa a ser.

Portanto, se o motorista ficar 3 horas aguardando, parado, mesmo que esteja descansando, não será considerado como intervalo, mas sim como tempo trabalhado.

Com a decisão do STF ficam excluídos da jornada os intervalos para refeição, repouso e descanso, não sendo mais possível considerar como tempo de repouso do motorista, se o veículo estiver em movimento, prática habitual quando há dois motoristas, que se revezam durante a viagem, havendo agora, a necessidade de estacionar o veículo. Segundo o relator, ministro Alexandre de Moraes:

“ (…) Problemas de trepidação do veículo, em movimento, buracos nas estradas, ausência de pavimentação nas rodovias, barulho do motor, ect, são algumas das situações que agravariam a tranquilidade que o trabalhador necessitaria para um repouso completo, prejudicando a recuperação do corpo para encarar a próxima jornada laboral (…)” 2

O intervalo entrejornadas de 11 horas, antes fracionado, deverá ser ininterrupto, sendo inclusive proibido a coincidência do descanso com a parada obrigatória (de 30 minutos a cada 4 ou 6 horas, dependendo do tipo de transporte) na condução do veículo.

Outra alteração refere-se ao intervalo de 35 horas a cada 6 dias de trabalho, não sendo mais possível acumular descanso no retorno à residência.

A declaração de inconstitucionalidade de alguns dos dispositivos contidos na Lei do Motoristas, por óbvio, são benéficas à saúde do motorista, entretanto, qual o impacto no desemprego, na área de transporte, agropecuária, bens de consumos, prestação de serviços, portanto, à toda a sociedade?!? A resposta a tal questionamento abrange todos os setores da sociedade.

O Brasil tem infraestrutura par cumprir com as exigências de descanso? A resposta me parece um tanto quanto óbvia, sendo hipocrisia apresentar um posicionamento utópico. A teoria realmente é fascinante, mas e a prática? Não se trata apenas dos consumidores e do capitalismo, mas também do número de empregos dos motoristas que serão exterminados.

A contratação autônoma, em que não há qualquer direito trabalhista, ao menos na teoria, será a substituição aos vínculos de emprego dos motoristas.

O setor produtivo brasileiro calcula um impacto bilionário, sendo que nos memoriais anexados ao processo, tal setor informa que as mudanças trarão um aumento, de no mínimo, 15% do custo operacional da logística no Brasil, sendo que em viagens de longa distância os custos aumentarão em 30%.

Portanto, seria, no mínimo, ingenuidade, analisar a decisão do Supremo Tribunal Federal apenas pelo viés dos direitos trabalhistas, sendo que os motoristas dependem da sociedade para manter seus empregos, e por óbvio, tal relação também tem o caminho inverso. Mas será que aumentar custos decorrentes do aumento dos direitos trabalhistas, impactará positivamente nos maiores interessados: os motoristas? Só o tempo dirá.

Em 2015 houve uma resistência dos empregadores às novas determinações legais que também tiveram um impacto econômico considerável, mas que ao longo do tempo, foi absorvido.

Torçamos para que, em 2023, novamente tal impacto seja plenamente adaptável e que a Justiça do Trabalho seja palco de novos direitos e não de um mar de ações.

 

Referências

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1. site, visitado em 07.07.23 às 18h45.

2. site, visitado em 08.07.23 às 14h27.

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