No dia 24 de fevereiro de 2025, iniciou a vigência da Resolução nº 224/20241 do Tribunal Superior do Trabalho, que alterou sua Instrução Normativa nº 40/20162 e criou uma hipótese de manejo do agravo interno. Com isso, surgiram dúvidas quanto à sistemática processual advinda dessa nova norma, a qual ainda depende de ajustes nos Regimentos Internos dos próprios Tribunais. Porém, a teoria e a prática processual permitem interpretar e pressupor como funcionará esse “novo” agravo, razão pela qual passo a tentar simplificar a lógica recursal já existente no processo do trabalho.
Como sabido, em 2014, a Lei 13.0153 introduziu alterações na CLT, no tocante a alguns recursos previstos, iniciando, a partir de então, uma aproximação com o regime de precedentes do CPC, prevendo, no artigo 896-C da CLT4, o Incidente de Recursos Repetitivos (IRR). Posteriormente, em 2015, com a alteração significativa do CPC, o TST, valendo-se do que dispõe o artigo 7695 da CLT e o artigo 156 do próprio CPC, editou a Instrução Normativa nº 39/20167 , cujo teor disciplinou a aplicação subsidiária e supletiva do CPC ao processo do trabalho, oportunizando, assim, a aplicação do IRDR (Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas) e do Incidente de Assunção de Competência (IAC). Também em 2016, o TST editou a Instrução Normativa nº 408, dispondo sobre o cabimento do agravo de instrumento em caso de admissibilidade parcial do recurso de revista no TRT.
Com efeito, fica claro que toda essa construção normativa, não obstante seu caráter processual/procedimental, possui um caráter de política judiciária. Não restam dúvidas de que, em razão da inexistência de um “Código de Processo do Trabalho”, com respaldo da própria CLT e do CPC, a Justiça do Trabalho aglutina ao seu processo as normas do Direito Processual Comum, com o condão de alcançar a efetiva tutela jurisdicional.
Todavia, não se deve ignorar o fato de que o TST, atualmente, alcança um volume quase (senão já) invencível de recursos de revista e de agravos de instrumento a serem julgados. É nesse duplo contexto que surge a Resolução nº 224/20249, a qual acrescenta o artigo 1º-A à Instrução Normativa nº 40/2016.
Significa dizer que os procedimentos de IRR, de IRDR e de IAC poderão obstaculizar, ainda no âmbito do TRT, o seguimento ao TST de agravo de instrumento, e por conseguinte, de recurso de revista.
Assim, na hipótese de decisão regional negar seguimento ao recurso de revista interposto contra acórdão que esteja em conformidade com os regimes de IRR, IRDR e IAC, caberá agravo interno, com base no artigo 1.021 do CPC10 (semelhante, senão idêntico ao antigo agravo regimental).
Embora o prazo desse agravo interno necessite adaptação e previsão específica dos Regimentos Internos dos Tribunais Regionais do Trabalho, pressuponho que aplicar-se-á o prazo de 8 (oito) dias, seja pelo que normalmente se verifica na prática regimental, seja pela previsão do inciso XXIX, do artigo 3º, da Instrução Normativa nº 39/2016 do TST11.
Quanto ao processamento do agravo interno, da mesma forma, há a dependência de previsão regimental, mas, também pressuponho que, no caso em espécie, o agravo será processado e julgado pelo Órgão Especial ou pelo Pleno do TRT.
Entretanto, a significativa regra do “novo” agravo interno merece destaque quanto à decisão do agravo. Caso provido o agravo interno, a revista será processada. Porém, em sendo negado provimento ao agravo interno, tal decisão será irrecorrível e não caberá agravo de instrumento ao TST. É aqui que reside a “trava recursal” da aludida Resolução: não seguirá recurso para o TST, em duas instâncias regionais – monocrática e colegiada -, caso a matéria envolva regimes de precedentes do próprio TST.
Por outro lado, se o acórdão recorrido se fundar, além da matéria de precedentes, em outras hipóteses de cabimento (Artigo 896, a, b e c da CLT12), a decisão denegatória do recurso de recurso de revista ensejará a interposição simultânea do agravo interno e do agravo de instrumento, sendo que o recebimento e processamento do agravo de instrumento serão examinados somente após o julgamento do agravo interno.
Exemplificando, supomos que a parte interponha recurso de revista contra acórdão que julgou recurso ordinário, alegando divergência jurisprudencial com decisão de outros Tribunais Regionais do Trabalho, ofensa à Lei e ofensa à Constituição Federal. Em decisão monocrática proferida pela Presidência ou Vice-Presidência do TRT, o recurso de revista teve negado seguimento. O Juízo entendeu por aplicar a Súmula 216 do TST13 em relação às alegadas ofensas à Lei e à Constituição Federal. Já em relação à alegada divergência jurisprudencial, a denegação teve por fundamento a existência de precedente qualificado, qual seja, o Tema 114 dos Incidentes de Recursos Repetitivos, o qual trata da possibilidade de configuração de dano moral in re ipsa quando for exigido do candidato ao emprego ou empregado, injustificadamente, apresentação de certidão de antecedentes criminais. Nesse caso, a parte deverá interpor, no mesmo prazo de 8 dias, agravo de instrumento em relação à denegação da revista por ofensa à Lei e à Constituição Federal, e agravo interno em relação ao capítulo da decisão monocrática fundamentada em precedente qualificado do TST.
Conclui-se, portanto, que, ainda que haja espaço para discussão quanto a possibilidade de violação ao princípio fundamental do duplo grau de jurisdição e da reserva legal (o que, a meu juízo, em princípio, não se configura), a nova hipótese de agravo interno demonstra a necessidade de que os advogados, cada vez mais, revejam a técnica recursal utilizada para manejo do recurso de revista, substituindo os longos textos por peças que demonstrem objetivamente as divergências e violações alegadas, valendo-se de uma “hermenêutica de construção”, ou seja, as questões de direito e as questões de fato devidamente prequestionadas do caso em concreto deverão, sucinta e efetivamente, desafiar a barreira da natureza extraordinária das hipóteses de seguimento, mormente a situação prevista em cada precedente do TST.
Referências
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1. BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Resolução n. 224, de 25 de novembro de 2024. Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho: caderno judiciário do Tribunal Superior do Trabalho, Brasília, DF, n. 4109, p. 52-53, 27 nov. 2024.
2. BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Resolução n. 205, de 15 de março de 2016 [Instrução Normativa n. 40]. Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho: caderno judiciário do Tribunal Superior do Trabalho, Brasília, DF, n. 1940, p. 3-4, 17 mar. 2016.
3. BRASIL. Lei n° 13.015, de 21 de julho de 2014. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, para dispor sobre o processamento de recursos no âmbito da Justiça do Trabalho. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13015.htm. Acesso em: 09 mar. 2025.
4. “Art. 896-C. Quando houver multiplicidade de recursos de revista fundados em idêntica questão de direito, a questão poderá ser afetada à Seção Especializada em Dissídios Individuais ou ao Tribunal Pleno, por decisão da maioria simples de seus membros, mediante requerimento de um dos Ministros que compõem a Seção Especializada, considerando a relevância da matéria ou a existência de entendimentos divergentes entre os Ministros dessa Seção ou das Turmas do Tribunal.”(BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452, de 1 de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Rio de Janeiro: Presidência da República, 1943. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm. Acesso em: 09 mar. 2025.).
5. “Art. 769 – Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.” (BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452, de 1 de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Rio de Janeiro: Presidência da República, 1943. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm. Acesso em: 09 mar. 2025.).
6. “Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente.” BRASIL. Código de Processo Civil. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/L13105compilada.htm. Acesso em: 09 mar. 2025.).
7. BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Resolução n. 203, de 15 de março de 2016 [Instrução Normativa n. 39]. Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho: caderno judiciário do Tribunal Superior do Trabalho, Brasília, DF, n. 1939, p. 1-4, 16 mar. 2016.
8. BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Resolução n. 205, de 15 de março de 2016 [Instrução Normativa n. 40]. Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho: caderno judiciário do Tribunal Superior do Trabalho, Brasília, DF, n. 1940, p. 3-4, 17 mar. 2016.
9. BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Resolução n. 224, de 25 de novembro de 2024. Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho: caderno judiciário do Tribunal Superior do Trabalho, Brasília, DF, n. 4109, p. 52-53, 27 nov. 2024.
10. “Art. 1.021. Contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado, observadas, quanto ao processamento, as regras do regimento interno do tribunal.” (BRASIL. Código de Processo Civil. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/L13105compilada.htm. Acesso em: 09 mar. 2025.).
11. BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Resolução n. 203, de 15 de março de 2016 [Instrução Normativa n. 39]. Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho: caderno judiciário do Tribunal Superior do Trabalho, Brasília, DF, n. 1939, p. 1-4, 16 mar. 2016.
12. BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452, de 1 de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Rio de Janeiro: Presidência da República, 1943. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm. Acesso em: 09 mar. 2025.
13. BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula n° 216. Disponível em: https://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/Sumulas_com_indice/Sumulas_Ind_201_250.html#:~:text=S%EF%BF%BDmula%20n%EF%BF%BD%20216%20do%20TST. Acesso em: 09 mar. 2025.
14. BRASIL. Consulta aos Recursos de Revista Repetitivos. Tema 1º IRR-243000-58.2013.5.13.0023. Dano Moral. Exigência de Certidão Negativa de Antecedentes Criminais. Disponível em: https://tst.jus.br/nugep-sp/recursos-repetitivos. Acesso em: 09 mar. 2025.