A Responsabilidade das Plataformas de Intermediação na Sharing Economy Diante da Publicidade Enganosa Veiculada por Terceiros

A Responsabilidade das Plataformas de Intermediação na Sharing Economy Diante da Publicidade Enganosa Veiculada por Terceiros

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Com o advento da internet como meio efetivo de contratação, houve uma mudança significativa na forma de consumir, substituindo a exclusividade dos estabelecimentos físicos pelo distanciamento virtual e a impessoalidade das relações.1 Se inicialmente houve resistência devido à falta de segurança jurídica, hoje a internet é reconhecida como sólida e eficiente na constituição de relações jurídicas.

O meio digital trouxe outras formas de contratação ganharam destaque, especialmente aquelas que podem ser celebradas exclusivamente online, como na economia do compartilhamento (sharing economy). Essa economia emergiu como uma alternativa sustentável em um contexto em que a aquisição definitiva de bens se tornou inviável, refletindo um novo modelo de negócios em crescimento.

As plataformas de compartilhamento estão ganhando espaço em uma ampla gama de setores econômicos, abrangendo atividades como lazer, transporte de pessoas ou mercadorias, locação de bens e hospedagem, entre outros. Como exemplo, podem ser citados Airbnb, Uber, Mercado Livre, eBay, etc.

Sobre o tema, apontam Dennis Verbicaro e Nicolas Pedrosa:

Entende-se a economia de compartilhamento como um fenômeno que promove o compartilhamento de bens e serviços, que se encontram subutilizados ou ociosos, por meio de canais digitais que conectam consumidores que se propõem a compartilhar seus bens com base na confiança (2017, p. 462)2

Essa nova abordagem econômica não só viabiliza a maximização da utilização de recursos que não estão sendo plenamente aproveitados, mas também estimula a geração de novas fontes de renda tanto para indivíduos quanto para empresas. Ao compartilhar ativos subutilizados, como quartos disponíveis, veículos particulares ou habilidades especializadas, os participantes têm a oportunidade de gerar receita adicional, o que contribui para a eficiência econômica ampliada e a redução do desperdício de recursos.

Adicionalmente, a economia de compartilhamento fomenta a inclusão social ao possibilitar que pessoas de diferentes origens e recursos se envolvam ativamente no mercado, criando assim oportunidades de acesso a bens e serviços que, de outra forma, poderiam estar fora de alcance.

Contudo, alguns problemas de ordem jurídica surgem em relação ao referido modelo, sendo importante destacar, neste momento, a veiculação de publicidade enganosa por terceiros em plataformas de intermediação. Essas plataformas, ao servirem como intermediárias entre consumidores e fornecedores, frequentemente se deparam com conteúdos publicitários questionáveis que podem induzir os consumidores a erro.

De acordo com o Código de Defesa do Consumidor:

Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

1° É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços.

A complexidade da temática reside na determinação da responsabilidade das plataformas de intermediação frente a essas práticas enganosas. Embora não sejam diretamente responsáveis pela criação desses anúncios, as plataformas podem ser consideradas coadjuvantes na disseminação da informação falsa ao permitirem sua veiculação em seus canais. Nesse sentido, surge o debate acerca da obrigação das plataformas em monitorar e filtrar conteúdos publicitários, a fim de prevenir a disseminação de informações enganosas.

Caio César do Nascimento Barbosa, Michael César Silva e Glayder Daywerth Guimarães deslindam que:

O Código de Defesa do Consumidor se apresenta como o arcabouço jurídico adequado a garantir a tutela dos consumidores no mercado de consumo, por meio da implementação de diversos direitos atribuíveis ao consumidor, incluindo-se, a proteção em relação ao conteúdo publicitário veiculado ilicitamente por fornecedores ou terceiros.3

Nesta baila, é incontestável o impacto da qualidade dos serviços oferecidos pelas plataformas, que exercem controle sobre o cadastro de seus usuários e estabelecem políticas para a utilização de seus serviços. Tal controle deveria, em tese, buscar a implementação de critérios mais rigorosos no processo de anúncios, com maior monitoramento de conteúdos que possam a ser abusivos, ou enganosos, visando evitar conflitos entre compradores (consumidores) e vendedores (parceiros).

A jurisprudência, inclusive, assim entende:

PROCESSUAL CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS E MATERIAIS. PUBLICIDADE FALSA. Pretensão da ré à produção de prova oral para oitiva da pessoa supostamente responsável pelo lançamento do conteúdo impugnado. Ainda que terceiro tenha sido responsável pela publicação enganosa do anúncio, não se revelava necessária a oitiva da testemunha, visto que os fatos foram adequadamente esclarecidos pelos documentos juntados aos autos. Não importa o fato de ter a ré imediatamente excluído a publicidade impugnada, certo é que o desenvolvimento da sua atividade criou o risco de prejudicar terceiro. Portanto, ainda que se aceite a posição da ré de mera intermediária, é imperioso reconhecer que a sua atividade criou ambiente e condições ao dano sofrido pelo autor. Não fosse a atividade da ré o autor não teria sofrido abalo moral perante clientes, como se demonstrou nos autos. O risco é da ré porque ela obtém proveito desse negócio. Preliminar afastada. […] No caso em exame, a veiculação do anúncio, ato objetivamente praticado pela ré, foi causa direta e imediata do dano experimentado pelo autor. Foi a partir da publicação do anúncio que lojistas suspeitaram da solidez do empreendimento. Houve, portanto, nexo causal entre a divulgação, sem qualquer cautela, e o prejuízo moral sofrido pelo autor, o que confirma, portanto, a legitimidade da ré para o pedido. Assim, o dano não foi exclusivamente causado por terceiro. Não tem, portanto, incidência o disposto no art. 18, da Lei 12.965/14. A autora, como veículo de comunicação, também é responsável, pois não tomou qualquer cautela ao veicular o anúncio. A conduta ilícita em exame, portanto, restringe-se à veiculação praticada pela ré e não propriamente a criação do conteúdo impugnado. Sentença de procedência parcial dos pedidos mantida. Recurso não provido. (TJ-SP – APL: 10286724120138260100 SP 1028672-41.2013.8.26.0100, Relator: Carlos Alberto Garbi, Data de Julgamento: 30/09/2014, 10ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 01/10/2014)

Diante do exposto no caso em análise, torna-se evidente a responsabilidade das plataformas no que concerne à veiculação do anúncio, que se mostrou enganoso e prejudicial ao consumidor. Embora seja indiscutível que terceiros tenham desempenhado um papel na criação do conteúdo publicitário, é fundamental reconhecer que a intermediária, contribuiu para a disseminação desse material, criando o ambiente propício para o dano ocorrer.

Portanto, a decisão em questão reforça a importância de considerar não apenas os agentes diretos, mas também os intermediários na veiculação de publicidade enganosa, ressaltando a responsabilidade de todos os envolvidos na cadeia de disseminação dessas informações falsas, expandindo o conceito de responsabilidade solidária destacada tanto no artigo 7º quanto no 25, ambos do Código de Defesa do Consumidor.

 

Referências

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1. BARBOSA, Caio Cesar do Nascimento; GUIMARAES, Glayder Daywerth Pereira; SILVA, Michael Cesar. A responsabilidade civil dos influenciadores digitais em tempos de coronavirus. In: FALEIROS JUNIOR, Jose Luiz de Moura; LONGHI, Joao Victor Rozatti; GUGLIARA, Rodrigo (Coords.). Proteçao de Dados na Sociedade da Informaçao: entre dados e danos. Indaiatuba, SP: Editora Foco, 2021, p.320.

2. VERBICARO, Dennis; PEDROSA, Nicolas. O impacto da economia de compartilhamento na sociedade de consumo e seus desafios regulatórios. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, v. 26, n. 113, 457-482, set./out. 2017.

3. SILVA, Michael César; GUIMARÃES, Glayder Daywerth Pereira; BARBOSA, Caio César do Nascimento. Digital Influencers e Social Media: repercussões jurídicas, perspectivas e tendências da atuação dos influenciadores digitais na sociedade do hiperconsumo. Indaiatuba, SP: Editora Foco, 2024, p. 47.

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