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Aplicabilidade da teoria da imprevisão e o coronavírus

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A maior problemática envolvida no âmbito empresarial durante a pandemia do coronavírus foi, e continua sendo, o devido cumprimento das avenças firmadas anteriormente do início da pandemia. Para tanto, surgiram questionamentos a respeito da possibilidade de revisão ou até mesmo da resolução contratual nos casos dos contratos empresariais.

Nesta esteira, conforme conceitua o renomado professor Fábio Ulhôa Coelho “Os contratos são empresariais (comerciais ou mercantis), assim, se os dois contratantes são empresários”.

Pois bem, é condição sine qua non para correta estruturação de uma relação contratual, o equilíbrio contratual entre as partes e a segurança jurídica interposta nessa relação, sem isso as obrigações acordadas entre as partes não se sustentam tornando impossível o negócio jurídico.

Para a devida aplicação da segurança jurídica, há que se tutelar o princípio da pacta sunt servanda que observa a autonomia da vontade das partes. Isto porque, desde que as partes estejam de acordo e queiram se submeter a regras por elas próprias estabelecidas, o contrato obriga os contratantes como se fosse lei. Obviamente que o acordo celebrado entre as partes deve estar revestido de todos os requisitos impostos pela legislação para que tenha efeitos.

Porém, a autonomia da vontade das partes, regido pelo princípio da pact sunt servanda, não é absoluta e, conforme a Constituição Federal e o Código Civil Brasileiro de 2002, há a observância também dos princípios da boa-fé objetiva, função social, equilíbrio contratual e também da cláusula rebus sic stantibus.

A Carta Magna e o Código Civil Brasileiro de 2002 abrangem o tema tutelando que qualquer relação contratual pode ser influenciada ou modificada devido a alguma influência externa a sua relação contratual/comercial inicial.

Tal influência são alheias à vontade das partes e podem alterar o cumprimento das obrigações dispostas inicialmente na celebração do contrato e, diante desse raciocínio, os contratos estão sujeitos à imprevisão, que, em nosso ordenamento jurídico, está representada pela cláusula rebus sic stantibus, que objetiva a execução do contrato nas mesmas condições em que pactuado, protegendo os contratantes de mudanças imprevisíveis e inesperadas.

O cumprimento da obrigação contratada se afigura como ponto de convergência entre o pacta sunt servanda e a cláusula rebus sic stantibus. O primeiro preserva a liberdade de contratar, a autonomia da vontade e a segurança jurídica; já o segundo preserva a igualdade entre os contratantes, o equilíbrio contratual e a prevalência do interesse social em detrimento do interesse particular.

Desta forma e conforme preceitua o Código Civil em seus artigos 317, 421, 478, 479 e 480, é evidente que a situação gerada pela pandemia do coronavírus pode ser enquadrada como “acontecimento extraordinário e imprevisível”, principalmente à luz do art. 478 do Código Civil, conforme estampado abaixo:

“Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.”

Além do mais, a utilização da teoria da imprevisão não pode levar apenas à resolução do contrato, mas também pode modificar a relação contratual antes estabelecida, permitindo que o pactuado anteriormente possa seguir com um novo equilíbrio contratual, conforme disposição do artigo 479 do Código Civil:

 “Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato. ”

Há também entendimento jurisprudencial neste mesmo sentido e que ainda a aplicabilidade da teoria da imprevisão não pode ser aplicada apenas para uma parte, discorrendo que “A propósito, em razão de as consequências econômicas da pandemia de Covid-19 terem sido sentidas tanto pelo agravante como pela agravada, não se pode aplicar a teoria da imprevisão para favorecer apenas uma das partes, o que já foi dito nesta Corte (Agravo de Instrumento n. 5002655-79.2021.8.24.0000/SC)”.

Portanto, não há o que se falar da não possibilidade da aplicabilidade da teoria da imprevisão nos contratos empresarias, podendo provocar a sua rescisão ou a revisão dos contratos celebrados anteriormente à pandemia e que continuaram vigentes, cabendo ao Poder Judiciário julgar o direito das partes envolvidas.

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Lucas Ambrosio de Almeida

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