Assédio Moral: O Mal Silencioso

Assédio Moral: O Mal Silencioso

mão feminina protegendo o corpo de agressões

O assédio moral no ambiente de trabalho é o ponto nevrálgico atual das empresas, sejam elas públicas ou privadas, sendo responsável por inúmeras ações trabalhistas, assim como, acarretando doenças psíquicas aos empregados, o que justifica a estreia desta coluna com tal tema.

Segundo informações do Tribunal Superior do Trabalho, o assédio em questão foi o assunto mais abordado nas denúncias realizada nos últimos dez anos. A cada dez empresas, sete tem reclamatórias trabalhistas contendo pedidos por este fato,1 sendo que com a pandemia de 2020 houve um aumento considerável no referido número.

A conduta, para ser caracterizada juridicamente como assédio, deve ser reiterada, visando o abalo emocional, por meio de atos, palavras, gestos e omissões que visem o enfraquecimento e/ou diminuição da autoestima da vítima. 2

O assédio moral tem como um dos seus elementos a existência de uma relação de hierarquia entre o assediado e o assediador, que utiliza sua posição funcional para humilhar, constranger, perseguir seu subordinado, exigindo deste, serviços superiores à sua força de trabalho, contrários aos bons costumes, alheios ao contrato de trabalho ou atos e omissões constrangedoras.

Um exemplo típico de assédio moral dentro do ambiente de trabalho ocorre em algumas empresas que possuem metas diárias, sofrendo inúmeras pressões dos seus gerentes, inclusive com exposição de ranking de produtividade, além de “prêmios” para o último lugar. As reclamatórias trabalhistas são inúmeras em relação a tais pedidos, inclusive com pedido de doenças psicossomáticas decorrentes desse assédio.

O assediado seja em decorrência do medo de perder o empregado, da humilhação, do medo de exposição acaba se calando desenvolvendo doenças, tais como depressão, síndrome do pânico, doença de Burnout, dentre outras, razão pela qual o caracterizamos como “mal silencioso”.

Mas o subordinado pode assediar moralmente o superior hierárquico? Apesar de muito raro, pode ocorrer.

O assédio do subordinado em relação ao seu superior pode ocorrer, por exemplo, quando aquele tem acesso a alguma informação confidencial deste, utiliza-a para obter vantagens pessoais como aumento de salário, promoção, jornada de trabalho mais benéfica.

Para ambas as posturas há penalidades como a rescisão indireta, no caso de assediador ser o superior hierárquico, prevista no artigo 483 da CLT e demissão por justa causa, no caso do assediador ser o empregado prevista no artigo 482 da CLT.

O assédio moral pode inclusive, em seu aspecto mais grave, ser de ordem sexual, atingido a conduta antiética de forma incontestável.

O assédio, em muitos casos, inicia-se como uma “ brincadeira”, como algo visto como inofensivo, sendo que a vítimas muitas vezes se questiona se efetivamente tal ato ultrapassa a barreira da ética ou não, baseando-se na “política do medo”, no receio de ser mandado embora, se submete a condutas inaceitáveis por parte dos supervisores.

Tal conduta assediadora tem como características principais o fato de ser prolongada, repetitiva, de natureza psicológica ou sexual, afrontando a dignidade da pessoa humana, com o objetivo de excluir a posição do empregado ou prejudicá-lo, sendo que a vítima passa a ser sentir inferiorizada e acuada.

Apelidos, chacotas, são atitudes inaceitáveis dentro do contexto do compliance, sendo que através dos canais de comunicação será possível identificar o algoz de tais atos, adotando as punições necessárias. Essa forma de assédio, muitas vezes, configura o bullying, ou seja, não há uma hierarquia entre o cargo, sendo de colega para colega, com o intuito de forçar a demissão da vítima, o seu pedido de aposentadoria precoce ou até mesmo uma transferência.3

Destaca-se que o compliance consiste na adequação das empresas as normas e regulamentos existentes, inclusive em relação ao código de conduta.

Ademais, o fenômeno do assédio moral se configura pelo isolamento da vítima no ambiente de trabalho, o cumprimento rigoroso do trabalho com o pretexto para maltratar psicologicamente o empregado, referências indiretas negativas à intimidade da vítima e discriminação desta, sem qualquer justificativa plausível. 4

No que se refere ao isolamento, uma das formas de silenciar a vítima, inicia-se com o ato de não mais receber informações relevantes pelo superior hierárquico, não sendo mais convocada para as reuniões, a comunicação passa a ocorrer através de bilhetes, boatos, ou até mesmo deixam de existir, ao ponto de deixar o funcionário desnorteado sem saber o que fazer dentro do ambiente de trabalho.

A vítima, nessa forma de assédio, é interrompida constantemente, sendo que a comunicação passa a ser unicamente por escrito, evitando qualquer contato com ela, até mesmo o visual, prática que o algoz pode inclusive impor aos colegas de trabalho.

Portanto, o assédio moral não se configura apenas através de ações desrespeitosas, mas também por omissões que acarretam o isolamento do funcionário.

Há ainda o dano moral da pessoa jurídica, em que o funcionário por exemplo, utiliza as redes sociais para denegrir a imagem da empresa, do seu empregador, cujo reflexo comercial é desastroso muitas vezes.

Dentro da integridade do ambiente de trabalho é fundamental que o compliance officer (responsável pela aplicação do compliance na empresa), assim como os gestores e encarregados estejam atentos as normas de segurança e medicina do trabalho, gestão do ambiente de trabalho e a forma de tratamento com os subordinados.

Os canais de denúncias/comunicação são os instrumentos fundamentais na tentativa de detectar o algoz e barrar essa forma de procedimento, seja pelo gestor, seja por outro funcionário. A atuação efetiva desses canais além de evitar eventuais ações trabalhistas, tem como objetivo principal manter a sanidade dos funcionários e o ambiente de trabalho saudável.

Os canais de denúncia possuem fundamental importância para extinguir tais formas de assédio dentro do ambiente de trabalho:

“ (…) a abertura de canais para o recebimento de reclamações e denúncias (whistleblowing) com a adoção de mecanismos para apuração de eventuais desvios de conduta, deve garantir o sigilo, o correto encaminhamento das denúnicas e a preservação da privacidade dos envolvidos, pode minorar os efeitos da responsabilização e evitar que as práticas indevidas sejam perpetuadas na empresa e outras pessoas seja vítimas da conduta lesiva(…)”.5

O compliance no aspecto do assédio moral tem como desafio desenvolver uma cultura de valorização dos trabalhadores, como indivíduos e não apenas como instrumentos das empresas, sem os quais não seria possível o desenvolvimento desta, garantindo inclusive a função social da pessoa jurídica.

Atos e omissões que gerem abalo de ordem moral, humilhações e até mesmo doenças psíquicas não podem ser toleradas ou vistas apenas como modus operandi do negócio. Em um mundo em que as relações humanas voltaram a emergir o ambiente saudável de trabalho e a dignidade da pessoa humana deve ser prioridade e compromisso do empregador.

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Carolina Quinelato da Costa

 

Referências

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1. Site www.tst.jus.br, visitado em 08 de novembro de 2021, às 11h39.

2. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 18. ed. São Paulo: Ltr, 2019, p. 1464 e ss.

3. RAMOS, Luis Leandro Gomes Ramos; GALIA, Rodrigo Wasem. Assédio Moral no Trabalho. 1.ed. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 212, p. 42-43.

4. AFONSO NETO, Dallegrave José. Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2007, p. 284-285.

5. SILVA, Fabrício Lima; PINHEIRO, Iuri; BONFIM, Vólia. Manual do Compliance Trabalhista – Teoria e Prática, 2. ed. Salvador: Editora Jus Podivm, 2021. P.656 e ss.

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