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Breves comentários sobre lobby e Direito Ambiental

Breves comentários sobre lobby e Direito Ambiental

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No último mês defendi minha dissertação de mestrado. Escrevi sobre a regulamentação do lobby e seu impacto na transparência do poder público, analisando os sistemas jurídicos da América Latina que possuem atos normativos que regulamentam o exercício do lobby. O Mestrado foi concluído na Escola Superior Dom Helder Câmara, tendo como linha de pesquisa o Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável. Analisar e defender a regulamentação do lobby em uma pós-graduação de Direito Ambiental, por óbvio, trouxe à tona a pergunta de qual a relação entre lobby e Direito Ambiental? Sem a pretensão de reescrever o projeto de pesquisa, busco neste artigo tecer breves considerações sobre a relação entre lobby e direito ambiental, com a intenção de afastar o estigma de imoralidade e ilicitude que recaiu sobre o tema.

O lobby, nada mais é, que a defesa de interesses particulares frente a um agente público, a fim de influenciar a tomada de decisão. Neste sentido, o lobby é um instrumento democrático, que permite que qualquer cidadão ou grupo organizado entre em contato com o agente público, para influenciar que ele tome determinada decisão. Por exemplo, quando um cidadão procura o vereador eleito para pleitear a reforma da calçada da sua rua, isso pode ser considerado lobby. O conceito de lobby não se confunde com práticas ilícitas e “associá-lo exclusivamente à defesa de ilícita de interesses significaria desprezar as contribuições positivas que pode proporcionar” (MANCUSO; GOZETTO, 2018, p. 05).1

O lobby, embora frequentemente associado à defesa de interesses escusos, não possui natureza ilícita, por si. Existem normas esparsas no ordenamento jurídico brasileiro que fornecem arcabouço “aplicável ao lobby e atividades de representação de interesses” (SANTOS, 2007, p. 408).2 Por exemplo, a Constituição Federal de 1988 assegura o direito de petição, o direito à livre manifestação de pensamento e garante a liberdade de associação. Além disso, conforme leciona Farhat (2007, p. 68), inexiste proibição expressa do exercício da atividade, e “nas democracias, como se costuma dizer, o que não é proibido por lei, é permitido”.3

Em matéria ambiental, além das garantias fundamentais previstas constitucionalmente, as normas infraconstitucionais também asseguram o direito à participação, como as audiências públicas nos processos de licenciamento ambiental. O exercício do lobby influencia diretamente na elaboração de políticas públicas ambientais. A defesa de interesses que impactam o meio ambiente ocorre frequentemente – tanto por empresas e grupos econômicos, quanto por organizações ambientalistas – permitindo diálogo amplo e prévio à tomada de decisão que causará impactos na esfera ambiental.

Um exemplo de lobby em matéria ambiental é encontrado, na história do Brasil, no momento de votação do Código Florestal, envolvendo atuação de celebridades e organizações da sociedade civil para mobilizar a sociedade a pressionar que fosse vetado o texto do Código Florestal aprovado pelo Congresso Nacional (BUENO, 2016).4 O lobby exercido em torno da possibilidade de aprovação do Código Florestal ocorreu tanto em sentido favorável quanto contrário à aprovação da lei.5 A defesa dos interesses das organizações ambientalistas se iniciou quando o texto da lei estava em discussão na Câmara dos Deputados, momento em que “os ambientalistas acompanharam as sessões a fim de levantar as fragilidades do projeto, publicando pareceres de especialistas acerca dos impactos do novo código florestal.” (LOOSE et. al, 2013, p. 15).6

Tão logo aprovado o texto pelo Congresso Nacional, a estratégia de influência foi direcionada à Presidência da República, por meio do movimento “Veta, Dilma”. Este movimento foi intensamente difundido nas mídias sociais, com engajamento de pessoas públicas, pressionando o veto ao texto legal. O alcance do movimento a favor do veto pressionou a bancada ruralista a iniciar a campanha “Não veta, Dilma”, que não alcançou a mesma expressividade (LOOSE et. al, 2013). As articulações resultaram no veto parcial do texto aprovado pelo Poder Legislativo.

O caso do Código Florestal é apenas um exemplo para demonstrar como o lobby está presente na nossa sociedade. As atividades de lobby podem ser um importante instrumento que integrará a pluralidade democrática, na medida em que permitem o acesso direto ao tomador de decisão pública. É preciso superar o estigma de marginalidade que recaiu sobre o termo, a fim de encarar que sua prática ocorre cotidianamente. Somente aceitando que o lobby não é, por si, ilícito é que será possível trazer luz ao exercício da atividade, evitando que sua prática ocorra na clandestinidade e nas antessalas do poder público.

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Maria Luísa Brasil Gonçalves Ferreira

 

Referências

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1. MANCUSO, Wagner Pralon; GOZETTO, Andréa Cristina Oliveira. Lobby e políticas públicas. Editora FGV, 2018, 139p. Edição do Kindle.

2. SANTOS, Luiz Alberto dos; COSTA, Paulo Mauricio Teixeira da. The contribution of lobby regulation initiatives in addressing political corruption in Latin America. Journal of Public Affairs. 2012, vol. 14, núm. 3-4. Disponível em: https://bit.ly/3SPM1MX. Acesso em 02 de fev. 2022.

3. FARHAT, Saïd. Lobby: o que é e como se faz: ética e transparência na representação junto a governos. São Paulo: Editora Peirópolis, 2007.

4. BUENO, Bruno Taitson. A influência do movimento ambientalista nas políticas públicas: um estudo comparado entre Brasil e Estados Unidos. 2016. 314f. Tese (Doutorado) – Universidade de Brasília: Centro de Desenvolvimento Sustentável, 2016. Disponível em: https://bit.ly/3SQMr5C. Acesso em 12 de dez. 2021.

5. BBC. Ambientalistas e ruralistas intensificam lobby sobre Código Florestal. 2011. Disponível em: https://bbc.in/3bXgyaQ. Acesso em 12 de dez. 2021.

6. LOOSE, Eloisa Beling; FENIMAN; Eduardo; CANTON, Maicon; HOROCHOVSKI, Rodrigo. A mobilização social do “Veta, Dilma”: análise das estratégias políticas ligadas à comunicação contra a sanção do novo Código Florestal. In: 5º Congresso da Associação Brasileira de pesquisadores em comunicação política. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2013. Disponível em: https://bit.ly/3Cp4haj. Acesso em 17 de dez. 2021.

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