A pandemia ainda influencia de forma extrema os trabalhadores atuando não apenas no ambiente de trabalho, mas principalmente na saúde emocional e física do trabalhador.
No artigo em que tratamos sobre assédio moral no ambiente do trabalho abordamos de forma superficial uma das consequências da pressão, da humilhação, das ameaças, ou seja, do assédio que o empregado pode ser exposto, sendo que tais condutas são o berço do desenvolvimento de várias doenças de ordem psicológica, como a depressão, a síndrome do pânico e a síndrome de Burnout.
O assédio moral, como já conversamos anteriormente, atinge diretamente a saúde psíquica e física do empregado, o qual passa a viver em ambiente hostil, tenso, capaz de gerar distúrbios psicossomáticos, desencadeando as doenças acima mencionadas.1
No entanto, o reconhecimento das sequelas decorrentes desse ambiente, principalmente na saúde do empregado é algo recente, sendo que nas últimas duas décadas doenças como depressão e síndromes como a tratada nesse artigo passaram a ser encaradas, finalmente, como doenças ocupacionais.
Com a inserção, em 01 de janeiro de 2022, da Síndrome de Burnout, pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID11), volta-se os holofotes novamente para a saúde do empregado, mas agora, especificamente para a empresa, para o ambiente de trabalho.
A partir dessa revisão há o enquadramento como doença do trabalho, passando a empresa a ser a responsável diretamente pela saúde do empregador. Portanto, o ônus, a responsabilidade em afastar qualquer nexo com o trabalho passa a ser do empregador, e não mais do empregado demonstrar que a desenvolveu em decorrência do seu labor.
Não basta agora apenas fazer exames de saúde periódicos nos funcionários, ginástica laboral, é necessário focar na saúde mental, elaborar campanhas e adotar ações estruturadas para manter um ambiente de trabalho descomprimido e saudável, não apenas do ponto de vista física, mas também do ponto de vista emocional. 2
No Brasil, tal síndrome atinge cerca de 30% dos trabalhadores, ou seja, mais de 120 milhões de trabalhadores sofrem dessa doença, que se caracteriza por sentimentos de exaustão ou perda de energia, isolamento mental do trabalho, pensamentos negativistas ou irônicos e redução no rendimento, ou seja, é resultante de um estresse crônico no trabalho, a ponto do funcionário acordar repetidas vezes para verificar aplicativos de conversas e ligações. 3
O esgotamento causado pela síndrome de Burnout não é um cansaço que pode ser resolvido com alguns dias de férias, por exemplo, mas sim um esgotamento profundo, em que o trabalhador deixa de desenvolver seu trabalho, não conseguindo sequer manter-se mentalmente ativo durante sua jornada.
Que a síndrome de Burnout é uma doença ocupacional causada pelo estresse excessivo, pelas cobranças, pelo trabalho repetitivo, sem motivação, humilhante, pelos assédios, isso é indiscutível.
No entanto, o Burnout tem apenas como algoz o empregador? Trago aqui uma elucubração um tanto quanto polêmica. Não se questiona o papel do ambiente de trabalho e por consequente do empregador como a causa principal de tal síndrome, mas a pandemia que nos assola desde março de 2020 não nos atingiu de forma inegável, a ponto de no mínimo questionarmos quem atualmente encontra-se inabalável? Perguntas com algumas vertentes.
A pandemia levou o indivíduo a encarar um dos nossos maiores medos: o medo de um vírus desconhecido que causava sua morte rápida; o medo de perder entes queridos sem que o dinheiro ou qualquer instrumento fossem suficientes para salvá-los, pois não há cura; o medo do desemprego; o medo da falência.
É inegável que viver sob o efeito desses medos, dessas incertezas por um período de dois anos abala emocionalmente qualquer indivíduo, mesmo os que possuem um ambiente de trabalho saudável, a ponto de desenvolverem um esgotamento físico e emocional profundo, tendo como uma das consequências uma visão negativa sobre a vida.
Por óbvio, não há como utilizar o momento atual como um curativo sobre a responsabilidade do empregador, mas em uma análise mais profunda, um elemento de majoração o estado emocional do trabalhador.
De todo modo, cabe aos empregadores cumprirem o seu dever objetivo de resguardar seus empregados, a afim de manter um ambiente de trabalho sadio, em que haja exigências dentro da razoabilidade, sem que a pressão impere, e que eventuais excessos sejam punidos.
O enquadramento da Síndrome de Burnout como uma doença ocupacional, independentemente do momento da pandemia, tem viés crônico relacionado ao trabalho, e como tal deve ser tratado e evitado pelos empregadores.
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Referências
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1. RAMOS, Luis Leandro Gomes. GALIA, Rodrigo Wasem. Assédio Moral no Trabalho. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2012, p.75
2. GRANATO, Luísa. Burnout vira doença do trabalho em 2022. O que muda agora? Exame. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3GEdkSY. Acesso em: 03 fev. 2022.
3. SÍNDROME de Burnout atinge cerca 30% dos trabalhadores brasileiros. Unimed. 2019. Disponível em: https://bit.ly/3sx78Hk. Acesso em: 03 fev. 2022.