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Direito Sucessório do Embrião Congelado

Direito Sucessório do Embrião Congelado

Embrião

Resumo

No presente artigo científico, discute-se a reprodução assistida e seus desafios legais no Brasil. O texto aborda a falta de legislação específica que regulamente essa prática, bem como a questão dos direitos sucessórios do embrião concebido após a morte de um dos genitores. São apresentados conceitos de personalidade, sucessão e direitos do embrião, discutindo a teoria natalista e os princípios constitucionais envolvidos. Diferentes perspectivas são abordadas, incluindo a necessidade de proteger os interesses da criança concebida por reprodução assistida pós-morte e garantir o princípio da autonomia da vontade do falecido. Por fim, destaca-se a importância de uma legislação clara e abrangente para orientar essas questões complexas e garantir os direitos e proteção adequados para todas as partes envolvidas.

Introdução

Reprodução assistida é um conjunto de técnicas, utilizadas por médicos especializados, que têm como principal objetivo tentar possibilitar a gestação em mulheres com dificuldades para engravidar.1 Por conseguinte, existe uma camada diversa de cidadãos que buscam viabilizar a gestação através desta prática, que consiste na implantação de material genético de um casal e/ou terceiro, no útero da companheira ou de terceira pessoa.

Todavia, a carência de legislação que regulamente essa atividade dificulta sua plena realização. Atualmente, no Brasil existem apenas resoluções promovidas pelo Conselho Federal de Medicina, que regimentam o procedimento da reprodução assistida, e que esclareçam os direitos do embrião congelado.

Diante dada escassez, existe debates sobre os direitos sucessórios do filho concebido pós-morte através da reprodução assistida.

Definição da personalidade do embrião

Personalidade conforme conceitua Ponte de Miranda é “personalidade é a possibilidade de se encaixar em suportes fácticos, que, pela incidência das regras jurídicas, se tornem fatos jurídicos; portanto, a possibilidade de ser sujeito de direito. A personalidade, como possibilidade, fica diante dos bens da vida, contemplando-os e querendo-os, ou afastando-se de si; o ser sujeito de direito é entrar no suporte fáctico e viver nas relações jurídicas, como um dos termos delas.”

Neste sentido o Código Civil de 2002, mais especificamente em seu artigo 2º, fica estabelecido que a personalidade civil de uma pessoa tem início no momento do nascimento com vida, adotando assim no ordenamento Brasileiro a teoria natalista.

A teoria natalista, amplamente adotada pelos autores do Direito Civil Brasileiro, estabelece que a personalidade jurídica civil tem início apenas a partir do nascimento com vida. De acordo com essa teoria, a aquisição da personalidade jurídica depende de dois requisitos (i) o nascimento e a (ii) vida, sendo o segundo comprovada pela respiração.

Entretanto, é importante ressaltar que esse diploma legal também protege, desde a concepção, os direitos do nascituro, isto quer dizer que antes mesmo do nascimento com vida, já existe uma pessoa com capacidade para exercer seus direitos, embora ainda não possua a personalidade civil, a qual requer o nascimento com vida.

Conceito de sucessão

A sucessão refere-se à transmissão dos direitos e deveres de uma pessoa falecida para os seus herdeiros. Podendo ocorrer de forma voluntária, por meio de testamento, ou de forma legal, seguindo a ordem de sucessão disposta no código civil.

Ao considerarmos que todo patrimônio deve possuir um titular, conforme sua função social, podemos observar que as transferências em vida, como vendas ou doações, implicam na cessão da propriedade de um bem e na sucessão da titularidade. Portanto, podemos dizer que a sucessão pode ocorrer tanto em transações comerciais em vida, quando um bem é transferido de uma pessoa para outra, quanto após a morte, quando o patrimônio de alguém é transferido para seus herdeiros

Desta forma, o direito de sucessão -, direito sucessório, visa garantir a preservação do patrimônio do falecido e a continuidade das relações jurídicas por ele estabelecidas. Além disso, a sucessão é um instrumento fundamental para a proteção dos interesses dos herdeiros e para a resolução de questões patrimoniais decorrentes do falecimento de uma pessoa.

Direito sucessório do embrião

Assim, levando em conta os direitos sucessórios discutidos, a Constituição garante os direitos fundamentais da herança, e proíbe a desigualdade de direitos e qualificações dos filhos de qualquer natureza, proibindo distinção entre eles. Tornando presuntivo o fato que os nascituros e os filhos já concebidos poderão participar da sucessão.

Dessa forma, presume-se que diante dos deveres constitucionais, o embrião fecundado artificialmente durante o casamento de maneira consentida é presumidamente filho daqueles que contribuíram com o material genético. Como denominado pelo Código Civil:

Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

[…]

III – havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;

IV – havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homologa;

No entanto, com a criação do embrião excedentário, existe a possibilidade de gerar a prole após a morte do pai, ainda que para dar andamento na gravidez assistida é necessário o consentimento expresso de forma escrita. Nesse sentido, é questionado em que momento se teria a presunção de paternidade (XAVIER, 2018), já que até então não existe legislação que regulamente as técnicas de reprodução assistida.

Estudiosos do assunto, como André Ulisses Nunes Leite, argumentam que, nessa ocasião, deve-se preservar o princípio do melhor interesse da criança, priorizando especialmente sua formação social, moral e psíquica. Assim, para salvaguardar a dignidade do nascituro, seus direitos como filho não devem ser restringidos.

Portanto, é argumentado que, quando existe a autorização expressa do cônjuge que forneceu o sêmen permitindo que a fecundação seja realizada após a sua morte, é viável que essa seja realizada. E, que que exista a presunção de paternidade, e por fim o direito sucessório.

Por outro lado, no Recurso Especial n° 1.918.421-SP (2021/002451-6), o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão apresentou em seu voto a argumentação de que na ausência de contrato explicito que permita a implantação do material biológico do falecido em sua companheira, esse não deve ser feito. Evitando que o princípio da autonomia da vontade do morto seja ferido.

Várias questões que compreendam o direito sucessório do embrião congelado permanecerão em aberto até que uma legislação que coordene de maneira efetiva e desambiguada seja criada. Por hora, existem apenas percepções, jurisprudências e doutrinas que guiem sobre o assunto; em sua maioria se inclinando para a percepção de que a criança nascida da reprodução assistida após a morte do pai só terá direito de sucessão com autorização explicita, caso contrário não é uma gravidez legitima. No entanto, quando a gestação é realizada com ambos os genitores em vida, não é legitima descriminação, sendo o filho digno de herança.

 

Referencias

____________________

1. XAVIER, DÉBORA REGINA DE SOUZA. DIREITO SUCESSÓRIO DOS EMBRIÕES EXCEDENTÁRIOS. Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) UniCEUB), Brasília, 2018. Disponível em: link. Acesso em: 11 mar. 2024. p.8.

DIAS, Maria Berenice Dias. Manual de direito das famílias de acordo com o novo CPC. 11. ed. rev. atual. e ampl., São Paulo: R T, 2016, pp. 396-397.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil: direito das sucessões. Vol. 7. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. (Ebook). Acesso em: 17 mar. 2024.

LUZ, Valdemar P. da. Manual de direito de família. Barueri, SP: Manole, 2009.

MIRANDA, P. de. Tratado de Direito Privado, Parte Geral, tomo I, Rio de Janeiro/RJ, Editora Borsoi, 1954, p.154.

XAVIER, DÉBORA REGINA DE SOUZA. DIREITO SUCESSÓRIO DOS EMBRIÕES EXCEDENTÁRIOS. Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) UniCEUB), Brasília, 2018. Disponível em: link. Acesso em: 11 mar. 2024.

Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: link. Acesso em: 17 mar. 2024.

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