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Direitos fundamentais do cidadão e sociais do trabalhador

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A Constituição Federal do Brasil trata do trabalho como um dos princípios gerais da atividade econômica, declarando como tais, a valorização do trabalho humano e da livre iniciativa (art. 170) e a busca do pleno emprego (art. 170, VIII).

No artigo 5º, XIII da CF está previsto, entre os direitos e garantias fundamentais, o direito ao livre exercício do trabalho, ofício e profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.

O artigo 1º da Constituição Federal, por sua vez, declara que a República tem como fundamentos a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana e o pluralismo político.

A dignidade é um valor presente em várias regras de direito. A proibição de toda ofensa à dignidade da pessoa é uma questão de respeito ao ser humano, o que leva o direito positivo a protegê-la, a garanti-la e a vetar atos que podem de algum modo levar à sua violação, inclusive na esfera dos direitos sociais.

O artigo 5º, X da Constituição Federal determina que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, ou seja, elementos inerentes a dignidade da pessoa humana.

O Il. Jurista Amauri Mascaro do Nascimento,1 conclui que:

“(…) como afirmam Ghestion, Goubeaux, Fabre-Magnan, em Introductión génerale de droit (1994), se o direito orienta a atividade humana em função de uma ética inspirada na procura da justiça, esta ética, como concluiu Rettere, poderá encontrar suas raízes profundas no conceito de dignidade (….)”

No direito do trabalho há algumas presunções jurídicas destinadas a proteger o empregado e a reduzir as dificuldades de ônus de prova, no intuito de garantir a dignidade do trabalhador.

Portanto os contratos individuais de trabalho estão permeados pelo princípio da valorização deste princípio.

Por óbvio há alguns contratos que não se preocupam com essa questão, submetendo o empregado as condições que ferem não apenas a dignidade, mas também a sua saúde física e mental e, especialmente nesses casos, cabe a Justiça do Trabalho, através de suas decisões reparar o dano causado ao empregado.

Nesse contexto ao analisar a expressão “cidadania do trabalho” não se pode vislumbrar apenas os direitos e os deveres do cidadão. Na prática, o fenômeno da cidadania já é a manifestação clara de que os indivíduos, assim considerados cidadãos e cidadãs, acessam de alguma maneira tais direitos fundamentais para a vida digna em sociedade.

O que se espera, no entanto, é que homens e mulheres encontrem ou descubram novos significados para o conceito de cidadania   partir da realidade sentida e vivida. Esta busca permanente deverá ser permeada pela consciência de que cada realidade deve ser interpretada e compreendida a partir de referenciais específicos, que não se encontram “democraticamente dispostos” em manuais e livros.

Tais referenciais sempre dependerão dos fatores que constituem a realidade de cada contexto humano e social. E, por esta razão, não será pelo caminho da reprodução de valores e ideologias alheias, mas sim pela autonomia do povo e ação política consciente da população em geral, que novos significados para o termo cidadania, serão construídos.

Outro importante reduto da cidadania é o trabalho. Isto porque o trabalho ocupa posição destacada na vida das pessoas, para obtenção de sustento.

Os interesses decorrentes das relações de trabalho estão na pauta das nossas mais substanciais reivindicações humanas. O trabalho deve ser oportunidade de crescimento da pessoa e não de esmagamento da personalidade.

A cidadania do trabalhador deve ser interpretada como o direito que todo trabalhador tem de reivindicar seus direitos

No que se refere ao direito social, prefiro me guiar e citar a concepção social de proteção o direito social do Ilustre Cesario Júnior,2 o qual afirma que:

“(…)em última análise, o sistema legal de proteção do economicamente mais fraco (hipossuficiente) é claro que, em caso de dúvida, a interpretação deve ser sempre a favor do economicamente fraco, que o empregado, se em litígio com o empregador”.

Portanto, assim como o legislador produziu norma em caráter de proteção deve o intérprete aplicá-las na mesma sintonia da sua elaboração, sendo importante que, embora, o  Direito do Trabalho não possua métodos próprios de interpretação, introduz e aprofunde no direito positivo a ideia de solidariedade social.

Entretanto, a aplicação de tal regra suscita algumas dificuldades, haja vista não ser possível a sua aplicação de forma generalizada e incontida. Para que seja possível a aplicação do” in dubio pro” operário, torna-se necessária a observância de certas condições.

Em sua obra, Plá Rodriguez faz expressa menção aos ensinamentos de Deveali, no sentido da existência de duas condições para a aplicação da regra in dubio pro operario, a saber: a) somente quando exista dúvida sobre o alcance da norma legal; e b) sempre que não esteja em desacordo com a vontade do legislador.3

Neste sentido, não pode o intérprete estabelecer interpretação extensiva onde essa não é cabível, nem pode procurar interpretações que fujam da sistemática da norma, já que somente poderá ser aplicada a regra in dubio pro operário, quando efetivamente existir uma dúvida acerca do alcance da norma legal e, ainda assim, sempre em consonância com a mens legislatoris.

Ao menos de forma absoluta, não se pode afirmar que o empregado sempre será a parte hipossuficiente da relação jurídica, eis que, em certos casos, o empregador poderá ser tão, ou mais, frágil que o próprio empregado.

Neste sentido, exemplificando, Francisco Meton Marques de Lima menciona caso concreto ocorrido na Vara do Trabalho de Quixadá (CE), conforme ora se aduz:

“(…)Diante do pretório, o empregado e o patrão, ambos com sintoma de infinita pobreza; o primeiro reclama soma elevada de diferença salarial, 13º, férias, horas extras, salário-família, indenização de antiguidade, anotações de CTPS; o reclamado não sabe sequer se manifestar em contestação, limita-se a dizer que não tem condição financeira para pagar qualquer indenização, mesmo com prejuízo do sustento próprio e da família (claro que expresso em linguagem coloquial); o Juiz-Presidente propõe a conciliação e para a surpresa de todos, o reclamado oferece a bodega ao reclamante na condição de este o empregar com carteira assinada e salário-mínimo. O reclamante rejeitou a proposta, dizendo que a bodega (contra a qual reclamava) não suportava tal encargo.(…)”

Neste caso, não se pode afirmar de forma absoluta que o empregado seja a parte hipossuficiente da relação jurídica, razão pela qual, em determinadas situações, a aplicação do princípio deve ser mitigada, tendo em vista o fato de que a hipossuficiência é recíproca.

Também, há de se mencionar que existe grande divergência doutrinária acerca da possibilidade de aplicação da regra do in dubio pro operario no âmbito processual, sobretudo em se tratando de matéria probatória.

Com a finalidade de justificar a adoção do referido princípio, inclusive em matéria probatória, Cesarino Júnior afirma que:

“(…)Na dúvida, isto é, quando militam razões pró e contra, é razoável decidir a favor do economicamente fraco, num litígio que visa, não satisfazer ambições, mas a prover às necessidades imediatas da vida. Isto é humano, isto atende ao interesse social, ao bem comum. Nada tem de ousado, ou de classista. Classista seria sempre decidir a favor do empregado, com dúvidas ou sem dúvidas, com a lei, sem a lei ou contra a lei /…/ assim, o elemento ético-social, concretizado na tutela razoável do trabalhador, contribui para uma solução humana e justa.(…)”

Portanto, é viável a tese do direito social como setor do direito de proteção hipossuficiente, entretanto, há que se observar quem é efetivamente o hipossuficiente na relação.

 

Referências

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1. NASCIMENTO, AMAURI MASCARO. CURSO DO DIREITO DO TRABALHO. 24.ed.SÃO PAULO:Saraiva, 2009. f.410.

2. CESARINO JÚNIOR, A.F. Direito processual do trabalho. apud BATALHA, Wilson de Souza Campos. Tratado de direito judiciário do trabalho. São Paulo: LTr, 1977. p. 533.

3. GOMES, Dinaura Godinho Pimentel. Direito do Trabalho e dignidade da pessoa humana, no contexto da globalização econômica. São Paulo:LTr, 2005.

 

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