UM PANORAMA GERAL SOBRE AS FAKE NEWS
As fake news tornaram-se especialmente conhecidas a partir das eleições norte-americanas de 2016, na ocasião os então candidatos à presidencia Donald John Trump e Hillary Diane Rodham Clinton sofreram com a disseminação de notícias desinformativas ou falsas a seu respeito.1
Desde então as fake news se inseriram no cotidiano de todas as pessoas em maior ou menor grau e, passaram a impactar de modo significativo a vida de toda a sociedade. Fossem fake news sobre vacinas, política, famosos, ou quaisquer outros temas de interesse, verificou-se a existência de inúmeras notícias desinformativas sobre os mais diversos tópicos.
As Fake News, enquanto inverdades disseminadas pela Internet, são um fenômeno da contemporaneidade, contudo, se analisada a questão medular do que se compreende por Fake News, tem-se que são um fenômeno intrinsecamente relacionado às “mentiras”, que em função da característica transfronteiriça da Internet se apresentam sob uma nova roupagem.2
No cenário brasileiro as fake news também não são uma novidade, em verdade o tópico já foi muito mais debatido, especialmente nas eleições de 2018 e 2020, nas quais foi possível observar a massiva utilização de notícias desinformativas para a promoção de determinados candidatos políticos e a depreciação da reputação de outros candidatos.
Verifica-se que as notícias desinformativas possuem a capacidade de alterar a percepção pública sobre determinado assunto, todavia há de se ressaltar que essa não é uma verdade absoluta. Isso pois a referida capacidade de alterar a percepção de determinadas pessoas sobre um assunto delimitado por meio de uma fake news somente pode ser observado de modo inequívoco nas hipóteses em que a pessoa já possuía previamente uma opinião similar, o que se denomina como viés de confirmação.
O viés de confirmação possibilita a consolidação da pós-verdade, a qual se estrutura sobretudo nas emoções dos indivíduos e em suas crenças pretéritas, de modo que os fatos objetivos sobre determinado assunto possuem menor influência na percepção sobre o que é verdadeiro ou falso para determinada pessoa.
As fake news, sobretudo, quando constituem a pós-verdade, por vezes prevalecem sobre as notícias verdadeiras. Assim, aquelas representam um risco, na medida em que são desinforativas aos indivíduos e, consequentemente, podem gerar danos tanto à esfera pessoal quanto à esfera social, ocasionando o que se denomina desordem informacional.3
A referida desordem informacional consolida no mundo uma nova era de (des)informação, na qual a velocidade de propagação de informações, aliada a inversão do polo comunicacional e o enviesamento midiático permitiram a eclosão de notícias desinformativas em suas mais diversas modalidades.
FAKE NEWS E ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS 2022
Informação é poder, por esse motivo nem sempre se quer informar fidedignamente, sendo que nessa perspectiva se apresenta o fenômeno das Fake News, que evidencia disseminação de notícias sabidamente inverídicas com objetivo de desinformar ou obter vantagem política ou econômica.4
No que se referem as fake news de cunho político verifica-se sua massiva utilização nos últimos anos, sobretudo, por intermédio das redes sociais e das plataformas de comunicação. Todavia mesmo os veículos de mídia tradicionais não são isentos da disseminação de notícias desinformativas, notadamente nas modalidades de falsa conexão ou de falso contexto.5
No complexo cenário político brasileiro, sobretudo em um período eleitoral acirrado e inflamado pelas paixões político-partidárias e pela intensa animosidade a determinados candidatos do espectro político de esquerda ou de direita é comum que se verifiquem notícias desinformativas acerca de tais personalidades.
Em relação a corrida presidencial no Brasil, diariamente exsurgem na internet múltiplas fake news a respeito dos candidatos Jair Messias Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva, seja pela retirada de uma fala de contexto, atribuição de uma fala nunca exprimida, ou diversas outras condutas desinformativas que possuem, tão somente, o condão de “manchar a imagem e reputação” dos referidos políticos.
Segundo se verifica, tais conteúdos desinformativos são massivamente compartilhados por blogs, páginas do Instagram e mesmo canais do YouTube de influenciadores digitais, de modo que uma fake news que atingiria um número diminuto de pessoas passa a atingir um grande volume de pessoas. Complementarmente, indivíduos, candidatos ou não, com maior ligação a grupos políticos auxiliam na disseminação dessas (des)informações.
A título exemplificativo pode-se citar a criação de um site (ciro.tv) que se passava pelo site oficial do candidato à presidência Ciro Ferreira Gomes (cirotv.com.br) e instigava os usuários a não votarem no candidato “Não vote em Ciro pelo bem do Brasil” com o claro inteito de não dividir os votos do espectro político da esquerda e aglomerar mais votos no candidato Luiz Inácio Lula da Silva.6
Pode-se também citar a fake news compartilhada pelo Senador Flávio Nantes Bolsonaro que reproduziu por meio de sus mídias sociais um trecho cortado de uma fala do candidato Luiz Inácio Lula da Silva que dá a entender que o candidato possui ligações com o demônio. O Senador compartilhou o vídeo cortado com a mensagem “envie esse vídeo a sua liderança religiosa e pergunte o que ela pensa disso. A guerra é também espiritual”, com o intento de afastar eleitores religiosos do candidato Luiz Inácio Lula da Silva e, reflexamente, atrair votos para o pai do Senador, o candidato Jair Messias Bolsonaro, o qual se apresenta como o candidato com maiores conexões aos grupos religiosos de evangélicos do Brasil.7
É possível ainda, citar o caso no qual a campanha do candidato Luiz Inácio Lula da Silva criou um site (verdadenarede.com.br) com o suposto intento de rebater fake news contra o referido candidato, todavia, em verdade, o site se passava por um site de checagem de fatos e não possuía informações claras aos leitores de que o site era ligado a campanha política do candidato.8
Como se verifica nos casos disponibilizados acima, a disseminação de fake news há muito deixou de ser algo esporádico e estranho a realidade das pessoas e se converteu em uma constante diária na vida de todas as pessoas. A profusão de fake news pode causar danos diversos aos sujeitos a quem se referem a depender da natureza das (des)informações a que se referem, podendo, inclusive implicar em danos materiais, morais ou sociais.
Há de se ressaltar que a conduta de compartilhar fake news não configura a prática de nenhum crime no Brasil, sendo compreendida pela doutrina como uma modalidade de exercício abusivo do direito à liberdade de expressão.9 Podendo, eventualmente configurar alguma das espécies de crime contra a honra (calúnia, injúria e difamação), ou mesmo a hipótese de responsabilização civil.
No Brasil e em todo o mundo ainda há muito a se debater a respeitos da fake news, especialmente em relação a seu tratamento e suas implicações na sociedade. Apesar de não ser um fenômeno moderno, o grau de sua utilização aumentou de modo significativo nos últimos anos, de modo que se faz necessário analisar as fake news sob a ótica de diversos ramos do conhecimento a fim de se encontrar o melhor caminho para a redução da massiva disseminação de fake news por meio da internet.
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Clayton Douglas Pereira Guimarães
Glayder Daywerth Pereira Guimarães
Referências
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1. GUIMARÃES, Glayder Daywerth Pereira; SILVA, Michael César. Fake news à luz da responsabilidade civil digital: o surgimento de um novo dano social. Revista Jurídica da FA7, v. 16, n. 2, p. 99-114, 2019. Disponível em: https://bit.ly/3xtMyea. Acesso em: 16 set. 2022.
2. COSTA, Bruno Fabrício da; GUIMARÃES, Glayder Daywerth Pereira; SILVA, Michael César. Tutela da honra e disseminação de fake news na nova sociedade digital. In: COSTA, Fabrício Veiga; GOMES, Magno Federici; FREITAS, Sérgio Henriques Zandona (coords.). Direitos plurais e inclusivos na sociedade democrática. Porto Alegre: Editora Fi, 2020, p. 560 – 584.
3. GUIMARÃES, Clayton Douglas Pereira; SILVA, Michael César. Repercussões do exercício da liberdade de expressão e da disseminação de fake news no contexto da sociedade da informação. In: EHRHARDT JÚNIOR, Marcos; LOBO, Fabíola Albuquerque; ANDRADE, Gustavo (Coords.). Liberdade de expressão e relações privadas. Belo Horizonte: Fórum, 2021, p. 201-216.
4. GUIMARÃES, Clayton Douglas Pereira; SILVA, Michael César. Repercussões do exercício da liberdade de expressão e da disseminação de Fake News no contexto da sociedade da informação. Fórum. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3j5cZiw. Acesso em: 01 ago. 2021.
5. A respeito das modalidades de notícias desinformativas recomenda-se a leitura de: ALONSO-BARTOLOME, Santiago; SEGURA-BEDMAR, Isabel. Multimodal Fake News Detection. ArXiv Computer Science Cornell University. Disponível em: https://bit.ly/3SySvyT. Acesso em: 22 set. 2022.
6. TSE manda remover site que usava nome de Ciro contra ele. Poder360. 2022. Disponível em: https://bit.ly/3SqDXB2. Acesso em: 22 set. 2022.
7. VITAL, Danilo. TSE avalia se fake news que liga Lula ao demônio deve ser punição exemplar. Conjur. 2022. Disponível em: https://bit.ly/3C8yR7u. Acesso em: 22 set. 2022.
8. MUNIZ, Mariana. Ministra do TSE manda tirar do ar site criado pela campanha de Lula para rebater fake news contra petista. O Globo. 2022. Disponível em: http://glo.bo/3UGpxPw. Acesso em: 22 set. 2022.
9. GUIMARÃES, Clayton Douglas Pereira; SILVA, Michael César. Repercussões do exercício da liberdade de expressão e da disseminação de fake news no contexto da sociedade da informação. In: EHRHARDT JÚNIOR, Marcos; LOBO, Fabíola Albuquerque; ANDRADE, Gustavo (Coords.). Liberdade de expressão e relações privadas. Belo Horizonte: Fórum, 2021, p. 201-216.