Governança: onde o ESG e o compliance se encontram

Governança: onde o ESG e o compliance se encontram

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Todos os eixos do ESG convergem em novas e melhores formas de administração das empresas. A base ambiental, que demanda que as empresa respeitem mais a natureza e o planeta, incluindo em suas atividades, práticas de sustentabilidade. O eixo social, é que as companhias percebam o papel social que devem exercer, e os cumpram.

Porém, do ponto de vista empresarial, a essência do ESG acaba por convergir na governança, ou melhor, na governança empresarial. Para Ramos e Martinez1 a governança corporativa são as práticas e os relacionamentos com todas as partes interessadas no sucesso da empresa, sejam elas internas ou externas, acionistas, sócios, empregados e outros.

Célia Lima Negrão2 vai estender a governança corporativa, tratando-a como um conjunto de atitudes, em praticamente todos os setores das empresas: administração e gestão de pessoas; estoque e inventário; contabilidade, com foco nos princípios de prestação de contas, transparência, equidade, responsabilidade corporativa, e; o comprometimento com o cumprimento da legislação, ou seja, o compliance.

A governança corporativa pode ser encarada como a profissionalização da gestão empresarial. No Brasil testemunham-se várias vezes negócios muito promissores, iniciados por profissionais competentes, porém, sem nenhum tipo de conhecimento técnico acerca de administração.

Isso é muito comum em escritórios de advocacia, inclusive, em que advogados de muito renome, assumem conjuntamente a função de administrador da empresa jurídica, carente do devido preparo, se recusando a contratar profissional da área, geralmente pela contenção de custos, ou em razão do próprio ego.

A governança corporativa é uma forma de trazer uma técnica mais acurada para a administração da empresa. Trata-se de uma evolução de uma administração atécnica ou familiar, para uma administração mais comprometida com a verdadeira eficiência e lucratividade da empresa.

Então, os negócios serão obrigados a implementar estruturas verticais e horizontais de gestão, para unificar, padronizar e tornar mais confiável a atividade empresarial. Para Ramos e Martinez,3 a governança corporativa possui algumas premissas básicas: i) regras de proteção de investidores, minimizando o risco a danos a acionistas majoritários; ii) criação de Conselho de Administração; iii) a instituição de comitês para assuntos específicos, a fim de assessorar os órgãos decisórios da companhia; iv) auditoria independente.

Percebe-se, portanto, que as estruturas necessárias para atender os princípios e premissas da governança, não são de simples instalação. Inicialmente, algumas constatações básicas: governança corporativa não é o mesmo que compliance, o último auxilia o primeiro, ao mesmo tempo em que passa a constituir uma estrutura própria de prevenção a ilícitos.

A governança corporativa é um instrumento voltado para gestão da empresa, mais específico para decisões comerciais e o dia-a-dia empresarial. O compliance não influencia no planejamento estratégico da companhia, somente assegura que as posições tomadas para o futuro da empresa, não violem nenhum tipo de legislação.

Reputa-se necessária essa constatação, pois há quem defenda que o compliance seja um instrumento de planejamento estratégico do negócio. Porém, a atividade empresarial deve ser marcada por ousadia e coragem, e prevenção, muitas vezes, não combina com essas características.

Algumas empresas já adotaram departamentos cuja única atribuição é apontar defeitos em possíveis novos negócios. Contudo, esses departamentos não foram muito bem-sucedidos, exatamente por isso; ou seja: acabam por desanimar e desestimular a ousadia do empresário.

Voltando, mais especificamente, à governança corporativa, é importante se observar que os instrumentos necessários para uma boa governança, são extremamente complexos, e nem todos possuem a mesma utilidade, em todas as empresas.

As práticas de boa-governança corporativa aplicam-se a qualquer negócio. Contudo, obviamente, que o mercadinho do bairro não precisa adotar a governança empresarial propriamente dita, mas, talvez, organizar melhor a empresa, padronizar procedimentos, entre outras medidas, para que o negócio flua melhor.

A governança corporativa se aplica, na realidade, a empresas de porte médio, que estão ascendendo, e empresas de grande ou de porte gigante (multinacionais, que operam em mais de uma Bolsa de Valores).

As empresas em ascensão devem atentar para a governança corporativa, para adequar suas práticas às melhores orientações das instituições de regulação do mercado, em especial, a Bolsa de Valores. Esse é um dos casos mais difíceis, visto que no Brasil, de herança patrimonialista, muitas empresas em ascensão possuem um modelo familiar de gestão, e a governança corporativa não combina com laços afetivos.

Por isso, que se trata de um amadurecimento da empresa, para atrair investidores e desbravar mais longe a atividade comercial. A adoção de práticas de boa-governança manda um recado para o mercado: que a empresa está pronta para colocar os interesses dos acionistas, acima de qualquer outro, sem violar nenhum tipo de legislação ou regra de compliance.

As multinacionais, gigantes no mercado, surgiram antes do conceito de ESG, então essas também passaram por um processo de adaptação, porque a boa-governança demanda uma estrutura muito pesada, que não se constrói rapidamente.

Como exemplos de estruturas de governança corporativa, pode ser incluído: a adoção de um código de ética e conduta; planos de cargos e salários; regras para remuneração de acionistas, diretores, conselheiros, presidentes entre outro cargos; regras claras para vendas de ações, preferenciais ou ordinárias; a implementação de auditoria periódica, tanto interna, quanto externa e independente; a criação de comitês, para matérias específicas, em auxílio a administração da empresa; organização do departamento pessoal, para a redução de passivos trabalhistas; a implementação de um programa de compliance.

Importante rememorar que os exemplos acima não são de aplicação automática. A própria Bovespa reconhece isso, tendo em vista que é impossível de se exigir de uma empresa, que recém realizou um IPO e está tentando se posicionar no mercado, o mesmo rigor a ser aplicado a uma Coca-Cola Company ou Ford Motor Company, duas tradicionais gigantes do mercado, que moldaram a economia mundial.

Por essa razão, a Bovespa criou níveis de exigência de governança corporativa, com diferentes rigores, para atender empresas de segmentos e perfis diversos.4 A segmentação conta com cinco níveis de exigências.

Há o Bovespa Mais e o Bovespa Mais Nível 2, que são um conjunto de exigências para empresas que estejam tentando ingressar no mercado de ações. Dessa forma, a empresa que queira ir rumo a um IPO, não precisa dispender um volume grande de despesas, implementando em um só momento todas as práticas de boa-governança. A empresa começa o processo de governança lentamente, antes mesmo do IPO, tendo até sete anos para a finalização do processo.

Agora, há também o Nível 1 e o Nível 2, sendo que o primeiro, é mais voltado para que a companhia, já estabelecida na Bovespa, seja mais transparente com seus demonstrativos financeiros, e passe mais segurança ao mercado. O Nível 2 já se aproxima ao nível mais alto, começando a exigir que a empresa tenha instrumentos para proteger os interesses dos acionistas.

Por fim, existe, desde 2000, o nível Bovespa Novo Mercado, que é o mais alto padrão de boa-governança exigido pela Bolsa de Valores de São Paulo. Os requisitos são vários, tais como: o capital da empresa deve ser composto exclusivamente por ações ordinárias com direito a voto; a criação do tag along, que é a possibilidade de os acionistas minoritários venderem suas ações, pelo mesmo preço dos acionistas majoritários, em caso de alienação do controle da companhia; estruturação e divulgação de processo de avaliação do conselho de administração, de seus comitês e da diretoria; estruturação e divulgação de processo de avaliação do conselho de administração, de seus comitês e da diretoria; elaboração e divulgação de políticas de (i) remuneração; (ii) indicação de membros do conselho de administração, seus comitês de assessoramento e diretoria estatutária; (iii) gerenciamento de riscos; (iv) transação com partes relacionadas; e (v) negociação de valores mobiliários, com conteúdo mínimo (exceto para a política de remuneração); divulgação simultânea, em inglês e português, de fatos relevantes, informações sobre proventos e press releases de resultados; divulgação mensal das negociações com valores mobiliários de emissão da empresa pelos e acionistas controladores.5

Então, percebe-se um foco muito grande na transparência com o mercado. Ademais, deixa-se um destaque que o nível Bovespa Novo Mercado, é o único que obriga à existência de um departamento de compliance devidamente estruturado. Nos demais segmentos, essa demanda é considerada facultativa.

Portanto, embora instrumentos complexos de governança corporativa sejam sempre saudáveis à atividade empresarial, é importante observar bem as regras do mercado, a fim de avaliar a real imprescindibilidade de cada ferramenta.

Assim sendo, é visível que o compliance o ESG, se encontram exatamente no quesito governança, onde a existência de um Programa de Integridade pode ser uma exigência expressa do órgão regulador do mercado. Essas regras da Bovespa se estendem pelo mundo todo, sendo prudente dizer que qualquer Bolsa de Valores no mundo adotará obrigações iguais, ou mais rígidas, que o mercado de ações brasileiro.

 

Referências

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1. MARTINS RAMOS, Gizele. LOPO MARTINEZ, Antonio. Governança corporativa. In. Revista Contemporânea de Contabilidade, vol. 3, núm. 6, jul-dez., 2006.pp. 143-164. UFSC, Florianópolis/SC. Disponível em: https://bit.ly/3GmA8Zj. Acesso em: 24 dez. 2022.

2. NEGRÃO, Célia Regina P. Lima. Compliance, controles internos e riscos: a importância de gestão de pessoas. Brasília: Editora SENAC/DF, 2014.

3. MARTINS RAMOS, Gizele. LOPO MARTINEZ, Antonio. Governança corporativa. In. Revista Contemporânea de Contabilidade, vol. 3, núm. 6, jul-dez., 2006.pp. 143-164. UFSC, Florianópolis/SC. Disponível em: https://bit.ly/3GmA8Zj. Acesso em: 24 dez. 2022.

4. https://bit.ly/3jVkjBo

5. https://bit.ly/3io0HoY

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