O Acesso à Justiça como uma questão a ser refletida na contemporaneidade

O Acesso à Justiça como uma questão a ser refletida na contemporaneidade

estátua justiça

Não faz muito tempo, escrevi um texto para essa coluna tratando sob o ponto de vista hermenêutico acerca do que permite-se compreender como justiça. Para falar sobre referido conceito, situei a discussão dentro do que Platão expõe em uma das suas mais célebres obras de nome A República.

Transpondo o círculo das disposições jurídicas e dos entendimentos jurisprudenciais tentei elevar tal conceito para além de um discurso mítico, esvaziado de sentido prático.

Destaquei que a justiça, deve ser compreendida enquanto conceito de aplicação prática, que não se restringe ao exercício do poder judiciário. Trouxe então, uma perspectiva ética atrelada a organização e a postura dos indivíduos dentro do contexto social.

Atento a essa ideia, resolvi refletir no texto de hoje, de que forma se dá o acesso à justiça, e se esse de fato atende aos anseios de um Estado que se compreende como Democrático de Direito.

Ao contrário de uma perspectiva ética, intrínseca a postura de cada indivíduo perante a sociedade e aos acordos que celebram com os seus pares, o acesso à justiça, não apenas para o senso comum, mas também para a grande maioria da comunidade jurídica ainda se materializa por intermédio do poder judiciário.

Mesmo diante do abarrotamento de causas e da demora no julgamento de uma centena de processos, a demanda pela autoridade judiciária não se recolhe ao que é essencialmente complexo, e ao que de fato consiste em um problema a ser dirimido pelo Estado.

O Estado, mesmo ciente disso, ao invés de atacar a lógica do litígio pelo litígio, busca cada vez mais subterfúgios, dentre eles a inteligência artificial, com vistas a atender de maneira mais célere uma absurda demanda, que muitas das vezes reflete uma má prestação dos serviços públicos, uma precariedade e antiguidade das disposições legais e a indiferença quanto a problemas sociais, que uma decisão judicial, a longo prazo não é capaz de resolver.

Atento a esse cenário, em que a regra é o Poder Judiciário como meio de resolver conflitos, a ideia de um sistema multiportas vem cada vez mais ganhando espaço.

Na busca de outras alternativas, que não a figura de um terceiro totalmente alheio e imparcial as questões que lhe chegam, métodos de resolução de conflitos outros, como a conciliação, a mediação, a arbitragem, e as chamadas práticas colaborativas, vem, ainda que de forma incipiente, se colocando como meio de acessar a justiça.

Mesmo guardando certa relação com a dinâmica do judiciário, como é o caso da mediação e da conciliação, essas já expressam não apenas um olhar moderno da legislação, vide o que preconiza o Código de Processo Civil em seu art. 3º, parágrafo 3º, mas também uma contraposição a uma lógica protecionista, tutelar do indivíduo, a fim de colocá-lo como dono do seu próprio destino, consciente das suas escolhas e das suas responsabilidades.

As chamadas práticas colaborativas, por sua vez, talvez seja a metodologia que melhor se aplica a essa pretensão de emancipação do indivíduo, haja vista trazer em seu bojo um olhar multidisciplinar capaz de dar vazão a problemas que em juízo ficariam contidos e sem qualquer possibilidade de resolução.

Tais práticas, as quais, permitem acolher as demandas tanto jurídicas e financeiras quanto emocionais, já a um certo tempo vem chamando minha atenção sobretudo ao levar em conta a ideia de uma justiça que se estabelece sobre bases éticas.

Preocupando-se não apenas com o agora, mas com as consequências do acordado no presente, tais práticas lançam luz a uma questão pouco explorada, seja pela doutrina, seja pela jurisprudência e mesmo pela comunidade jurídica como um todo.

Tal questão, atinente à consciência das possíveis repercussões negativas de um acordo ou de uma decisão judicial, é deixada de lado, sendo máxima cotidiana do acesso à justiça, uma resposta, muitas vezes sequer tecnicamente jurídica.

Nessa toada, e considerando os métodos aqui considerados, em especial as chamadas práticas colaborativas, rumar no caminho de uma resolução de conflitos que atenda não apenas o agora e o Direito, mas uma sedimentação das demandas individuais e coletivas dos indivíduos, talvez seja a melhor forma de se construir e conceber um verdadeiro acesso à justiça, capaz de assegurar além de direitos, qualidade financeira e principalmente emocional.

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