O controvertido caso da Vaquejada

O controvertido caso da Vaquejada

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Conforme prevê a lei nº 15.299/2013, editada pelo estado do Ceará, Vaquejada é um evento de natureza competitiva, no qual uma dupla de vaqueiro a cavalo persegue um animal bovino com o objetivo de dominá-lo. Os competidores, denominados vaqueiros ou peões de vaquejada, são julgados pela destreza e perícia ao dominarem o animal. A competição é realizada em espaço físico apropriado, numa arena com dimensões e formato que propicie segurança aos vaqueiros, animais e ao público em geral.1

Conforme a Associação Brasileira de Vaquejada (ABVAQ), iniciada em 1880 hoje a Vaquejada já é encarada como um grande negócio, responsável por trazer investimentos e movimentar a economia local. Os organizadores cobram ingressos e o público entende a proposta. Existem competidores profissionais remunerados, como o vaqueiro, reconhecido como atleta da pista. Há ainda um estilo musical específico inspirado no evento, o Forró da Vaquejada, conhecido por bandas como a famosa Mastruz com Leite.2

Nas regiões mais tradicionais todos os anos são recebidos milhares de visitantes, resultado são parques lotados, hotéis, restaurantes, lojas de artesanato e lembranças locais. Muito popular em alguns estados brasileiros, a Vaquejada foi regulamentada pela lei cearense como forma de organizar o evento e dar maior visibilidade às festas. Com fundamento no art. 215 da Constituição Federal brasileira de 1988, a celebração valoriza a difusão das manifestações culturais e garante o acesso à cultura para todos os participantes, além de também ser defendida como esporte equestre.3

Como nem tudo são flores, ou melhor, bois, o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a lei do estado do Ceará, com o intuito de coibir a prática. A alegação se ateve às denúncias de prática de açoites aos animais, realizados durante o enclausuramento, para instigar que entrem agitados na arena quando da abertura dos portões. Janot entendeu que a conduta compromete o bem estar dos animais e os submete a crueldade, bem jurídico protegido pelo art. 225, §1º, VII, da Constituição Federal brasileira de 1988.4

Julgado pelo Supremo Tribunal Federal em 06 de outubro de 2016, a decisão proferida diante da ADI 4.983 entendeu pela inconstitucionalidade da lei cearense, de maneira a acolher a pretensão do Procurador-Geral da República. Dessa maneira, no caso de conflito entre a norma constitucional que garante a cultura e a que protege os animais de crueldade, para a Suprema Corte brasileira deve prevalecer o respeito aos animais. Logo, proibida estaria a Vaquejada, assim deveria ter sido resolvida a questão.

Todavia, a discussão não parou por aí. Pouco mais de um mês depois, em 29 de novembro de 2016, o Congresso Nacional, auxiliado pelo então presidente Michel Temer e o ministro Alexandre de Moraes, editou a lei 13.364, com a seguinte determinação:

Reconhece o rodeio, a vaquejada e o laço, bem como as respectivas expressões artísticas e esportivas, como manifestações culturais nacionais; eleva essas atividades à condição de bens de natureza imaterial integrantes do patrimônio cultural brasileiro; e dispõe sobre as modalidades esportivas equestres tradicionais e sobre a proteção ao bem-estar animal.5 

O objetivo da lei foi o de regulamentar e reconhecer a prática da Vaquejada, do Rodeio e do Laço. Assim, mais do que fez a lei cearense (já declarada inconstitucional pelo Poder Judiciário), permitiu a prática em todo o território nacional. Essa foi uma das maiores tentativas de ultrapassar uma decisão judicial já ocorrida no Brasil.

Afinal, é ou não proibido o Laço, o Rodeio e a Vaquejada? Para o Supremo Tribunal Federal é proibido, para o Congresso Nacional é mais que permitido, muito valorizado. Em suma, os poderes que deveriam ser harmônicos entre si não o são.

Então, como fica a população, à mercê do poder público e das discussões políticas? O povo pode ou não ir a uma dessas festas? Respeitadas as bandeiras e as ideologias de cada um, quem for não cometerá ilícito (quem organizar também não), ou melhor, estará defendendo a cultura nacional. Quem não for também fará uma atitude louvável, não incentivará práticas cruéis em animais.

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Jordano Paiva Rogério

 

Referências

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1. CEARÁ. Lei 15.299/2013. Disponível em: https://bit.ly/3dgVWaw. Acesso em: 18 nov. 2021.

2. Associação Brasileira de Vaquejada. História da Vaquejada. 2021. Disponível em: https://bit.ly/31e565C. Acesso em: 21 nov. 2021.

3. PERNAMBUCO, Folha de. Vaquejada é regulamentada como esporte. Disponível em: https://bit.ly/31knj0P. Acesso em: 23 nov. 2021.

4. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1988.

5. BRASIL. Lei 13.364. Disponível em: https://bit.ly/3lvxjvk. Acesso em: 21 nov. 2021.

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