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O que acontece se o segurado falece no “meio” do processo administrativo ou judicial?

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Independente da área do Direito que estivermos estudando, várias são as consequências jurídicas provenientes do óbito da pessoa, e com o Direito Previdenciário não é diferente.

Mas você já pensou o que acontece quando o segurado falece no “meio” do processo administrativo ou judicial?

É exatamente o que venho apresentar neste breve artigo para vocês.

Indo direto ao ponto, a primeira coisa a ser feita no caso de morte do segurado que estava requerendo um benefício é a habilitação de seus sucessores no polo ativo da demanda, seja em processo administrativo ou judicial.

Após a habilitação, o requerimento de benefício continua normalmente até o fim.

Isto é, são realizados todos os trâmites da mesma maneira que aconteceria se o segurado ainda estivesse vivo.

Por exemplo, se for solicitado o cumprimento de exigências pelo INSS, serão os sucessores que terão que realizar este procedimento.

É lógico que não haverá o pagamento contínuo do benefício em caso de procedência do pedido, em conta da morte do autor do pedido.

Porém, os valores atrasados serão destinados aos herdeiros, sendo devidamente calculados até a data de morte do segurado.

Por exemplo: um segurado fez o requerimento administrativo de Aposentadoria por Idade no dia 04/03/2021 mas chega a falecer no dia 01/04/2021.

O valor devido aos herdeiros será referente a 28 dias de benefício (caso a aposentadoria seja concedida).

Mas você deve estar se perguntando: quem são, de fato, estes herdeiros que podem receber os valores atrasados?

A resposta vem da famosa Lei 8.213/1991, que dispõe expressamente sobre a habilitação dos sucessores de um benefício previdenciário:

Art. 112. O valor não recebido em vida pelo segurado só será pago aos seus dependentes habilitados à pensão por morte ou, na falta deles, aos seus sucessores na forma da lei civil, independentemente de inventário ou arrolamento.1 

Pela leitura do dispositivo, é evidente a existência de uma ordem preferencial na habilitação dos sucessores:

  1. Primeiro serão habilitados os dependentes do falecido que teriam direito à Pensão por Morte do segurado;
  2. Na falta de dependentes habilitados à Pensão, serão habilitados os sucessores legítimos de acordo com a lei

Ou seja, se há herdeiros já habilitados ao benefício de Pensão por Morte, somente a eles serão pagos os valores do benefício não recebidos em vida pelo falecido.

Nesse sentido, vale dizer que os dependentes que podem ser habilitados à Pensão por Morte se dividem em três classes:2

  1. Os cônjuges, os companheiros e também os filhos, de até 21 anos de idade, de qualquer condição ou os filhos, de qualquer idade, que sejam pessoas com deficiência ou possuam qualquer tipo invalidez;
  2. Os pais;
  3. Os irmãos, de até 21 anos de idade, de qualquer condição ou os irmãos, de qualquer idade, que sejam pessoas com deficiência ou possuam qualquer tipo de invalidez.

Porém, importante mencionar que existe uma ordem prioritária no recebimento da Pensão por Morte pelos dependentes destas classes, sendo ela consubstanciada na seguinte forma: 1 > 2 > 3.

De acordo com a Lei 8.213/1991, a existência de dependente em qualquer das classes citadas exclui o direito às prestações das classes seguintes.3

Isto é, se existirem dependentes na classe 1, as pessoas da classe 2 e 3 não terão direito à Pensão por Morte.

Agora, se não existirem dependentes na classe 1, mas nas classes 2 e 3, será somente a classe 2 os possíveis beneficiários da Pensão.

Somente na hipótese de não haver dependentes na classe 1 e 2 que a classe 3 prevalecerá.

Caso não existam dependentes a serem habilitados à Pensão por Morte do segurado falecido, serão utilizadas as disposições do Código de Processo Civil (CPC) e do Código Civil (CC) em relação à sucessão civil:

Código de Processo Civil

 Art. 687. A habilitação ocorre quando, por falecimento de qualquer das partes, os interessados houverem de suceder-lhe no processo.

Art. 688. A habilitação pode ser requerida:

I – pela parte, em relação aos sucessores do falecido; II – pelos sucessores do falecido, em relação à parte.

Art. 689. Proceder-se-á à habilitação nos autos do processo principal, na instância em que estiver, suspendendo-se, a partir de então, o processo [4].

Código Civil

 Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: (Vide Recurso Extraordinário nº 646.721) (Vide Recurso Extraordinário nº 878.694)

I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III – ao cônjuge sobrevivente;

IV – aos colaterais.5 

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é firme no entendimento da normativa legal sobre o tema:

PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. FALECIMENTO DO TITULAR DO DIREITO NO CURSO DA AÇÃO. HABILITAÇÃO PROCESSUAL DO BENEFICIÁRIO DE PENSÃO POR MORTE. DESNECESSIDADE DE INVENTÁRIO OU ARROLAMENTO DE BENS. AGRAVO INTERNO DA UNIÃO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Na hipótese dos autos, deu-se provimento ao Recurso Especial do Particular ao entendimento de que, ocorrendo o falecimento do autor no curso do processo, seus dependentes previdenciários podem habilitar-se para receber os valores devidos, possuindo preferência os dependentes habilitados à pensão por morte em relação aos demais sucessores do de cujus.

2. É firme a jurisprudência desta Corte Superior de que os dependentes previdenciários têm legitimidade processual para pleitear valores não recebidos em vida pelo de cujus, independentemente de inventário ou arrolamento de bens.

Precedentes: REsp. 1.650.339/RJ, Rel. Min. REGINA HELENA COSTA, DJe 12.11.2018; AgRg no REsp. 726.484/RJ, Rel. Min. ROGERIO SCHIETTI CRUZ, DJe

27.2.2014; AgRg no REsp. 1.260.414/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJe 26.3.2013.

3. Agravo Interno da UNIÃO a que se nega provimento. [6]

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. MORTE DO AUTOR NO CURSO DA AÇÃO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. DIREITO DOS HERDEIROS/SUCESSORES A RECEBER EVENTUAIS PARCELAS ATÉ A DATA DO ÓBITO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.

1. O entendimento desta Corte é no sentido de que, apesar do caráter personalíssimo dos benefícios previdenciários e assistenciais, os herdeiros têm o direito de receber eventuais parcelas que seriam devidas ao autor que falece no curso da ação. Precedentes: AgRg no REsp 1.260.414/CE, Rel. Min. Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe 26/3/2013; AgRg no Ag 1.387.980/PE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 28/5/2012; AgRg no REsp 1.197.447/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 2/2/2011.

2. Agravo interno não provido.7 

Deste modo, a atitude inicial do advogado previdenciário é entrar em contato com a família do segurado falecido para identificar os sucessores existentes: dependentes habilitados à Pensão por Morte ou, na falta destes, os sucessores civis.

Após isso, é necessário peticionar no processo administrativo ou judicial informando sobre o falecimento do segurado, anexando o atestado de óbito e a procuração outorgada pelos sucessores.

Apesar de ser uma situação extremamente dolorosa, os familiares devem ficar atentos a estes detalhes para continuar a tutela do direito do falecido, principalmente se o segurado realizava a manutenção do núcleo familiar.

 

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Ben-Hur Klaus Cuesta Duarte

 

Referências

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1.  BRASIL. Lei 8.213/1991. Disponível em: https://bit.ly/2Wi6q4G. Acesso em: 27 set. 2021.

2. Ver art. 16º da Lei 8.213/1991.

3. Ver § 1º do art. 16º da Lei 8.213/1991.

4. BRASIL. Lei 13.105/2015. Disponível em: https://bit.ly/3oepkVE. Acesso em: 27 set. 2021.

5. BRASIL. Lei 10.406/2002. Disponível em: https://bit.ly/2Wn2CiM. Acesso em 27 set. 2021.

6. STJ, AgInt no AREsp 820.207/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Turma, Julgamento: 14/10/2019, Publicação: 21/10/2019.

7. STJ, AgInt no REsp 1531347/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª Turma, Julgamento: 15/12/2016, Publicação: 03/02/2017.

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