O estágio durante o curso universitário é o caminho mais habitual trilhado pela maioria dos estudantes que pretende se formar e conquistar sua vaga no mercado de trabalho.
No entanto, é público e notório que nem todo concedente (aquele que fornece o estágio, vulgo”chefe”) realmente cumpre o requisito principal inerente a tal relação, ou seja, proporcionar atividades compatíveis ao curso que o estudante está frequentando, para que efetivamente agregue conhecimento em sua formação, fator essencial na relação de estágio.
No Brasil a Lei n.º 11788 de 2008 estabelece todos os direitos e diretrizes inerentes ao estágio, sendo que se aplica tanto para graduação como para pós graduação, sendo que o artigo 1º define o caráter educativo de tal relação:
Art. 1o Estágio é ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam frequentando o ensino regular em instituições de educação superior, de educação profissional, de ensino médio, da educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos.
1oO estágio faz parte do projeto pedagógico do curso, além de integrar o itinerário formativo do educando.
2oO estágio visa ao aprendizado de competências próprias da atividade profissional e à contextualização curricular, objetivando o desenvolvimento do educando para a vida cidadã e para o trabalho.1
O contrato de estágio deve ser estabelecido no máximo por 02 anos, com carga horária máxima de 04 a 06 horas diárias, dependendo do nível de formação educacional, e principalmente, que o estagiário realize atividades que irão agregar em sua carreira profissional.
Sabemos que no estágio além das tarefas vinculadas ao curso, o estagiário também aprende a se comportar em um ambiente corporativo, aprende a se submeter a hierarquia laboral, assim como a se comprometer com o trabalho e sua rotina.
Mas nesse contexto, levanto uma questão, um tanto quanto habitual. O concedente poderia pedir para que seu estagiário buscasse o seu terno na lavanderia? Poderia pedir para buscasse um cafezinho durante o horário de trabalho? Não, atividades que não tenham vinculação ao ambiente laboral e as práticas inerentes a profissão que está galgando não devem ser exigidas do estagiário.
A lei ainda prevê que o estagiário pode reduzir sua carga horário na metade nos dias de prova, sem que tenha que compensar tais horas posteriormente. Por exemplo, se o estágio é de 04 horas diárias, poderá reduzir para 02 horas, nos dias de prova, desde que forneça ao concedente (empresa ou local que forneceu o estágio) um cronograma com os dias e horários das provas.
O estagiário pode trabalhar aos sábados e domingos? Não há qualquer proibição na lei acima mencionada em relação a tais dias, exceto a necessidade de folga de um domingo por mês, entretanto, há uma carga horária máxima de 30 horas semanais. Portanto, caso haja necessidade real, de que o estágio ocorra aos finais de semana, o que é importante estar documentado, deve-se observar a carga horário semanal acima especificada.
O estagiário não deve fazer horas extras, devendo ser observada a carga prevista em lei, sob o risco de ser descaracterizado o contrato de estágio.
No período da pandemia em que houve o surgimento do estágio em home office, as diretrizes fixadas naquele período e ainda vigente, devendo ser respeitadas, como por exemplo a carga horária semanal e diária máxima, além da obrigatoriedade em fornecer ao estagiário todos os instrumentos, como computador, energia, por exemplo, para que aquele possa exercer suas atividades. Algumas empresas fornecem o “auxílio home office”, um valor pago para suprir o gasto com tais instrumentos necessários para o desenvolvimento do estágio.
Mas em relação as habilidades socioemocionais, o concedente pode orientar o estagiário? O estágio, conforme mencionado anteriormente, também tem como um dos requisitos orientar o estudante para que possa aprender a se comportar dentro do ambiente do trabalho, assim como diante de uma situação de pressão e de problemas a serem resolvidos, claro que dentro dos limites da urbanidade.
Aliás, importante deixar registrado, sendo que o óbvio também precisa ser dito atualmente, que o estagiário deve ser tratado com respeito, educação, não sendo visto como um funcionário multitarefas. O estágio é o primeiro contato que aquele estudante tem com o mercado de trabalho, um “chefe” mal intencionado, que desvirtua o real contexto desse período de ensinamentos, pode causar graves sequelas no estagiário, não apenas de ausência de aprendizado, mas de comportamento.
O ambiente de trabalho, nesse caso, o estágio, saudável, além de aumentar a produtividade, faz com o estagiário estabeleça um histórico laboral seguro e de confiança, o que irá refletir em sua conduta nos trabalhos posteriores.
Observa-se na definição transcrita no início desse texto, que o intuito do estágio não é apenas a formação profissional, mas também a educação para a vida cidadã.
E no caso de estagiário se formou, ele pode continuar nessa relação? Não, o correto é encerrar o contrato de estágio e fazer um novo contrato, seja de trabalho ou como prestador de serviços, por exemplo.
Aliás, no título desse artigo questiona-se se o estagiário tem direitos trabalhistas. Como a própria denominação já estabelece, tais direitos são inerentes aos trabalhadores, àqueles que possuem vínculo de emprego, e não aos estagiários.
Porém, nos casos em que o concedente descumprir as determinações contidas na Lei nº117788 de 2008, especialmente, no que se refere a exigência de horas extras, ausência de relatórios contendo o desenvolvimento educacional do estagiário, exigência de atividades que não tem qualquer relação com o curso do estudante, há o risco para o concedente de que tal contrato de estágio possa ser considerado como de trabalho, havendo o reconhecimento, perante a Justiça do Trabalho, do vínculo de emprego.
E, nesse caso, com tal reconhecimento o estagiário passa a ter direito a receber todos os direitos trabalhista, com décimo terceiro salário, aviso prévio, FGTS, dentre outros, inerentes ao empregado.
Portanto, ao exigir do estagiário além do que foi contratado, descumprindo a carga horária máxima, desrespeitando-o, exigindo que realize atividades de cunho pessoal para o concedente, este não afeta apenas o aprendizado e as condutas laborais futuras do estagiário, ele também poderá sofrer as penalidades da Justiça do Trabalho, com o reconhecimento do vínculo de emprego.
Destarte, os estagiários, as hipóteses acima descritas, também possuem direitos trabalhistas.
Referências
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