Pânico no mercado: “tarifaço”, suspensão do FCPA – O que sobra para o ESG e compliance

Pânico no mercado: “tarifaço”, suspensão do FCPA – O que sobra para o ESG e compliance

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A economia mundial vive um momento assustador. Os Estados Unidos da América deram uma verdadeira “invertida” no fluxo de recursos a nível mundial, e as maiores economias globais ainda estão tentando entender os próximos passos. Com efeito, Donald Trump está buscando reverter o processo de globalização a favor da economia Norte Americana, em uma aposta ousada contra o padrão de mercado mundial.

Todavia, diferentes de outras épocas, em que o mundo baixava a cabeça para imposições estadunidenses, como aconteceu várias vezes fase pós-Guerra Fria, muitos países não estão se mostrando dispostos a ceder. A China, por exemplo, não se assustou, devolveu todas as tarifas impostas pelos Estados Unidos, mostrando uma força inesperada. O Brasil, por sua vez, aprovou uma legislação de reciprocidade econômica, para ter um meio legal de revidar a imposição dessas tarifas1.

Importante, inicialmente, compreender o papel da “tarifa”, quando o assunto é importação e exportação. As tarifas são tributos que são pagos sobre um serviço específico, como por exemplo: a tarifa para o uso do coletivo urbano, em que o cidadão somente paga, se for usuário, se não utilizar não paga2. A mesma lógica serve para as tarifas de importação e exportação, somente é pago se houver o ato de trazer ou enviar um bem ou produto para o exterior.

Acontece que, diferentemente de uma tarifa de coletivo urbano, cujo uso pode ser evitado ao possuir um meio próprio de locomoção, ninguém está livre do consumo de um produto importado, seja um bem que é importado já finalizado e pronto para consumo, seja de algum item que faça parte do processo de produção de um produto, que é finalizado no Brasil.

Assim, as tarifas de importação e exportação, nomenclatura que não é mais adequada no Brasil, não cumprem um papel de gerar receita para um Estado Fiscal (um Estado que não tem autonomia financeira plena e deve buscar recursos junto aos cidadãos), mas uma função, preponderante, regulatória. Diante disso, o Imposto sobre Importações e o Imposto sobre Exportações são utilizados para criar uma compensação entre medidas protecionistas de mercado e o incentivo a trocas no comércio internacional.

Não se tem como dizer, de forma definitiva, qual é o melhor modelo de tarifa para importação e exportação. Por exemplo, facilitar a importação de itens de tecnologia, voltados a computadores, celulares e tablets, é fundamental para o Brasil, visto que esse tipo de produto é indispensável para o desenvolvimento econômico local. Como um país pode ficar sem tecnologia de ponta e tentar se desenvolver? Hoje, é impossível para uma nação criar uma tecnologia de comunicação do zero, essa etapa foi perdida pelo Brasil (por razões históricas, falta de organização política, enfim), e não tem como retornar ao passado e refazer.          Por outro lado, tarifas de importação muito baixas fragilizam o mercado interno, que talvez não seja competitivo o suficiente com produtos importados. É um equilíbrio difícil.

Donald Trump, em alguns momentos, parece uma criança brincando com uma lupa em um formigueiro, queimando algumas formigas de forma aleatória, apenas para diversão; em outros momentos, aparenta tentar levar uma guerra para a arena econômica, com interesses geopolíticos obscuros. Colocar a China como inimigo número um, parece uma tentativa de justificar um discurso hostil com o resto do mundo, mas que pode ricochetear e atrapalhar a própria economia dos Estados Unidos.

O governo Trump anunciou tarifas pesadas contra produtos importados da China; tarifas um pouco menos pesadas para produtos vindos da União Europeia; aliviou um pouco o Brasil, impondo tarifas mais leves para países menos desenvolvidos. O mercado mundial de ações entrou em pânico, Wall-Street derreteu, a BOVESPA registrou queda, a Bolsa de Hong Kong registrou a maior queda em três décadas3 (maior que da crise dos subprimes em 2007-2008).

Como a economia é uma ciência um tanto quanto especulativa, como qualquer ciência que lide com predições futuras, somente o tempo dirá se o “tarifaço” vai funcionar ou não. Protecionismo de mercado nunca se mostrou uma medida muito feliz para o desenvolvimento econômico, talvez seja uma chance de revisitar essa prática, ou um fracasso que pode levar a mais uma recessão econômica, que já estão se tornando regra nos últimos anos.

Mas o que tudo isso tem relação com ESG e compliance? Tudo e nada. Por um lado, as práticas de ESG e compliance devem ser mantidas nas empresas e Poder Público, visto que elas são prioridades e não deveriam ser afetadas por políticas econômicas globais. Porém, defende-se que tem total relação com o ESG e compliance, visto que o mundo não é dividido em fatias separadas e isoladas; a economia mundial é um sistema complexo e globalizado, e nenhuma prática de mercado pode ser vista de forma isolada.

Momentos de pânico e crise sempre são utilizados, para a revisão de certas legislações. Donald Trump já usou dessa ferramenta ao suspender o FCPA (assunto tratada na coluna do mês passado4), ou seja, a crise muitas vezes é utilizada como uma justificativa para rupturas (nesse sentido, é válida a leitura da obra “Doutrina de Choque”, da autora Naomi Klein).

A questão central do aumento das tarifas de importação e exportação é que elas geram um ônus no mercado, para a circulação de riquezas. Sendo bem objetivo: a tarifa é um custo embutido no produto. Esse custo deve ser absorvido por alguém: o Governo pode aliviar essa tarifa, reduzindo esse custo ou algum ente da cadeia de consumo deve pagar. Via de regra, essa despesa, se não aliviada pelo Governo, é transferida para o consumidor final do produto, na forma de elevação do preço do bem. Contudo, um produto mais caro, vendo menos, logo, impacta na receita de uma empresa.

A tendência do mercado, por consequência, será tentar driblar esse custo. Então, é nesse aspecto que o ESG e compliance devem ser fortalecidos. Surgirá a tentação de reduzir os investimentos em práticas de ESG e compliance a fim de aumentar a margem de lucro das empresas, algo que não pode acontecer, para não se perder muitas vitórias alcançadas nos últimos anos, por causa da conduta errática de um Presidente que está perdido em suas pautas.

Do ponto de vista do compliance, as empresas não podem se deixar seduzir pela adoção de práticas ilícitas, para reduzir custos. Com o afrouxamento do FCPA pode surgir a proposta de alcançar privilégios de mercado através de subornos e outras práticas ilegais, para as quais as empresas não devem ceder.

A coluna desse mês é quase um apelo para que as empresas e o mercado tenham confiança que não há desenvolvimento econômico sem se atentar à condutas éticas, de boa-governança corporativa, bem como que não há progresso sem desenvolvimento social e ambiental. Nesses momentos de crise, mais importante que rupturas com práticas antigas é manter a calma.

 

Consulta pública ESG20+

 

A coluna coloca esse espaço à disposição para a divulgação da Consulta Pública ESG20+, do Programa ESG20+, promovido pelo Instituto Global ESG e pelo Movimento Interinstitucional ESG na Prática, juntamente Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (ABRIG), contando com o suporte da Frente Parlamentar ESG na Prática do Congresso Nacional (FPESG).

Trata-se de um espaço que permite, pelo prazo de trinta dias, que profissionais, estudiosos da área, empresas de qualquer setor, envie contribuições sobre ESG, que possam se tornar putas no Congresso Nacional, diante da existência de Frente Parlamentar ESG na Prática do Congresso Nacional (FPESG).

 

 Maiores informações pelo link: https://esg20.org/#consulta

 

Referências

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1. https://g1.globo.com/economia/noticia/2025/04/07/tarifaco-de-trump-entenda-os-principais-episodios-da-semana-e-seus-efeitos-pelo-mundo.ghtml

2.  https://oglobo.globo.com/economia/noticia/2025/02/02/o-que-sao-tarifas-e-como-elas-podem-afetar-o-comercio-global-veja-o-que-voce-precisa-saber.ghtml

3. https://www.poder360.com.br/poder-economia/bolsa-de-hong-kong-tem-a-maior-queda-em-3-decadas/

4. https://magis.agej.com.br/geopolitica-da-corrupcao-trump-suspende-o-fcpa/

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