Ainda sobre o Plano de Integridade e Combate à Corrupção – 2025/2027

Ainda sobre o Plano de Integridade e Combate à Corrupção – 2025/2027

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O artigo de hoje pode ser considerado uma sequência da publicação do mês passado,1 em que se abordou o Decreto n. 12.304/2024, e o Plano de Integridade e Combate à Corrupção – 2025/2027, que é uma iniciativa multiministerial do governo, capitaneada pela CGU, de desenvolver um planejamento estratégico para o reforço institucional do poder público e ao combate à corrupção.2 Trata-se de uma elogiável medida protagonizada por um governo efetivamente comprometido em aprender com as lições deixadas pelo estrago causado pela “Operação Lava Jato” e muitos outros escândalos de corrupção.

O primeiro destaque para o plano desenvolvido pelo governo é abandonar a rançosa e ineficiente perspectiva exclusiva do combate à corrupção pelo fortalecimento do aparato policial do Estado. Embora esse ângulo deva ser sempre um dos principais, ele não pode ser tratado como único, ou o mais importante.

O fenômeno corruptivo é, antes de um ato criminoso, um fenômeno econômico e social. Do ponto de vista econômico, destaca-se, por exemplo, a perspectiva de Susan Rose-Ackermann que analisa a corrupção por uma perspectiva econômica de competição de mercado. Para a autora, em linhas genéricas, a corrupção seria parte da busca de privilégios de mercado, a fim de obter o aumento da lucratividade e do domínio de determinado setor. Essa perspectiva tenta justificar a corrupção? Não. Mas demonstra que o mercado não é uma vítima da corrupção, podendo até ser parte do fenômeno corruptivo, talvez até se beneficie da corrupção.

Do ponto vista social, não se está querendo dizer que a corrupção faz parte da cultura brasileira, como uma crítica ao “jeitinho brasileiro”, ou conforme proposto por Sérgio Buarque de Holanda, em que a corrupção seria parte do “homem cordial”. O fenômeno corruptivo sempre deve ser observado como um projeto de poder. Um agente de mercado, ao alcançar acesso ao governo e uma posição de especial preponderância do mercado, começa a agir em nome de um projeto de poder, de busca de controle desse governo e determinado setor econômico.

Esse projeto de Poder ficou evidente na “Operação Lava Jato”, cujos tentáculos alcançaram inúmeros setores do governo da própria sociedade civil. No centro dos fatos desvendados na “Lava Jato” estava o controle da Petrobrás e, por consequência, do petróleo brasileiro. Nem precisa ser esclarecido a fundo, o quanto é relevante em um projeto de poder, o controle sobre o Petróleo e a matriz energética de um país.

Talvez, a Controladoria-Geral da União não tenha pensado tão a fundo o tema corrupção, quando desenvolveu esse plano de integridade e combate a ela. Porém, é realmente interessantíssimo o fato de que os eixos de atuação foram divididos em cinco e, em apenas um, o foco está no fortalecimento do aparato de segurança pública.

O Plano de Integridade e Combate à Corrupção, portanto, foi assim dividido:

Eixo Temático 1: Controle da Qualidade do Uso dos Recursos Públicos

O ponto de partida do planejamento é a fiscalização, ou seja, o cuidado com o uso dos recursos públicos. O Brasil já detém muitas ferramentas de fiscalização, então, o foco desse eixo é o aprimoramento e a aproximação da sociedade civil, para que o cidadão e as próprias empresas sejam fiscalizadoras do uso de recursos públicos.

Eixo Temático 2: Integridade nas relações Estado-Setor Privado

O segundo eixo almeja o fortalecimento das relações entre o Público e o Privado, setor mais propenso a prática de corrupção. Assim, o foco passa a ser o fortalecimento das políticas de integridade, tanto da administração pública, quanto no fomento a melhorias no setor privado.

Aqui, também, o Estado já começa a colocar a proteção e defesa dos direitos humanos como um dos objetivos desse eixo.

Eixo Temático 3: Transparência e Governo Aberto

O sigilo, segredo e mistérios, são marcas de governos desviados, que possuem muito o que esconder. No caso, colocar um eixo dedicado à transparência é tentar demonstrar que o governo não deve possuir muitos segredos, mas ser público e agir em novo do povo (democracia).

Além disso, o fenômeno corruptivo sempre acontece às escuras, de forma obscura. Maior transparência e visibilidade é uma forma de coibir práticas de corrupção.

Eixo Temático 4:  Combate à Corrupção

O combate à corrupção consta, especificadamente, no eixo quatro. Interessante notar que não se menciona o fortalecimento da Polícia Federal ou do Ministério Público Federal, tradicionais instituições de combate à corrupção como ato criminoso, como objetivos do eixo.

O foco, ao que parece, é o fortalecimento da própria administração, de forma que gestores e fiscais de contratos tenham ferramentas para detectar práticas ilícitas e façam posteriores denúncias aos órgãos competentes.

Eixo Temático 5: Fortalecimento Institucional para a Integridade

O eixo temático número cinco, embora seja o último, parece ser o mais importante, visto que trata o combate à corrupção, com uma necessidade para o fortalecimento institucional e defesa dos direitos humanos, como se extrai da própria síntese do material:

O eixo temático 5 enfatiza o objetivo de promover a integridade das organizações públicas por meio do fortalecimento institucional das funções essenciais à implementação do Programa de Integridade e de medidas que promovam a ética, o respeito aos Direitos Humanos e a promoção de uma sociedade mais iguali­tária, bem como previnam o assédio, a discriminação, desvios éticos e o desrespeito a direitos, valores e prin­cípios que impactem a confiança, a credibilidade e a reputação institucional. Essas são condições essenciais à efetiva prevenção da corrupção.”.

Esse eixo que confirma a premissa desse artigo: que a administração, finalmente, entendeu que o combate à corrupção não é uma guerra contra o crime, mas uma forma de promover uma sociedade mais justa e igualitária, que tenha os direitos humanos como razão de ser.

O material ainda traz várias ações, que cada Ministério, órgão público e entidade da sociedade civil envolvida, terão que executar, principalmente, partindo de uma ideia de padronização de processos e aumento da transparência. Não há espaço nessa coluna, para citar todos, porém um merece destaque, vinculado ao eixo 05:

TÍTULO Observatório da Democracia

AÇÃO Elaborar diagnósticos e promover pesquisas e debates qualificados sobre a manutenção do equilíbrio democrático no país. A ideia do Observatório é constituir-se como um centro de reflexões e estudos, onde poderão ser discutidos temas atuais, experiências interna­cionais, além de produzidos relatórios e publicações acadêmicas voltadas a fortalecer a integração entre os Poderes da República e o equilíbrio institucional – material que poderá servir como paradigma para atuação no fortalecimento da democracia brasileira.

Vincular à defesa da democracia ao combate à corrupção significa uma nova compreensão sobre o fenômeno corruptivo. Além disso, colocar a proteção da democracia como uma “AÇÃO” a ser executada, afirma o compromisso do atual governo de não compactuar com práticas autoritárias e que sejam antidemocráticas.

Portanto, o Plano de Integridade e Combate à Corrupção, apesar de, como todo trabalho de governo, esteja sujeito a críticas, aparenta ser uma medida elogiosa do poder público, na tentativa de obter avanços éticos relevantes, com prazos definidos.

Assim, a pergunta que fica é: o plano sairá do papel? Talvez. Cabe à sociedade civil cobrar os governantes, os ministros e outros agentes de poder, sobre a necessidade de transformar o plano em algo concreto.

1. Disponível em: link.

2. Disponível em: link.

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