Hoje, a licença-paternidade é de apenas 5 (cinco) dias, prorrogável por mais 20 (vinte) dias, via Programa Empresa Cidadã; enquanto a licença maternidade prevê, no mínimo, 120 (cento e vinte) dias, prorrogável por 180 (cento e oitenta dias), também via Programa Empresa Cidadã; conforme previsto no artigo 7º, XIX, da Constituição Federal e Lei nº 11.770/2008, regulamentado pelo Decreto nº 7.052/2009, e Lei nº 13.257/2016 (Marco Legal da Primeira Infância).
Em 2015, a BBC News Brasil divulgou que apenas 34 (trinta e quatro) países, incluindo o Brasil, cumprem com a recomendação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de conceder, no mínimo 14 (catorze) semanas de licença-maternidade; sendo a maioria das mulheres (830 milhões) carece de uma proteção de maternidade suficiente.
A maioria dessas mulheres quase 80% (oitenta por cento) estão na África e Ásia, enquanto as maiores licenças estão na Europa, podendo chegar a 1 (um) ano de licença
Nos moldes atuais a licença-paternidade é menor do que a licença-maternidade no mundo todo, podendo ser visto o maior período no leste europeu, como 90 (noventa) dias na Eslovênia, mas nos demais países variando entre 10 (dez) e 15(quinze) dias; sendo que na América Latina a licença pode variar de 2 (dois) a 8 (oito) dias, portanto, o Brasil está entre os países que concede um dos menores prazos de licença-paternidade
Mas, recentemente, os países têm ampliado a licença-paternidade, inclusive o Brasil que busca corrigir a desigualdade entre a licença-maternidade e a licença-paternidade através do PL 6216/2023, conhecida como o PL do Pai Presente, que tramita pela Câmara dos Deputados
Esse projeto de lei prevê o aumento do prazo da licença a paternidade para 30 (trinta) dias, e poderá ser de 120 (cento e vinte) dias, em “em caso de falecimento da mãe, de impedimento da mãe por incapacidades físicas ou psicológicas, ainda que transitórias, mediante comprovação médica, de ausência materna no registro civil de nascimento da criança, de adoção ou de obtenção da guarda judicial para fins de adoção apenas pelo pai (…)”; conforme se verifica do § 4º do artigo 4º do projeto.
Mesmo assim a ampliação foi criticada por uma atriz que disse que esse prazo de 30 (trinta) dias é muito pouco para que os pais criam vínculos com seus filhos.
É preciso, contudo, observar que o ordenamento constitucional reconhece a família como base da sociedade e garante proteção integral à criança, então, por que o cuidado com os filhos ainda é compreendido, na prática, como uma obrigação quase exclusiva das mães?
A desigualdade entre as licenças concedidas a homens e mulheres no nascimento de um filho revela uma lacuna entre o discurso jurídico e a vivência das famílias brasileiras. Além disso, a diferença nos períodos das licenças não apenas desestimula o cuidado ativo por parte dos pais, como perpetua a sobrecarga das mães e reforça estereótipos de gênero.
A desigualdade entre as licenças concedidas a homens e mulheres no nascimento de um filho revela uma lacuna entre o discurso jurídico e a vivência das famílias brasileiras, e isso está sendo corrigido pelo Projeto de Lei 6216/2023.
Além disso, o Direito de Família contemporâneo reconhece a função parental como um dever compartilhado, tanto que o artigo 1.634 do Código Civil prevê que o poder familiar deve ser exercido por ambos os genitores, em igualdade de condições; portanto, manter a limitação da licença-paternidade contradiz o próprio espírito do sistema jurídico, ao impedir que o pai se envolva de forma real nos primeiros dias de vida do filho.
Inclusive, a guarda compartilhada entre os pais é a regra, conforme parágrafo 2º do artigo 1.584 do Código Civil, o que demonstra que o vínculo entre pais e filhos será construído na medida que eles convivem diariamente, ou o máximo que seja possível.
Isso também vem sendo corrigido através de decisões judiciais vêm reconhecendo o direito à ampliação da licença-paternidade com base no princípio da isonomia e da proteção integral da criança, conforme previsto no artigo 227 da Constituição Federal; e ainda há os casos em que o Judiciário estende o prazo para pais solo, casais homoafetivos ou em contextos de adoção.
A ampliação da licença-paternidade é uma medida de justiça social, com impacto direto na convivência familiar, na formação da criança e na equidade de gênero, e vai além do maior contato entre pais e filhos, os envolverá na rotina do recém-nascido, dividindo os cuidados com a mãe, que nesse sentido pode ter uma melhor recuperação pós parto; afinal a grande maioria não tem uma rede de apoio satisfatória nesse período, isso quando existe essa rede de apoio.
Diante disso é preciso ver com bons olhos essa possível ampliação da licença-paternidade, é um ótimo avanço para que haja um Direito de Família mais justo, sensível às transformações sociais e coerente com os princípios constitucionais e infra-constitucionais.
A crítica não deixa de ter fundamento, e deve ser objeto de reflexão por toda a sociedade, que sabe que as obrigações com os filhos são sempre imputadas as mães, e até mesmo as mulheres de uma forma geral, mas promover a parentalidade ativa que permita o envolvimento do pai e da mãe desde o primeiro minuto de vida dos filhos, e quiçá desde a gestação, é fortalecer a família como espaço de cuidado e afeto, e é papel do Estado, da sociedade e do Judiciário caminhar na mesma direção; afinal pai também cuida.
Referências
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BBC News Brasil. Quais países oferecem as maiores e as menores licenças maternidade? www.bbc.com /portuguese/noticias/2015/08/150812_licenca_maternidade_paises_rm
Constituição Federal de 1988. www/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm
Lei nº 13.257/16. www.planalto.gov.br/ccivil_03/ _ato2015-2018/2016/lei/l13257.htm
Projeto de Lei 6216/23. www.camara.leg.br/ proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2416586
VOGUE. Samara Felippo fala sobre a ampliação da licença-paternidade. Samara Felippo fala sobre a ampliação da licença-paternidade