O conselho da federação e a reforma tributária: um paradoxo ou uma salvação?

O conselho da federação e a reforma tributária: um paradoxo ou uma salvação?

congresso nacional

Para Onofre Alves Batista Júnior

 

Recentemente, em 18/04/2023, foi instituído o Conselho da Federação, por meio do Decreto nº 11.495/2023. Nos termos do art. 1º, §1º do citado diploma normativo, o Conselho da Federação é definido como “órgão de integração e de promoção da cooperação dos níveis de Governo federal, estadual, distrital e municipal, com a finalidade de subsidiar e de promover a articulação, a negociação e a pactuação de estratégias e de ações de interesses prioritários comuns, com vistas ao desenvolvimento econômico sustentável e à redução das desigualdades sociais e regionais”.

A busca por um federalismo cooperativo entre nós é insistentemente reiterada quando se depara com a leitura das diretrizes que devem guiar o Conselho da Federação:

Art. 2º O Conselho da Federação se guiará pelas seguintes diretrizes:

I – respeito à diversidade, à especificidade e à autonomia dos entes federados;

II – atuação delimitada pelas atribuições constitucionais e orgânicas dos Poderes Executivos dos entes federados, observadas as competências dos demais Poderes;

III – construção de consensos e de compromissos políticos, capazes de produzir governança cooperativa entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

IV – proposição e aperfeiçoamento de instrumentos que deem efetividade às cooperações vertical e horizontal entre os entes federados;

V – atuação integrada com os demais instrumentos de cooperação federativa, incluídos os sistemas de políticas públicas setoriais, de modo a permitir a reflexão sobre os desafios do Estado brasileiro em seu conjunto; e

VI – estímulo à adoção de políticas e de estratégias que ampliem ou aperfeiçoem as formas de cooperação e que se utilizem de mecanismos indutores de desempenho dos entes federados, com vistas à promoção da equidade entre os Governos dos entes subnacionais.

Há um espelhamento entre as diretrizes a serem observadas pelo Conselho da Federação e as suas competências, novamente em busca de um federalismo cooperativo:

Art.3º Ao Conselho da Federação compete:

I – pactuar agenda prioritária comum aos níveis de Governo federal, estadual, distrital e municipal, a ser tratada no âmbito do Conselho da Federação;

II – contribuir para a formulação de políticas públicas nacionais, em especial aquelas de implementação descentralizada pelos órgãos e pelas entidades da administração pública estadual, distrital e municipal, e de propostas de reformas institucionais de interesse comum aos níveis de Governo federal, estadual, distrital e municipal;

III – sugerir e propor projetos e ações com vistas ao aperfeiçoamento das relações intergovernamentais e à promoção da integração e do fortalecimento da Federação;

IV – fortalecer a cooperação e a coordenação federativa e incentivar a sua promoção no âmbito subnacional, com apoio à articulação vertical entre os Estados, o Distrito Federal e os Municípios e à governança colaborativa horizontal interestadual e intermunicipal;

V – realizar estudos e estabelecer estratégias para fundamentar propostas legislativas ou mudanças administrativas relacionadas ao aperfeiçoamento da coordenação, da cooperação e da solidariedade entre os entes federados; e

VI – promover a difusão de políticas exitosas entre os entes federados e estimular o compartilhamento das experiências e dos aprendizados institucionais.

Ao mesmo tempo que instituído o citado órgão, em iniciativa louvável, vale salientar, estão em discussão no Congresso Nacional uma série de projetos de emenda à Constituição visando promover entre nós uma reforma tributária.

De todos os debates relativos à matéria, nenhum deles é mais importante do que o federalismo fiscal: a criação de impostos únicos sobre o consumo, extinguindo o ICMS dos Estados e o ISS dos Municípios retira desses entes autonomia financeira ou não? Esse é o ponto fulcral que precisa ser respondido. Mais ainda: é compatível com um regime federalista que Estados e Municípios dependam de repasses realizados pelo poder central para que possam realizar seus compromissos constitucionais?

Não pretendemos neste espaço realizar uma análise minuciosa de cada projeto ou mesmo uma revisão acadêmica da questão, mas apenas suscitar algumas provocações.

Com efeito, na PEC 45, pretende-se instituir um IBS nacional, somado a um imposto seletivo de caráter extrafiscal, visando desestimular o consumo de bens e serviços prejudiciais à saúde e/ou ao meio ambiente. A competência da União, Estados e Municípios se reduziria à alteração de alíquotas.

Já na PEC 110, o IBS seria de competência dos Estados, DF e Municípios, havendo a instituição de uma CBS federal, substitutiva do PIS e da COFINS, além de um imposto seletivo extrafiscal federal. Novamente, no caso do IBS, Estados e Municípios somente poderiam manejar alíquotas.

Já a PEC 46, ao invés de instituir novos tributos, visa promover uma simplificação da legislação tributária do ICMS e do ISS, notadamente no que diz respeito à uniformização de alíquotas.

Vê-se que a questão federativa aqui é profunda: há autonomia financeira de Estados e Municípios apenas na fixação de alíquotas?

O paradoxo da criação do Conselho da Federação consiste exatamente na sua instituição em um momento em que governo visa promover uma reforma tributária que, a nosso sentir, é manifestamente antifederativa e, por via de consequência, inconstitucional.

Estamos na torcida pelo sucesso do Conselho da Federação e do Federalismo, sempre. E por isso pode-se considerar que a instituição deste conselho seja uma salvação. Com efeito, se observadas as diretrizes que devem guiar o citado órgão, as PECs acima referidas deverão ser arquivadas e uma nova proposta emergirá. A ver.

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