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A Regularização Fundiária Urbana Como Instrumento De Avanço Urbanístico

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O Direito Brasileiro, ao longo de vários dispositivos legais, vincula a proteção do direito de propriedade ao devido registro imobiliário do imóvel no Cartório de Registros competente. E, assim, como os registros de nascimentos e casamentos entre pessoas, a matrícula de um imóvel, seja urbano ou rural, é o documento que o qualifica e identifica, assim como suas conexões com seus respectivos titulares.

Em observância aos princípios norteadores dos registros públicos, em especial à publicidade e à continuidade, uma matrícula imobiliária deve concentrar em seu teor todas as relações jurídicas que envolvam o respectivo imóvel. Isso significa que o proprietário deve sempre atualizar este registro com todas as informações e cadastros que disciplinam seu regime jurídico.

Desde a correta qualificação pessoal dos proprietários, passando pelas averbações dos dados fiscais e ambientais do próprio imóvel, até a precisa determinação de sua área e confrontações físicas, são várias as situações que necessitam de atenção e validação pelos Cartórios de Registros de Imóveis.

Atentos a esses fatos e conscientes da abrangência que os bens imóveis possuem em diversos aspectos sociais, o número de leis e normas que disciplinam as matérias imobiliárias é grande. De forma breve, podemos destacar aqui os seguintes dispositivos:

  • A Lei nº 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos);
  • A Lei nº 10.267/2001 (Estabeleceu as bases obrigatórias para o Georreferenciamento de imóveis rurais);
  • A Lei nº 6.766/79 (Lei do Parcelamento do Solo);
  • A Lei nº 4.504/64 (Estatuto da Terra);
  • Lei nº 10.527/2001 (Estatuto das Cidades);
  • As Normas Técnicas do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária);
  • E os Códigos de Normas da Corregedoria Geral publicados por cada Poder Judiciário Estadual, regulamentando os serviços Notariais e Registrais dos respectivos estados.

Essas são apenas algumas das leis e normas que prescrevem direitos e obrigações fundiárias e imobiliárias. E diante do elevado número de diplomas regulatórios, são também inúmeras as possibilidades de situações controversas e burocráticas envolvendo os imóveis.

Dentre o grande volume de ações judiciais em curso no Poder Judiciário brasileiro, destaca-se que, de acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) divulgados pelo portal de Registros de Imóveis do Brasil,1 durante o ano de 2020 a Justiça Comum e os Juizados Especiais contavam com mais de 70 mil processos em curso, nos quais existe alguma forma de disputa de propriedade sobre imóveis.

Em linhas gerais podemos perceber que a matéria fundiária impacta de forma significativa o judiciário brasileiro.

Partindo desta situação surge a necessidade de se pensar em uma maneira de resolver as pendências imobiliárias com segurança jurídica e atenção à função social inerente à propriedade, mas também de forma acessível para todos as pessoas e órgãos envolvidos. E aí destacamos o instituto da Regularização Fundiária Urbana ou “REURB”, que ganhou destaque a partir da Lei 13.465/2017.

A REURB é constituída, conforme art. 9º da citada Lei,2 como o conjunto de parâmetros urbanísticos, ambientais, sociais e jurídicos destinados à adequação da situação fundiária de um imóvel particular ao ordenamento territorial no qual está inserido.

Por seu próprio conceito, é possível notar que a REURB possui uma natureza multidisciplinar, abrangendo a atuação e o escopo de trabalho de uma série de profissionais de áreas e competências distintas. Como advogados, engenheiros, arquitetos, assistentes sociais e vários outros. Pois assim também são as atividades urbanísticas e a própria dinâmica das cidades.

A REURB destina-se a núcleos urbanos irregulares, consolidados anteriormente ao marco temporal de 22 de dezembro de 2016. Sendo assim, novos loteamentos e parcelamentos de solo ainda estão sob a tutela da Lei 6.766/79. Esta exclusão se dá graças à possibilidade de flexibilização dos padrões urbanísticos, prevista na primeira Lei citada. Dessa forma, a Lei pretende alcançar, sobretudo, as áreas que foram objetos de ocupação ou mesmo de comércio irregular de lotes, que não seriam capazes de regularizar sua situação de outra forma, senão por meio desta relativização dos parâmetros.

Em linhas gerais, a partir da regularização fundiária, aquele determinado núcleo urbano será demarcado por instrumentos georreferenciados, estabelecendo sua área, limites e confrontações. Promovendo, a partir disto, a abertura de uma matrícula junto ao respectivo Cartório de Registro. Em seguida, é feita a individualização dos lotes de todas as famílias cadastradas dentro do perímetro do bairro/distrito específico.

Essa individualização gera a titulação dos proprietários desses lotes. Assegurando que os mesmos consigam promover o devido registro imobiliário de seus imóveis por meio dos instrumentos da Legitimação Fundiária ou da Legitimação de Posse.

Por fim, a partir dos relatórios e estudos de caracterização previstos na Lei, são feitos levantamentos da infraestrutura urbana existente, assim como são estabelecidos os projetos de readequação necessários, assim como firmado um Termo de Compromisso público pelos responsáveis por aquele núcleo – entes públicos ou os antigos loteadores – assegurando que as obras e ações complementares obrigatórias serão devidamente realizadas e fiscalizadas pelos responsáveis seguindo um estrito cronograma físico-financeiro.

Assim, com a regularização fundiária, este núcleo urbano passa a integrar a cidade não só fisicamente, mas também juridicamente. Promovendo o desenvolvimento regional e a efetivação da função social da propriedade.

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Sthenio Paulo Freitas Silva

 

Referências

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1. Dados obtidos pelo link: https://bit.ly/2Yezxq5. (acessado em 22/06/2021).

2. BRASIL, Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017.

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