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Startups: investimentos e oportunidades (Parte 1)

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O Brasil conta com mais de 21.000 startups, sendo que apenas a cidade de São Paulo abriga mais de 3000 delas. Aproximadamente 10% das startups brasileiras são dedicadas ao mercado de Educação, 7% Finanças e 6% ao que se pode denominar “Saúde e Bem-estar”. A maioria se encontra fora de operação ou entre as fases de “Ideação” e “Tração”,1 ou seja, ainda não operam plenamente, dependem fortemente da captação de recursos e maturação do modelo de negócio.

O ano de 2021 foi especialmente positivo às startups, pois registrou um recorde no volume de investimentos: foram mais de 50 bilhões de reais captados pelas startups brasileiras.2 Para se ter uma ideia do seu crescimento, basta observar que esse montante de investimento equivale ao triplo de investimentos captados em 2020, ou dez vezes maior que aqueles registrados em 2017.

Fatores como excesso de liquidez, juros baixos e otimismo com o setor de tecnologia são reconhecidos como motivadores para esse recorde de investimentos em startups.3 Para além disso, também não se pode ignorar a importância do denominado “Marco Legal das Startups” (“MLS”), Lei Complementar 182, de 1º de junho de 2021,4 que buscou criar um ambiente regulatório mais favorável às empresas inovadoras e trouxe alternativas para investimentos no setor.

Entre as diversas medidas incorporadas pelo MLS estão (i) a possibilidade de captação de investidores sem a necessidade de participação societária (art. 5º, MLS),5 (ii) a proteção conferida ao patrimônio dos investidores com relação aos riscos de insucesso do negócio (art. 8º, MLS),6. (iii) a criação do Sandbox Regulatório (inciso II, art. 2º e art. 11, MLS),7 que flexibiliza temporariamente a aplicação de exigências regulatórias para projetos inovadores e, (iv) a determinação para que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a regulamente a facilitação das condições para que companhias de menor porte tenha acesso ao mercado de capitais (art. 16, MLS).8.

O primeiro desafio enfrentado pelo MLS foi apresentar parâmetros para enquadramento das startups e, portanto, sua sujeição à lei e seus benefícios. Assim, logo após reconhecer como startups “as organizações empresariais ou societárias, nascentes ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados” (art. 4º, MLS),9 os seguintes critérios objetivos foram apresentados: (i) receita bruta anual de até 16 milhões de reais; (ii) até 10 anos de inscrição de CNPJ, e, (iii) enquadramento no Inova Simples e declaração, no ato constitutivo ou respectiva alteração, de que se trata de modelo inovados para geração de produto ou serviço.

Entre as alternativas para captação de recursos, o MLS reconheceu que as startups podem admitir aporte de capital por pessoas físicas ou jurídicas e, conforme modalidade escolhida pelas partes, tais investimentos poderão resultar ou não em participação no capital social (art. 5º, MLS).

Não será reconhecido como integrante do capital social o investimento realizado por meio dos seguintes instrumentos: (i) contrato de opção de subscrição de ações ou de quotas celebrado entre o investidor e a empresa; (ii) contrato de opção de compra de ações ou de quotas celebrado entre o investidor e os acionistas ou sócios da empresa; (iii) debênture conversível emitida pela empresa nos termos da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976; (iv) contrato de mútuo conversível em participação societária celebrado entre o investidor e a empresa; (v) estruturação de sociedade em conta de participação celebrada entre o investidor e a empresa; e, (vi) contrato de investimento-anjo na forma da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro 2006.10

A vantagem deste modelo de investimento é que confere proteção ao investidor contra obrigações decorrentes da startup, sejam elas de natureza tributária, trabalhista ou comercial, protegendo-o inclusive contra os efeitos de eventual desconsideração da personalidade jurídica (art. 8º, MLS).

Há uma ressalva: para que tenha segurança com relação à proteção conferida, o investidor não poderá ter gerência ou voto na administração da empresa, ou seja, não poderá exercer poderes com relação à tomada de decisões da startup (art. 8º, MLS). Isso impõe cautela na elaboração e assinatura dos instrumentos de investimentos, pois muitas condições devem ser negociadas anteriormente, evitando a necessidade de qualquer tipo de decisão colegiada ou alteração de rumo da sociedade investida.

No próximo artigo trataremos dos instrumentos indicados no art. 5º do MLS, as principais condições e alternativas a serem negociadas.

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Eduardo Benini

 

Referências

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1. Dados extraídos do Startup Base (base de dados da Associação Brasileira de Startups). Site: https://bit.ly/3Lok2Qi. Acesso em 22 abril 2022. Para compreensão dos estágios de crescimento da startup: https://bit.ly/3vnWPZ6

2. Dados extraídos de: https://bit.ly/3kkNsmC. Acesso em: 22 abril 2022.

3. Conforme https://bit.ly/3KnPZHc acesso em 22 de abril de 2022.

4. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp182.htm

5. Art. 5º As startups poderão admitir aporte de capital por pessoa física ou jurídica, que poderá resultar ou não em participação no capital social da startup, a depender da modalidade de investimento escolhida pelas partes.

6. Art. 8º O investidor que realizar o aporte de capital a que se refere o art. 5º desta Lei Complementar:

I – não será considerado sócio ou acionista nem possuirá direito a gerência ou a voto na administração da empresa, conforme pactuação contratual;

II – não responderá por qualquer dívida da empresa, inclusive em recuperação judicial, e a ele não se estenderá o disposto no art. 50 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), no art. 855-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, nos arts. 124, 134 e 135 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), e em outras disposições atinentes à desconsideração da personalidade jurídica existentes na legislação vigente.

Parágrafo único. As disposições do inciso II do caput deste artigo não se aplicam às hipóteses de dolo, de fraude ou de simulação com o envolvimento do investidor.

7. Art. 2. II – ambiente regulatório experimental (sandbox regulatório): conjunto de condições especiais simplificadas para que as pessoas jurídicas participantes possam receber autorização temporária dos órgãos ou das entidades com competência de regulamentação setorial para desenvolver modelos de negócios inovadores e testar técnicas e tecnologias experimentais, mediante o cumprimento de critérios e de limites previamente estabelecidos pelo órgão ou entidade reguladora e por meio de procedimento facilitado.

8. Art. 16. A Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, passa a vigorar com as seguintes alterações:

Art. 294-A. A Comissão de Valores Mobiliários regulamentará as condições facilitadas para o acesso de companhias de menor porte ao mercado de capitais, e será permitido dispensar ou modular a observância ao disposto:

9. Art. 4º São enquadradas como startups as organizações empresariais ou societárias, nascentes ou em operação recente, cuja atuação caracteriza-se pela inovação aplicada a modelo de negócios ou a produtos ou serviços ofertados.

1º Para fins de aplicação desta Lei Complementar, são elegíveis para o enquadramento na modalidade de tratamento especial destinada ao fomento de startup o empresário individual, a empresa individual de responsabilidade limitada, as sociedades empresárias, as sociedades cooperativas e as sociedades simples:

10. O rol trazido pelo MLS é meramente exemplificativo, pois reconhece que outros instrumentos poderão ser utilizados para aporte de capital em startups sem que o investidor integre formalmente o quadro de sócios (inciso VIII do art. 5º, do MLS).

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