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Embargos de Declaração no Tema 709 do STF: é possível continuar na atividade especial durante a pandemia?

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O Tema Repetitivo de Repercussão Geral número 709 do Supremo Tribunal Federal (STF) é de grande importância para os beneficiários da Aposentadoria Especial.

Muitos efeitos previdenciários extremamente relevantes são decorrentes desta decisão.

Neste artigo, não vou focar necessariamente na tese fixada no referido Tema, mas nos dois Embargos de Declaração opostos após a fixação do entendimento do STF.

O que é o Tema 709 do STF?

O objetivo do referido Tema foi discutir a constitucionalidade do art. 57, parágrafo 8º da Lei 8.213/91, norma esta que proíbe o beneficiário de Aposentadoria Especial ao exercício de atividades insalubres ou perigosas.1

No Tema, julgado pelo Supremo em junho de 2020, foi decidido que esta vedação é, de fato, constitucional.

Isso significa que quem recebe a Aposentadoria Especial não pode continuar desempenhando atividades nocivas à saúde ou à integridade física.

O primeiro Embargos de Declaração opostos ao Tema 709/STF. Quais são as consequências previdenciárias?

Após a decisão fixada, foram opostos os primeiros Embargos de Declaração.
No julgamento, ocorrido no dia 24/02/2021, alguns efeitos previdenciários importantes foram fixados.

Cessação do pagamento

No julgamento do Tema, o STF informou que o retorno à atividade nociva pelo aposentado especial acarretaria a cessação do benefício.2

O termo “cessar o benefício” foi motivo de discussão no mundo previdenciário, pois abre-se “brecha” para uma espécie de desaposentação,3 pois o segurado poderia continuar trabalhando e, posteriormente, requerer outra aposentadoria, já que o seu benefício foi cessado.

Até que faz sentido…

Porém, no julgamento dos Embargos de Declaração, o STF decidiu que, uma vez constatada a continuidade ou o retorno à atividade especial, o pagamento do benefício em questão será cessado.

Ou seja, o que cessa é o pagamento do benefício, e não a aposentadoria em si.

O segurado “só” deixa de receber os valores enquanto estiver exercendo as atividades insalubres ou perigosas.

Quando ele parar de exercer as atividades especiais, o pagamento do benefício é retomado normalmente após solicitação de reativação do benefício.

Portanto, a tese de uma “desaposentação” caiu por terra.

Vamos em frente.

Modulação dos efeitos do julgamento

O julgamento dos Embargos de Declaração também deixou evidente algumas informações sobre a modulação dos efeitos do Tema 709 do STF.

Primeiro, vamos falar dos segurados que têm decisão transitada em julgado no sentido de poderem continuar trabalhando em atividades especiais recebendo Aposentadoria Especial.

Nesse caso, segundo o STF, não haverá modificação destas decisões caso o trânsito em julgado tenha ocorrido até o julgamento dos Embargos de Declaração (24/02/2021), visando a segurança jurídica e direito adquirido do segurado.4

Ou seja, se eu tiver uma decisão transitada em julgado até o dia 23/02/2021, posso continuar trabalhando em atividades insalubres ou perigosas e receber Aposentadoria Especial normalmente.

Desse modo, o INSS não pode fazer qualquer tipo de ação rescisória para mudar essa situação.

A outra modulação de efeitos dos Embargos foi em relação aos beneficiários desta aposentadoria que estão conseguindo trabalhar com atividades especiais por meio de uma decisão de tutela provisória.

Neste sentido, o STF entendeu que a tutela provisória tem efeito até a sua própria revogação.

Como o próprio Tema 709 do Supremo, dotado de eficácia vinculante, impede o trabalho em atividades especiais concomitantemente com a Aposentadoria Especial, quem teve o direito de permanecer no trabalho especial garantido por tutela provisória terá essa decisão revogada.

Nesse sentido, o STF entendeu que abrir-se-ia uma discussão na comunidade jurídica sobre a irrepetibilidade dos valores recebidos (tanto para os segurados que têm uma decisão transitada em julgado ou uma tutela provisória).5

Vejamos o próximo tópico.

Irrepetibilidade dos valores recebidos

Com certeza é algo que os segurados têm medo.

Eles terão que devolver os valores recebidos de Aposentadoria Especial enquanto trabalhavam em atividades nocivas à saúde?

A resposta é não.

O STF fixou o entendimento, reiterando seu posicionamento linear, sobre a irrepetibilidade dos valores alimentares recebidos de boa-fé por força de decisão judicial ou administrativa.

Ou seja, os valores recebidos por boa-fé, advindos de uma decisão judicial ou administrativa (INSS), não deverão ser devolvidos ao Instituto.

Continuação da atividade especial após a concessão da Aposentadoria Especial durante a pandemia?

Foi exatamente o que o STF decidiu em sessão virtual realizada no dia 05/10/2021.

Por unanimidade, os ministros do Supremo acolheram os Embargos de Declaração opostos pelo Ministério Público Federal (MPF), fazendo com seja possível os beneficiários da Aposentadoria Especial voltarem ou continuarem a realizar atividades especiais sem que seja cessado o pagamento do benefício previdenciário.

Mas tem um porém: essa possibilidade só existe para os segurados da área da saúde que fossem trabalhar diretamente no combate ao Covid-19.

Essa oportunidade aos profissionais da saúde já aposentados na modalidade especial ocorrerá enquanto a Lei 13.979/2020 estiver em vigor.

Em resumo, esta norma trata das medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, responsável pelo surto de 2019.6

Em que pese a decisão do Tema 709 do STF visar a preservação da saúde e do bem-estar de quem exerce atividade especial, levando em conta que há a proibição expressa do retorno ao trabalho insalubre ou perigoso sem acarretar na cessação do pagamento do benefício previdenciário, a situação pandêmica que vivemos nos faz repensarmos alguns pontos.

No próprio julgamento do segundo Embargos de Declaração foi mencionado que muitos trabalhadores da área de saúde vieram a óbito em conta do Covid-19, gerando escassez neste setor.7

Com o avanço da vacinação e na dose de reforço para estes segurados, houve a modulação de efeitos do Tema 709/STF para equilibrar a demanda nos hospitais do Brasil.

Já os outros trabalhadores aposentados na modalidade especial não podem retornar ou continuar o trabalho sem que seja cessado o pagamento de seu benefício previdenciário.

Resumo

Desse modo, temos 4 efeitos principais após o julgamento dos dois Embargos de Declaração do Tema 709 do STF:

  • modificação do texto do julgamento do Tema para deixar evidente que, caso o aposentado retorne à atividade especial, o pagamento do seu benefício será cessado, e não cancelado em definitivo;
  • garantia de direito adquirido para os segurados que têm decisão transitada em julgado até a data do julgamento dos embargos;
  • irrepetibilidade dos valores recebidos de boa-fé por decisão judicial ou administrativa que permitiu o trabalho especial concomitantemente ao recebimento da Aposentadoria Especial;
  • possibilidade dos profissionais da saúde, beneficiários da Aposentadoria Especial, retornem ou continuem o seu trabalho somente em casos de combate ao Covid-19 enquanto a Lei 13.979/2020 estiver em vigor.

Acredito que o STF foi justo em suas decisões, principalmente quanto à modulação de efeitos da decisão e a irrepetibilidade dos valores recebidos.

Sobre a cessação do pagamento do benefício, acredito ser algo meio lógico, pois o que causou conflito foi somente a forma que a decisão foi escrita.

Por fim, sobre a possibilidade de retorno ao labor especial dos profissionais da saúde que estão na linha de frente no combate ao Covid-19, é um caso excepcional que devemos olhar a excepcionalidade da situação pandêmica que estamos vivendo.

Conforme mencionei, essa oportunidade perdurará somente enquanto a Lei 13.979/2020 estiver valendo, tornando-se extinta após a revogação da norma.

Deste modo, a preservação da saúde e bem-estar do beneficiário voltará a ser restaurada, objetivo principal do julgamento do Tema 709 do STF.

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Ben-Hur Klaus Cuesta Duarte

 

Referências

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1. BRASIL. Lei 8.213/1991. Disponível em: https://bit.ly/3cLF4Zk. Acesso em: 23 nov. 2021.

2. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Tema 709. Disponível em: https://bit.ly/3CIBBoV. Acesso em: 23 nov. 2021.

3. A  desaposentação acontece quando o segurado continua trabalhando após se aposentar e pretende renunciar ao benefício recebido para somar o tempo contribuído após a aposentadoria, requerendo um novo benefício mais vantajoso, porque seria aproveitado os recolhimentos anteriores e posteriores à aposentadoria.

4. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Tema 709. Disponível em: https://bit.ly/3CIBBoV. Acesso em: 23 nov. 2021.

5. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Tema 709. Disponível em: https://bit.ly/3CIBBoV. Acesso em: 23 nov. 2021.

6. BRASIL. Lei 13.979/2020. Disponível em: https://bit.ly/3DVjRs8. Acesso em: 23 nov. 2021.

7. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Tema 709. Disponível em: https://bit.ly/3CIBBoV. Acesso em: 23 nov. 2021.

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